Desregulação
do TET 2 e doenças mielóides malignas
Em
muitos cancros, incluindo doenças hematológicas malignas,
verifica-se o aparecimento de mutações aberrantes do DNA, sendo a
hipermetilação dos genes supressores tumorais uma dessas
aberrações. Esta característica levou à procura, e posterior
descoberta, de agentes com a capacidade de reverter a hipermetilação,
como sejam inibidores da metiltransferase do DNA, que se tem vindo a
tornar encorajante no tratamento da SMD e algumas leucemias agudas.
O
gene TET 2 α-cetoglutarato
dependente é fortemente relacionado com o TET 1, cujo produto
proteico é responsável pela conversão do 5mC ( 5- metilcitosina )
em 5hmC ( 5-hidroximetilcitosina ) no DNA. Mutações somáticas no
gene TET 2 ocorrem com frequência nos doentes com doenças mielóides
malignas, incluindo SMD, LMA, neoplasias mieloproliferativas e LMMC.
Mutações
de TET 2 associam-se com baixos níveis de 5hmC comparativamente com
controlos saudáveis.
Verificou-se
que a desregulação de TET 2 está associada com a hipometilação
mais do que com a hipermetilação. Conclui-se que TET 2 joga um
importante papel na mielopoiese normal, existindo uma forte
associação entre doenças mielóides malignas e a perda da função
catalítica do TET 2. Também está proposto que o nível de 5hmC
celular de doentes com doenças malignas mielóides pode ter
significado prognóstico independente e proporcionar a base
terapêutica destas patologias.
Na
LMA, mutações do gene do metabolismo do citrato ( isocitrato
desidrogenase 1 e 2 – IDH 1 e IDH 2 ) foram demonstradas terem
papel relevante por interferência da função do gene TET 2.
Mutações
de IDH1 e IDH 2 resultam em produção de 2 hidroxiglutamato e
inibição da função de TET 2
TET
2 ( ten eleven translocation 2 ou metilcitosina desoxigenase 2 ) é o
gene que dá as instruções para o fabrico de uma proteína
envolvida na regulação do processo de transcripção, primeiro
processo da síntese proteica.
Embora
a proteína TET 2 exista em todo o organismo, ela joga um papel
particularmente importante na produção sanguínea a partir das stem
cells hematopoiéticas, localizadas na medula óssea, e que originam
as 3 linhas celulares sanguíneas ( leucócitos, eritrócitos e
plaquetas ). A proteína TET 2 actua como supressor tumoral
prevenindo as células de crescerem e dividirem de forma
descontrolada.
Mutação
somática do gene TET 2 foi observada em alguns doentes com
trombocitémia essencial. Nesta condição patológica, a mutação
do gene TET 2 altera a proteína TET 2 de formas diferentes,
resultando todas elas numa proteína não funcional.
Na
policitémia vera verifica-se, em alguns casos, a ocorrência da
mutação TET 2, resultando na produção de uma proteína não
funcional. Isto ocorre em cerca de 16% dos casos de policitémia
vera.
Mutação
do gene TET 2 associa-se à mielofibrose primária, sendo
desconhecido o papel desta mutação na patologia.
Mutações
do gene TET 2 associam-se ainda a outras patologias tumorais, como
sejam leucemias e síndrome mielodisplásico. A perda da proteína
TET 2 nas stem cells hematopoiéticas pode levar ao crescimento
descontrolado e divisão destas células.
O
gene TET 2 localiza-se no braço longo do cromossoma 4, na posição
24. A mutação deste gene foi inicialmente identificada em
neoplasias mielóides, com delecção ou dissomia uniparental, na
localização 4q24.
Como
se referiu anteriormente, o gene TET 2 codifica uma proteína que
suprime o crescimento tumoral. Este gene TET 2 está mutado em cerca
de 16% dos doentes com policitémia vera e 22% dos doentes com SMD ou
LMA.
Em
cerca de 60% dos doentes com o gene TET 2 mutado, associam-se outras
mutações e anormalidades cromossómicas protectoras, conhecidas
como risco citogenético “bom”. Em comparação, apenas cerca de
40% dos doentes com gene TET 2 normal, não mutado, apresentam risco
citogenético “bom”.
TET
2 localiza-se numa região ( 4q24 ) que apresenta recorrentes
microdelecções e cópias de perda neutral de heterozigocidade ( LOH
) em doentes com várias malignidades mielóides. Mutações
somáticas do gene TET 2 são frequentemente observadas em doentes
com SMD, neoplasias mieloproliferativas, síndrome mieloproliferativo
mielodisplásico, LMMC, LMA e LMA secundária.
Stem
cells hematopoiéticas com alterações em TET 2 são capazes de
reconstituirem a multilinhagem sanguínea e possuem uma vantagem
competitiva sobre as stem cells normais, resultando numa hematopoiese
aumentada tanto na linhagem linfóide como mielóide.
Alteração
de TET 2 atrasa a diferenciação das stem cells hematopoiéticas e
desvia o desenvolvimento para a linhagem monocítica/macrofágica.
TET
2 tem um papel crítico na regulação da expansão e função das
stem cells hematopoiéticas, provavelmente pelo controlo dos níveis
de 5hmC nos genes importantes no envolvimento da auto-renovação,
proliferação e diferenciação das stem cells hematopoiéticas.
A
incidência da mutação TET 2 associa-se com a idade, sendo maior
nos doentes com mais de 50 anos ( 17% dos doentes com mais de 50 anos
e 9% nos doentes com menos de 50 anos apresentam a mutação TET 2
).
