Faecalibacterium
prausnitzii
Faecalibacterium
prausnitzii ( antes chamada de
Fusobacterium prausnitzii
) é uma das bactérias comensais intestinais mais abundantes no
cólon saudável. A Faecalibacterium prausnitzii
contribui, conjuntamente com
Bacteroides thetaiotaomicron
e Eubacterium eligens,
para a fermentação da pectina da maçã no cólon, mas não a
pectina cítrica. A Faecalibacterium prausnitzii utiliza ácido
urónico para o crescimento, uma capacidade que se pensava ser
exclusiva dos Bacteroides spp entre
os anaeróbicos colónicos humanos.
Estas
bactérias são sensíveis ao oxigénio. A concentração relativa da
Faecalibacterium prausnitzii apresenta-se
diminuída nas doenças inflamatórias intestinais, e particularmente
na doença de Crohn. Na doença de Crohn, principalmente nos casos de
acometimento ileal, verifica-se uma disbiose, apresentando-se uma
prevalência de Firmicutes
diminuída, frequentemente com aumento paralelo de Proteobacteria.
A diminuição dos Firmicutes
é devida em parte à diminuição da abundância de Faecalibacterium
prausnitzii. Esta diminuição
de Faecalibacterium prausnitzii
verifica-se também no cancro colorretal.
Faecalibacterium
prausnitzii é uma das principais
fontes de ácido butírico no cólon, e os múltiplos efeitos do
butirato, como fonte preferencial de energia para os colonócitos e
sobre a apoptose, inflamação e stress oxidativo, são geralmente
considerados benéficos para a saúde intestinal. Faecalibacterium
prausnitzii tem efeitos
anti-inflamatórios apreciáveis.
Faecalibacterium
prausnitzii tem o crescimento
dificultado pela diminuição do pH, e o mesmo se verifica na
presença de sais biliares. Na verdade, a concentração de sais
biliares no lúmen colónico é um factor importante, que pode
restringir a população de Faecalibacterium prausnitzii
nos locais onde a concentração
de bilis é mais alta, nomeadamente no intestino delgado. As melhores
taxas de crescimento do Faecalibacterium prausnitzii
verificam-se a pH de 6.7 e o crescimento é inibido a pH de 5.75.
Concentrações de sais biliares acima de 0.5 % impedem o crescimento
da Faecalibacterium prausnitzii.
O
principal produto produzido pela fermentação da pectina pela
Faecalibacterium prausnitzii é
o butirato.
Faecalibacterium
prausnitzii é uma bactéria
imóvel, produtora de butirato, formato e lactato, mas não
hidrogéneo, como produtos da fermentação que realiza. De referir
que apenas produz d-lactato e não l-lactato.
Embora
fenotipicamente Gram negativo, Faecalibacterium prausnitzii
é geneticamente relacionado com
os clostrídios Gram positivos, pertencendo, de facto, aos Clostridium
grupo IV. Esta relação filogenética só foi descoberta com o
advento da era molecular.
Faecalibacterium
prausnitzii é um bacilo
anaeróbio estrito, imóvel que hidroliza a frutose,
frutooligossacarídeos, amido e inulina. Não utiliza arabinose,
melibiose, rafinose, rhamnose, ribose e xilose. Utiliza acetato ( ao
contrário dos outros Fusobacterium spp
que produzem acetato, e que é mais uma evidência de serem um grupo
diferente daquele a que Faecalibacterium prausnitzii
pertence, a que se adiciona o
conteúdo de G + C do DNA que na Faecalibacterium
prausnitzii é de 47-57 mol %
enquanto que nas Fusobacterium spp é
de 26-34 mol % ) e produz dióxido de carbono mas não hidrogéneo. É
capaz de hidrolizar arginina e histidina, mas não prolina,
leucina-glicina, fenilalanina, leucina, tirosina, alanina, serina,
ácido piroglutâmico e ácido glutamilglutâmico e glicina. Os
principais produtos da fermentação da glucose são o formato,
butirato e d-lactato mas não l-lactato.
A
produção de butirato e d-lactato pela Faecalibacterium
prausnitzii é de importância
significativa devido ao papel que o butirato joga como fonte de
energia dos colonócitos, e na prevenção de colite e cancro
colorretal. Já a produção de d-lactato pode ser de importância
significativa em vista dos efeitos potencialmente tóxicos de acúmulo
de d-lactato na via sanguínea.
