Glicosilação
proteica, um marcador de diagnóstico e prognóstico em doenças
inflamatórias intestinais
Proteínas e lípidos têm as suas estrutura e função
alteradas pela adição de glicanos àqueles compostos. As proteínas
requeridas para a regulação das células imunológicas são
modificadas pelos glicanos, e estas alterações se relacionam com
condições inflamatórias.
Verificou-se que os glicanos regulam a activação das
células T bem como a estrutura das imunoglobulinas ou sua função.
Também os glicanos, na sua interacção com as proteínas, interfasem na interacção dos agentes microbianos e as células imunes ou
epiteliais, e têm acção na malignização das células intestinais
ou hepáticas.
A glicosilação das proteínas é uma modificação
pos-transducional que fornece às proteínas diversificidade
estrutural que é requerida para as interacções com outras
proteínas e células.
Devido às múltiplas funções dos glicanos, este
apresenta diversificidade que reflete as múltiplas funções nas
células e os glicanos actuam como um interface entre a célula e o
ambiente que a rodeia
O glicoma depende dos factores genéticos e ambientais e
a sua alteração correlaciona-se com o desenvolvimento de
inflamação.
Alteração da resposta imunitária, de imunossupressão
até autorreactividade, podem ser encontradas por perturbação da
função genética que codifica glicosiltransferases específicas, o
que concorda com a teoria da regulação da resposta imune pelas
imunoglobulinas.
As imunoglobulinas regulam a resposta imune celular
assim como a humoral.
As proteínas ligadas aos glicanos podem regular a
movimentação leucocitária, reconhecimento de patogéneos,
activação das células imunológicas e imunossupressão. A
patogenicidade das patologias, como cancro, infecção e autoimunes,
associa-se com a glicosilação proteica. Nestas patologias estão
incluídas, entre outras, as doenças inflamatórias intestinais.
Alteração da glicosilação proteica pode ser usada
como marcador de diagnóstico e prognóstico bem como alvo na
terapêutica das doenças inflamatórias intestinais.
Desenvolvimento das células T, sua activação,
sinalização, diferenciação, proliferação bem como seleção dos
timócitos são regulados pela glicosilação, podendo as doenças
autoimunes e neoplasias surgir quando há alteração da glicosilação
proteica.
Na doença inflamatória intestinal não está claro se a glicosilação é o factor indutor ( factor inicial ) ou acelerador
( factor tardio ). Verificou-se que o glioma dos doentes com DDI
difere dos não afectados por esta patologia, sendo que há uma
diminuição dos N-glicanos ramificados e aumento da fucosilação (
adição de fucose ao N-glicano com uma ligação α-1,6
). Estas alterações do glicoma aumentam a imunorresposta intestinal
mediada pelas células T. As células T dos doentes com DDI
apresentam um perfil de glicoma associado com um limiar mais baixo da
activação e aumento da sinalização e resposta inflamatória.
As citoquinas IL2 e
IL7 têm a capacidade de modificar a expressão das enzimas do
complexo de Golgi que controlam a N-glicosilação das células T.
Um ambiente
inflamatório tem influência sobre a N-glicosilação das células T
alterando-lhes a sua função.
A N-glicosilação
desregulada no complexo de Golgi promove a autoimunidade e pode ser
provocada por alterações genéticas ( nomeadamente de IL2RA, IL7RA,
MGAT 1 e CTLA-4 ) bem como alterações ambientais como a luz solar
ou a vitamina D. Estes factos estão em consonância com a teoria de
que a N-glicosilação é um factor precoce da etiologia da DDI.
A N-glicosilação
desregula a resposta T e contribui para o desenvolvimento de certas
patologias como DDI.
Glicocálice
Glicocálice é um complexo revestimento das células
formado por cadeias glicosadas e que fazem a mediação entre as
células intestinais e a microbiota intestinal.
A exposição da microbiota intestinal aos glicanos,
sejam da dieta ou das células intestinais, afecta a composição
desse microbioma, bem como da sua função. Disbiose pode resultar da
variação no glicocálice ou flutuação da quantidade dietética
dos glicanos e essa disbiose pode originar diversas patologias entre
as quais a DDI.
Os glicanos, sejam celulares ou da dieta, podem causar
pressão selectiva em espécies específicas de bactérias que podem
ser divididas em espécies generalistas ou especialistas. É o que
acontece na Doença de Crohn em que aos indivíduos falta uma cópia
de FUT 2 e são não secretores, havendo assim alteração de
microbioma intestinal e aumento à susteptibilidade à infecção e
inflamação.
A alteração do microbioma intestinal pode causar um
maior aumento do risco de colangite esclerosante, alteração da
microbioma e susceptibilidade aos agentes infecciosos, alteração na
glicosilação da mucina com aumento da permeabilidade epitelial
intestinal, levando a uma maior acessibilidade bacteriana e
crescimento das bactérias.
Bactérias comensais, como os Bacteroides spp são
capazes de induzir a fucosilação epitelial, sendo uma função da
simbiose entre as células epiteliais intestinais e o microbioma.
Efeitos
Clínicos
O perfil de glicosilação das IgG´s plasmáticas
associa-se com o perfil clínico das DDI. Existem no soro humano
múltiplas glicoformas de IgG que resultam das estruturas glicanas na
região Fc das IgG. As regiões Fc dos anticorpos interactuam com as
regiões Fc dos receptores ( FcγRs
) nas células imunológicas para activar as vias de sinalização e
respostas a antigéneos. O tipo de glicanos que se ligam à região
Fc das IgG é determinante quanto ao tipo de receptor a que se liga e
assim Fc's que se ligam a FcγRs
activadoras promovem a resposta inflamatória, enquanto que a ligação
de Fc's a FcγRs
inibitórias activam resposta anti-inflamatória.
Níveis aumentados
de IgG agalactosil séricos estão presentes na Doença de Crohn e
correlacionam-se com a concentração sérica da PCR. A fracção de
agalactosil dos oligossacarídeos de IgG fucosilada associa-se
directamente com a severidade da Doença de Crohn.
O padrão de
glicosilação da IgG é diferente de patologia para patologia entre
as diferentes doenças inflamatórias intestinais, com diferente
nível de severidade e resposta terapêutica.
Assim o glicoma
sérico pode ser utilizado como um marcador de prognóstico nos
doentes com DDI.
Anticorpos séricos
contra os glicomas podem ser utilizados como marcadores autoimunes e
alterações inflamatórias
Anti-glicoproteína 2, anti-manobioside carbohidrate IgG e anti-Saccharomyces cervisiae (
epítope oligomanosídico ) são marcadores utilizados no diagnóstico
da DDI em fase precoce da doença, para determinar a actividade da
patologia e prever o curso da doença.
Familiares de
doentes com Doença de Crohn apresentam positividade para anticorpos
anti-glicanos mais frequentemente do que pessoas sem parentes com
aquela doença.
Anticorpos
anti-glicanos podem ser detectados anos antes do surgimento da Doença
de Crohn e associam-se com complicações da doença. É assim, o
glicoma sérico, um marcador importante de diagnóstico e
prognóstico.
Alteração de
padrão de glicosilação na mucosa pode também ser um factor
prognóstico na DDI.