domingo, janeiro 05, 2020

Glicosilação proteica, um marcador de diagnóstico e prognóstico em doenças inflamatórias intestinais

Glicosilação proteica, um marcador de diagnóstico e prognóstico em doenças inflamatórias intestinais


Proteínas e lípidos têm as suas estrutura e função alteradas pela adição de glicanos àqueles compostos. As proteínas requeridas para a regulação das células imunológicas são modificadas pelos glicanos, e estas alterações se relacionam com condições inflamatórias.


Verificou-se que os glicanos regulam a activação das células T bem como a estrutura das imunoglobulinas ou sua função. Também os glicanos, na sua interacção com as proteínas, interfasem na interacção dos agentes microbianos e as células imunes ou epiteliais, e têm acção na malignização das células intestinais ou hepáticas.


A glicosilação das proteínas é uma modificação pos-transducional que fornece às proteínas diversificidade estrutural que é requerida para as interacções com outras proteínas e células.


Devido às múltiplas funções dos glicanos, este apresenta diversificidade que reflete as múltiplas funções nas células e os glicanos actuam como um interface entre a célula e o ambiente que a rodeia


O glicoma depende dos factores genéticos e ambientais e a sua alteração correlaciona-se com o desenvolvimento de inflamação.


Alteração da resposta imunitária, de imunossupressão até autorreactividade, podem ser encontradas por perturbação da função genética que codifica glicosiltransferases específicas, o que concorda com a teoria da regulação da resposta imune pelas imunoglobulinas.


As imunoglobulinas regulam a resposta imune celular assim como a humoral.


As proteínas ligadas aos glicanos podem regular a movimentação leucocitária, reconhecimento de patogéneos, activação das células imunológicas e imunossupressão. A patogenicidade das patologias, como cancro, infecção e autoimunes, associa-se com a glicosilação proteica. Nestas patologias estão incluídas, entre outras, as doenças inflamatórias intestinais.


Alteração da glicosilação proteica pode ser usada como marcador de diagnóstico e prognóstico bem como alvo na terapêutica das doenças inflamatórias intestinais.


Desenvolvimento das células T, sua activação, sinalização, diferenciação, proliferação bem como seleção dos timócitos são regulados pela glicosilação, podendo as doenças autoimunes e neoplasias surgir quando há alteração da glicosilação proteica.


Na  doença  inflamatória  intestinal  não  está  claro  se  a  glicosilação  é  o factor indutor ( factor inicial ) ou acelerador ( factor tardio ). Verificou-se que o glioma dos doentes com DDI difere dos não afectados por esta patologia, sendo que há uma diminuição dos N-glicanos ramificados e aumento da fucosilação ( adição de fucose ao N-glicano com uma ligação α-1,6 ). Estas alterações do glicoma aumentam a imunorresposta intestinal mediada pelas células T. As células T dos doentes com DDI apresentam um perfil de glicoma associado com um limiar mais baixo da activação e aumento da sinalização e resposta inflamatória.


As citoquinas IL2 e IL7 têm a capacidade de modificar a expressão das enzimas do complexo de Golgi que controlam a N-glicosilação das células T.
Um ambiente inflamatório tem influência sobre a N-glicosilação das células T alterando-lhes a sua função.
A N-glicosilação desregulada no complexo de Golgi promove a autoimunidade e pode ser provocada por alterações genéticas ( nomeadamente de IL2RA, IL7RA, MGAT 1 e CTLA-4 ) bem como alterações ambientais como a luz solar ou a vitamina D. Estes factos estão em consonância com a teoria de que a N-glicosilação é um factor precoce da etiologia da DDI.
A N-glicosilação desregula a resposta T e contribui para o desenvolvimento de certas patologias como DDI.


Glicocálice



Glicocálice é um complexo revestimento das células formado por cadeias glicosadas e que fazem a mediação entre as células intestinais e a microbiota intestinal.




A exposição da microbiota intestinal aos glicanos, sejam da dieta ou das células intestinais, afecta a composição desse microbioma, bem como da sua função. Disbiose pode resultar da variação no glicocálice ou flutuação da quantidade dietética dos glicanos e essa disbiose pode originar diversas patologias entre as quais a DDI.


Os glicanos, sejam celulares ou da dieta, podem causar pressão selectiva em espécies específicas de bactérias que podem ser divididas em espécies generalistas ou especialistas. É o que acontece na Doença de Crohn em que aos indivíduos falta uma cópia de FUT 2 e são não secretores, havendo assim alteração de microbioma intestinal e aumento à susteptibilidade à infecção e inflamação.


A alteração do microbioma intestinal pode causar um maior aumento do risco de colangite esclerosante, alteração da microbioma e susceptibilidade aos agentes infecciosos, alteração na glicosilação da mucina com aumento da permeabilidade epitelial intestinal, levando a uma maior acessibilidade bacteriana e crescimento das bactérias.



Bactérias comensais, como os Bacteroides spp são capazes de induzir a fucosilação epitelial, sendo uma função da simbiose entre as células epiteliais intestinais e o microbioma.



Efeitos Clínicos

O perfil de glicosilação das IgG´s plasmáticas associa-se com o perfil clínico das DDI. Existem no soro humano múltiplas glicoformas de IgG que resultam das estruturas glicanas na região Fc das IgG. As regiões Fc dos anticorpos interactuam com as regiões Fc dos receptores ( FcγRs ) nas células imunológicas para activar as vias de sinalização e respostas a antigéneos. O tipo de glicanos que se ligam à região Fc das IgG é determinante quanto ao tipo de receptor a que se liga e assim Fc's que se ligam a FcγRs activadoras promovem a resposta inflamatória, enquanto que a ligação de Fc's a FcγRs inibitórias activam resposta anti-inflamatória.
Níveis aumentados de IgG agalactosil séricos estão presentes na Doença de Crohn e correlacionam-se com a concentração sérica da PCR. A fracção de agalactosil dos oligossacarídeos de IgG fucosilada associa-se directamente com a severidade da Doença de Crohn.


O padrão de glicosilação da IgG é diferente de patologia para patologia entre as diferentes doenças inflamatórias intestinais, com diferente nível de severidade e resposta terapêutica.
Assim o glicoma sérico pode ser utilizado como um marcador de prognóstico nos doentes com DDI.

Anticorpos séricos contra os glicomas podem ser utilizados como marcadores autoimunes e alterações inflamatórias
Anti-glicoproteína  2,  anti-manobioside  carbohidrate IgG e anti-Saccharomyces cervisiae ( epítope oligomanosídico ) são marcadores utilizados no diagnóstico da DDI em fase precoce da doença, para determinar a actividade da patologia e prever o curso da doença.


Familiares de doentes com Doença de Crohn apresentam positividade para anticorpos anti-glicanos mais frequentemente do que pessoas sem parentes com aquela doença.
Anticorpos anti-glicanos podem ser detectados anos antes do surgimento da Doença de Crohn e associam-se com complicações da doença. É assim, o glicoma sérico, um marcador importante de diagnóstico e prognóstico.
Alteração de padrão de glicosilação na mucosa pode também ser um factor prognóstico na DDI.