Faecalibacterium
prausnitzii é uma bactéria
comensal, pertencente à microbiota intestinal, com potencialidades
anti-inflamatórias e que se relaciona com o aparecimento da doença
de Crohn. Uma diminuição da abundância e da biodiversidade das
bactérias intestinais do phylum Firmicute
tem sido, repetidamente, observado em doentes com doença de Crohn.
Dentre os Firmicutes,
observa-se que a diminuição da Faecalibacterium
prausnitzii está associada a um
maior risco de recorrência ileal da doença de Crohn.
Estimulação
de mononucleares do sangue periférico pela Faecalibacterium
prausnitzii levou a abaixamento
significativo da IL-12 e γ-interferão
e secreção mais elevada de IL-10. Administração oral de
Faecalibacterium prausnitzii reduz
marcadamente a colite e corrige a disbiose associada.
Faecalibacterium prausnitzii exibe
efeitos anti-inflamatórios parcialmente devido à secreção de
metabolitos capazes de bloquear a activação do NF-kB e a produção
de IL-8. Isto sugere que a utilização de Faecalibacterium
prausnitzii, como probiótico,
é uma medida promissora na estratégia terapêutica da doença de
Crohn.
A
recorrência endoscópica da doença de Crohn está associada a uma
menor proporção de Faecalibacterium prausnitzii na
microbiota intestinal. A hipótese de que a remissão da doença de
Crohn está estreitamente associada à presença de Faecalibacterium
prausnitzii é uma hipótese
muito plausível, assentando nos dados actuais.
Faecalibacterium
prausnitzii exerce efeitos
anti-inflamatórios sobre as células mononucleares do sangue
periférico. Também se verificou que os Lactobacillus
salivaris apresentam efeitos
anti-inflamatórios in vivo
bem documentados. Pelo contrário, Lactobacillus
acidophilus e Lactobacilus
lactis, bem como a E.coli
TG1 não apresentam efeitos anti-inflamatórios.
Faecalibacterium
prausnitzii, bem como
L.sallivaris, são
muito fracas indutoras das citoquinas pro-inflamatórias/Th1 ( como
as citoquinas IL-12 e γ-interferão
) e fortes indutoras da IL-10, uma citoquina anti-inflamatória. A
razão IL-10/IL-12 é utilizada frequentemente para distinguir entre
estirpes que exibam acção anti-inflamatória ( razão elevada ) das
que exibem acção pro-inflamatória ( razão baixa ).
Faecalibacterium prausnitzii exibe
a mais elevada razão de entre todos os probióticos.
Sobrenadante
preparado de Faecalibacterium prausnitzii
reduz a secreção da IL-8 pelas células Caco-2 e tem capacidade de
abulir a activação do NF-kB em linhas celulares Caco-2. Este
sobrenadante não apresenta qualquer efeito antibacteriano.
Tanto
o sobrenadante como a Faecalibacterium prausnitzii
induzem um aumento da secreção de IL-10 e uma diminuição de α-TNF
e IL-12. Também a disbiose é contrabalançada pelo sobrenadante e
pela Faecalibacterium prausnitzii.
Está
comprovado que os componentes microbianos da microbiota intestinal
residente podem regular a inflamação intestinal.
Faecalibacterium
prausnitzii é uma forte
bactéria anti-inflamatória intestinal. Esta bactéria parece ser
essencial para a homeostasia intestinal . Faecalibacterium
prausnitzii altera a actividade
do NF-kB induzida pela IL-1β
e o seu sobrenadante tem a capacidade de abolir mesmo essa actividade. Este efeito sobre o
NF-kB não é devido ao butirato.
Faecalibacterium
prausnitzii pode dirigir a
resposta imune através da inibição da via do Th1.
Faecalibacterium prausnitzii
associa-se a um decréscimo da síntese de citoquinas colónicas
pro-inflamatórias ( IL-12, γ-INF
) e uma indução das citoquinas anti-inflamatórias ( IL -10 ).
Na
doença de Crohn verificou-se uma diminuição das bactérias do
phylum Firmicutes,
especialmente da Faecalibacterium prausnitzii,
e verificou-se que o sobrenadante das culturas destas bactérias tem
propriedades anti-inflamatórias. Os níveis totais de
Faecalibacterium prausnitzii,
tanto antes como depois do tratamento, verificaram-se ser inferiores
em doentes com doença de Crohn, comparativamente com controlos
normais. Não se verificou correlação entre a abundância de
Faecalibacterium prausnitzii
e a severidade da doença de Crohn antes do tratamento.
