quarta-feira, janeiro 29, 2014

Leucotrienos e lipoxinas

Leucotrienos e Lipoxinas

Lipoxinas são anti-inflamatórios eicosanóides, sintetizados através da interacção da lipoxigenase sobre o ácido araquidónico. As acções anti-inflamatórias das lipoxinas são parcialmente função da sua capacidade de inibição das acções dos leucotrienos.


Existem 3 vias de síntese das lipoxinas a partir do ácido araquidónico. A via clássica, que implica a actividade do 5-LOX nos leucócitos seguida pela acção da 12-LOX nas plaquetas. A segunda via, é a via na qual a acção da 15-LOX das células epiteliais se faz sentir seguida da acção da 5-LOX dos leucócitos. A terceira via, ou via da aspirina, é aquela na qual a aspirina actua na COX-2, no epitélio respiratório, nas células endoteliais ou nos monócitos, com produção de 15-epi-lipoxina com subsequente acção da 5-LOX para produção de lipoxinas.
Doses baixas de aspirina levam a efeitos anti-inflamatórios devidos à sua capacidade de activar a síntese de lipoxinas ( LXA4, LXB4 ); já doses altas de aspirina não actuam sobre a síntese das lipoxinas.


Como se vê, na figura, as duas vias clássicas para a síntese das lipoxinas resultam das acções do 15-LOX das células epiteliais e das 5-LOX leucocitárias ou pela acção combinada do 5-LOX leucocitário seguida da acção da 12-LOX plaquetária. A outra via é a via da acção da aspirina com síntese das lipoxinas epiméricas, 15-epi-LXA4 e 15-epi-LXB4, via na qual há activação de leucócitos, geralmente polinucleares, que actuam sobre o endotélio.
As lipoxinas são potentes anti-inflamatórios eicosanóides, que actuam de forma antagónica aos eicosanóides pró-inflamatórios leucotrieno A4 e também PgE2 e tromboxano A2.


Os leucotrienos A4 e B4 promovem o relaxamento da vasculatura ( aórtica e pulmonar ). Lipoxinas e epi-lipoxinas inibem a quimiotaxia dos leucócitos polimorfonucleares, vasopermeabilidade mediada pelos polimorfonucleares e a adesão e migração dos polimorfonucleares ao endotélio vascular.


A lipoxina também actua pelo bloqueio da expressão do gene da IL-8, interleuquina com acção sobre a migração leucocitária, acção da α-TNF e a síntese de βTGF ( transforming groth factor β ).
A LXA4, em alguns tecidos, leva à produção de PgI2 e óxido nítrico.

Os leucotrienos são sintetizados predominantemente pelos mastócitos, macrófagos, eosinófilos e basófilos a partir do ácido araquidónico.


Os leucotrienos sintetizados a partir do ácido araquidónico são o LTA4 ( instável ) que é rapidamente convertido em LTB4 e LTC4 pela acção de uma hidrolase ou da sintetase LTC4, respectivamente. O LTC4 é transportado activamente ao exterior da célula, onde se metaboliza a LTD4 e, posteriormente, LTE4. Os leucotrienos C4, D4 e E4 possuem um radical cisteína e, por isso, se chamam cisteinil-leucotrienos, sendo que estes têm 2 tipos de receptores, nomeadamente receptor para LTB4 e receptor para cisteinil-leucotrienos. Os receptores cisteinil-leucotrienos têm 2 subtipos sendo um bloqueado pelos antagonistas ( receptores CisLT1 ) e um subtipo resistente ao bloqueio ( receptores CisLT2 ).

O receptor para LTB4 foi encontrado em placas ateroscleróticas, pelo que se acredita estar relacionado com a patogenia da aterosclerose. Processos inflamatórios, como alergia ou asma, têm os leucotrienos envolvidos na sua patogenia.
Especula-se haver incremento da actividade de 5-LOX em doenças neurológicas como a depressão e ansiedade.

Na síntese dos leucotrienos, a etapa chave é a síntese de 5-HPETE, pela acção do 5-LOX, a partir do ácido araquidónico libertado dos fosfolípidos da membrana pela fosfolipase A2. As lipoxigenases ( 5-LOX, 12-LOX e 15-LOX ) constituem uma família de enzimas citoplasmáticas que oxidam o ácido araquidónico. O constituinte principal é a 5-LOX que promove a bioformação dos leucotrienos.