A
SMD é uma alteração clonal da hematopoiese que se caracteriza por
displasia , hematopoiese ineficaz e citopenias periféricas. A
evolução da SMD para LMA ocorre em cerca de 25% dos casos.
A
proteína TET 2 é um membro da família das proteínas TET
constituída por 3 proteínas ( TET 1, TET 2 e TET 3 ) que partilham
entre si 2 domínios fortemente conservados. A proteína TET 1 foi
implicada na leucemia como parceiro de fusão do produto do gene MLL ( gene da leucemia de linhagem mista ou leucemia mielóide linfóide ) na translocação cromossómica t(10;11)(p12;q23) e foi demonstrado
ser capaz de hidroximetilação e assim contribuir para a metilação
da citosina e regulação epigenética do gene. Foram identificadas
mutações do gene TET 2 em 19-26% dos casos com SMD e cerca de 50%
dos casos de LMMC, sendo desta forma esta mutação uma das mais
frequentes nestas neoplasias mielóides.
Importante
assinalar que embora as mutações TET 2 sejam um acontecimento
precoce deste tipo de doenças ( mieloproliferativas e
mielodisplásicas ) e surjam mesmo lesões pré-JAK 2 nas neoplasias
mieloproliferativas ( policitémia vera, trombocitose essencial e
mielofibrose primária ), as mutações TET 2 e JAK 2 podem ocorrer,
e ocorrem na maioria dos casos, independentemente uma da outra. Isto
é sublinhado nos casos em que a mutação TET 2 ocorre apenas na
altura da transformação leucémica mielóide das neoplasias
mieloproliferativas.
Na
maioria dos casos, a mutação do gene TET 2 causa inactivação da
proteína TET 2, sugerindo um papel de supressor tumoral desta
proteína TET 2. De salientar que o mRNA do TET 2 é fortemente
expressado nas células progenitoras mielóides normais, granulócitos
normais ou eritrócitos normais em contraste com o que se verifica de
reduzida expressão de TET 2 naquelas células em doentes com SMD.
As
regiões conservadas na família de proteínas TET ( regiões cons'd
1 e 2 ) são implicadas na conversão de 5-metilcitosina para
5-hidroximetilcitosina e correspondem, essas regiões, aos
amino-ácidos 1104 - 1478 e 1845 – 2002, respectivamente.
Múltiplas
mutações podem ocorrer no mesmo doente, simultaneamente.
Significativo
o facto de SMD com a anormalidade 5q- não costumar apresentar a
mutação TET 2.
Estado
citogenético, sexo, subtipos WHO, transformação para LMA e score
IPSS não se correlacionam, habitualmente, com a mutação TET 2.
Também não se atribui associação clínica com o tamanho da
mutação clonal ou a presença de mutação singular versus múltipla
do TET 2
Homozigocidade
para a mutação TET 2 é definida como uma abundância relativa de
mutação ( RMA ) superior a 65%
A
sobrevivência global não é afectada pela homozigocidade,
existência ou não da mutação TET 2, alto ou baixo nível da
mutação, presença de mutação única ou múltipla ou score IPSS.
Pode-se
dizer que a presença da mutação TET 2 não influencia a
sobrevivência global destes doentes. Idade avançada do doente,
classificação WHO e subtipo citogenético são as únicas variáveis
que significativamente afectam a sobrevivência global destes
doentes.
As
mutações TET 2 têm sido identificadas numa gama de doenças
malignas mielóides e são das mais frequentes mutações genéticas
associadas a SMD, sendo estas mutações de significado prognóstico
ainda controverso.
Um
dado importante é a variedade de clones com baixa abundância de
mutação TET 2.
A
existência de baixo, mas significativo, número de clones minor é
indicativa da evolução clonal da doença. Este facto é sublinhado
por vários casos de mutações múltiplas, onde se observa uma
mutação dominante, e outras populações pouco abundantes,
sugerindo uma competição clonal.
Foi
sublinhada a ocorrência de mutação TET 2 em células CD 34,
reforçando a ideia desta aberração genética ser uma lesão
inicial da doença.
A
mutação TET 2 é ubiquitativa entre as linhagens mielóides e
linfóides, sugerindo que tal mutação ocorre precocemente na
hematopoiese. A mutação TET 2, como anteriormente se referiu,
precede a mutação JAK2V617F nas neoplasias mieloproliferativas.
Mutações
TET 2 e aberrações genómicas afectando o locus 4q24 são
acontecimentos independentes, e podem não ocorrer os dois
simultaneamente, como é o caso do surgimento de LOH ( lost of
homozygosity ) e mutação TET 2 em alguns doentes com SMD.
Uma característica importante da SMD é o aumento da frequência da
dissomia uniparental ( UPD ) que é uma medida indirecta da
instabilidade genómica. Não se verificam diferenças significativas
entre doentes com mutação TET 2 ou sem ela na frequência das UPD,
sugerindo que os defeitos TET 2 não contribuem para a instabilidade
genómica geral.
Não
há evidência que os casos com homo ou hemizigotia para a mutação
TET 2 apresentam reduzida sobrevivência, comparativamente com os
casos de mutação heterozigótica, como se poderia esperar se o TET
2 aberrante orientasse a doença independentemente. A falta de
correlação entre a presença de mutação de TET 2 e o prognóstico
da SMD sugere que vários outros factores afectam o fenótipo do SMD,
apesar da aquisição da mutação somática TET 2 ser um
acontecimento relevante na patogenia e transformação de SMD.
Texto muito bom e de fácil entendimento, mas falta as referencias bibliográficas do material :(
ResponderEliminar