A
doença de Crohn é uma doença auto-imune, em que há um ataque
imunológico dirigido às bactérias comensais do cólon. A cobertura
das bactérias colónicas pelas imunoglobulinas aproxima-se dos 100%
na doença de Crohn activa, comparando com cerca de 20% em pessoas
saudáveis e indivíduos com síndrome de colon irritável. Após
alimentação entérica esta cobertura diminui rapidamente.
Algumas
bactérias da microbiota intestinal normal produzem butirato, como é
o caso da Faecalibacterium prausnitzii.
O butirato é a fonte de energia principal para os colonócitos, e
também possui propriedades anti-inflamatórias e anticarcinogéneas.
Devido ao butirato ser a principal fonte energética dos colonócitos,
a diminuição dos Firmicutes,
e particularmente Faecalibacterium prausnitzii,
na doença de Crohn é um dado importante para o tratamento desta
doença, dado que a diminuição verificada de Faecalibacterium
prausnitzii leva a uma
diminuição de ATP, derivado do butirato intracelular das células
do epitélio intestinal. Concomitantemente, e devido à perda dos
agentes anti-inflamatórios que derivam da Faecalibacterium
prausnitzii, há uma diminuição
da capacidade dos colonócitos combaterem infecções. Por estes 2
motivos, a terapêutica por recolonização com Faecalibacterium
prausnitzii é justificada.
A
microbiota intestinal é um complexo ecossistema que influencia de
modo decisivo a imunorregulação do hospedeiro, concedendo protecção
contra a colonização de patogéneos e produzindo ácidos gordos de
cadeia curta como fonte principal de energia para os colonócitos.
A
microbiota intestinal também produz ácidos gordos de cadeia curta
através do metabolismo de substancias fermentáveis, tais como as
fibras da dieta. Estes ácidos gordos de cadeia curta estimulam a
absorpção da água pelo cólon e o butirato é a principal fonte de
energia dos colonócitos. O butirato promove o crescimento dos
colonócitos, prevenindo a atrofia da mucosa e diminui o risco de
malignização no cólon, sendo assim benéfico para a integridade da
função barreira da mucosa colónica. Faecalibacterium
prausnitzii e
Roseburia spp são as principais
bactérias comensais colónicas produtoras de butirato pela
fermentação do lactato. Assim a resistência à colonização e a
produção de ácidos gordos de cadeia curta são importantes funções
da microbiota intestinal. Por acções diversas, como
antibioticoterapia ou redução da biomassa fermentável, a
capacidade da microbiota em exercer estas acções é reduzida. A
principal fonte de biomassa fermentável são as fibras dietéticas.
A
redução da contagem total de bactérias e da produção dos ácidos
gordos de cadeia curta é, parcialmente, neutralizada pela adição de
fibras e frutooligossacarídeos à dieta. Em dietas livres de fibras,
a concentração de butirato verificou-se sofrer uma redução.
O
butirato correlaciona-se bem com a dieta livre ou suplementada em
fibras. Verificou-se haver forte correlação entre Faecalibacterium
prausnitzii e a produção de
butirato durante uma dieta normal, e verifica-se uma redução de
Faecalibacterium prausnitzii
quando se muda para uma dieta livre de fibras ou para uma dieta
líquida suplementada por fibras com consequente redução do
butirato fecal. Bifidobacteria aumentam
em proporção durante a instituição de uma dieta contendo fibras
nas quais frutooligossacarídeos estejam presentes. Isto pode
explicar porque a concentração de acetato é aumentada
comparativamente com as dietas livres de fibras, uma vez que as
Bifidobacteria são os
principais produtores de acetato. Outras bactérias responsáveis
pela produção de butirato, como as Roseburia spp,
são associadas a fibras insolúveis e fermentam-nas como fonte
energética.
Baixas
quantidades de fontes primárias de energia ( ex.: butirato ) para os
colonócitos podem resultar em diminuição da integridade da
barreira intestinal.
Verificou-se
que uma dieta livre de fibras ou suplementada de fibras, onde as
fibras de ervilha constituem a fracção principal de fibras
insolúveis, é acompanhada por números menores de Faecalibacterium
prausnitzii e Roseburia
spp que se correlacionam com
concentrações mais baixas de butirato fecal.
Constactou-se
que a recorrência endoscópica das lesões da doença de Crohn estão
bem correlacionadas com uma proporção reduzida de
Faecalibacterium prausnitzii.
A Faecalibacterium prausnitzii
exerce os seus efeitos anti-inflamatórios nas células mononucleares
do sangue periférico. Faecalibacterium prausnitzii
tem o mais alto poder de indução das IL-10 e o mais alto poder de
inibição das IL-12, γ-interferão
e α-TNF, em comparação com as outras bactérias comensais do cólon. O
sobrenadante da Faecalibacterium prausnitzii
inibe fortemente a activação do NF-kB ( factor nuclear do activador
das cadeias leves da células B ), um potente pró-inflamatório.
Está
perfeitamente estabelecida a capacidade da microbiota residente
colónica poder regular a inflamação intestinal.
Faecalibacterium
prausnitzii exibe efeitos
anti-inflamatórios parcialmente devido aos metabolitos secretados
bloqueadores da activação do NF-kB e secreção de IL-8. Além
disso, verifica-se haver uma diminuição da síntese de citoquinas
pró-inflamatórias colónicas e um aumento das citoquinas
anti-inflamatórias ( IL-10 ). Contrabalançando a disbiose, pela
utilização de Faecalibacterium prausnitzii,
parece ser uma promissora estratégia terapêutica para a doença de
Crohn.
Faecalibacterium
prausnitzii tem a capacidade de
transferir electrões extracelularmente para o oxigénio, em sistemas
contendo flavinas e tióis. Dado que esta transferência estimula
fortemente o crescimento Faecalibacterium prausnitzii
pode utilizar riboflavina como mediador de transferência de
electrões, extracelular, para o ánodo do sistema celular de
combustível microbiano. A riboflavina medeia a oxidação
electroquímica das principais bactérias redutoras de NADH.
Faecalibacterium
prausnitzii é um componente
integral da balança anti-inflamatória na saúde e a sua redução
pode contribuir, directamente, para promover o estado de doença.
Bacteroides fragilis é
um microorganismo capaz de iniciar o processo inflamatório
intestinal , mas também dirige a resposta imunológica
anti-inflamatória. Componentes individuais da microbiota podem assim
apresentar comportamentos distintos consoante as condições em que
se apresentam.
Actualmente
tem-se por adquirido que a microbiota intestinal é considerada como
o pivot na patogenia da doença inflamatória intestinal. A DII no
adulto associa-se a alterações microbianas e a uma diminuição da
diversidade bacteriana. Faecalibacterium prausnitzii
parece ter um papel protector na doença de Crohn estabelecida.
A
microbiota joga um papel fundamental na imunidade celular e no
metabolismo da energia, tendo sido implicada na patogénese de
doenças autoimunes não gastro-intestinais, síndrome da fadiga
crónica, obesidade, alterações neuropsiquiátricas, PTI e outras
doenças.
Transplante
de microbiota fecal, é um procedimento terapêutico que consiste em
transplantar material fecal directamente no indivíduo a receber o
transplante, seja por enema, coloscopia ou mesmo por via oral
misturado com alimento. Apenas um caso foi descrito, até ao
momento, para o tratamento da doença de Crohn, caso esse refratário
à prednisona e salazopirina, tendo respondido, em 3 dias, ao
tratamento com transplante de microbiota fecal, permitindo a
descontinuação da medicação anterior e mantendo-se em fase de
remissão há mais de 18 meses. A remissão pode, no entanto, obrigar
a múltiplos transplantes de microbiota intestinal.
Nos
doentes com doença de Crohn verificou-se que o CDAI, a PCR e a VS
eram significativamente inferiores e a albuminemia significativamente
superior naqueles doentes com Faecalibacterium prausnitzii
em concentrações mais elevadas, comparativamente com os que as
apresentam em concentrações menores. Verificou-se também que as
comunidades bacterianas fecais nos doentes de Crohn são diferentes
comparativamente com os indivíduos saudáveis, constatando-se uma
diminuição da classe Clostridium,
incluindo o género Faecalibacterium.
A diversidade bacteriana colónica é significativamente diminuída.
A
diminuída abundância da classe Clostridium,
incluindo Faecalibacterium prausnitzii,
pode traduzir-se numa redução da actividade anti-inflamatória na
mucosa, mediada pelas bactérias comensais, que é relevante na
fisiopatologia da doença de Crohn.
http://www.youtube.com/watch?v=eAzVyOq_ZBQ
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