Ao contrário das LOX's, as COX's estão em todas as células excepto nos eritrócitos maturos e têm por função a ciclização seguida de oxidação do substracto, produzindo as prostaglandinas intermediárias PgG2 e PgH2, percursoras das prostaglandinas e tromboxanos.



Os leucotrienos C4, D4 e E4 resultam da adição do glutatião ao LTA4 pela glutatião-S-transferase e são potentes mediadores da inflamação. O LTA4 também pode originar o LTB4, que é um potente quimiotático. Os leucotrienos, ao contrário das prostaglandinas, não são ubiquitas e apresentam-se fundamentalmente nos pulmões, leucócitos, plaquetas e fígado. Os leucotrienos são potentes mediadores da inflamação local e não são inibidos pelos AINE's.


Uma consequência potencial do bloqueio das COX's pelos AINE's é o aumento da produção dos leucotrienos a partir do ácido araquidónico, por este não ser metabolizado com vista à formação de prostaglandinas. A hipersensibilidade à aspirina está relacionada com este desvio da rota de metabolização do ácido araquidónico, já que os leucotrienos são mais inflamatórios que os produtos da prostaglandina H sintase.


Estes fármacos alteram a resposta imunitária, seja celular ou humoral, e podem suprimir outros mediadores da inflamação diferentes das prostaglandinas.
Os AINE's alteram a resposta inflamatória inibindo a activação dos neutrófilos com consequente libertação das enzimas celulares inflamatórias como colagenase, elastase, hialuronidase e outras. Os AINE's também intervêm na imunomodelação, pois várias prostaglandinas e leucotrienos são imunomodeladores. A PgE2, pela sua inibição, leva a um aumento da imunidade celular.
Os corticóides inibem a libertação do ácido araquidónico dos fosfolípidos da membrana, diminuindo os produtos, tanto da COX como da LOX. Em pessoas sensíveis, a aspirina e os AINE's apresentariam acção farmacológica inibitória sobre a actividade da prostaglandina sintetase, inibindo as COX-1 e COX-2 em todas as células, resultando na interrupção da síntese da PgE2 e seus efeitos modeladores nas células inflamatórias e superprodução de cisteinil-leucotrienos ( Cis-LT ) pelo direccionamento para a via da LOX.

A resposta imune ocorre quando as células imunocompetentes se activam ante organismos estranhos ou substâncias antigénicas libertadas durante a resposta inflamatória aguda ou crónica. O resultado deste processo pode ser benéfico, pois os organismos invasores são fagocitados ou neutralizados, ou esse processo ser prejudicial se se conduz a um processo inflamatório crónico sem resolução do processo prejudicial subjacente. A inflamação crónica implica a libertação de mediadores não proeminentes na resposta aguda, nomeadamente interleucinas ( IL-1, IL-2, IL-3 ), α-TNF, interferãos e factores de crescimento derivados das plaquetas. A lesão celular na inflamação leva à libertação de enzimas lisosómicas leucocitárias, ao que se segue a libertação de ácido araquidónico dos fosfolípidos da membrana por acção da fosfolipase A2. Os eicosanóides actuam directamente no processo inflamatório e derivam do ácido araquidónico.
A acção das LOX's sobre o ácido araquidónico dá origem aos ácidos hidroperoxieicosatetraenóicos ( HPETES ) que originam derivados hidróxidos e leucotrienos.

A 5-LOX encontra-se nas células inflamatórias ( neutrófilos, mastócitos, basófilos, macrófagos e eosinófilos ). Esta enzima, 5-LOX, origina a LTA4 que se converte em LTB4 ou em LTC4 ( esta última se se conjuga com glutatião ) e esta por sua vez origina LTD4 e LTE4 pela acção das peptidases.

sábado, janeiro 18, 2014

Microbiota intestinal e cancro colorrectal

Bactérias intestinais podem afectar o risco de cancro colorectal

Doentes com cancro colorrectal apresentam uma diversificação da microbiota intestinal mais reduzida, comparativamente com pessoas não atingidas por esse tipo de cancro.
Pacientes com cancro colorrectal mostram uma menor abundância de Clostridia, comparativamente com quem não apresenta esse tipo de cancro. Pelo contrário, uma maior abundância de Fusobacterium se verifica em doentes com cancro colorectal.
Risco maior de desenvolvimento de cancro colorrectal se relaciona com Actinobacteria atopobium e Bacteriodetes porphyromonas
Atopobium, uma bactéria gram positivo, associa-se à doença de Crohn, pensando-se que seja capaz de inibir a apoptose das células cancerígenas .


Doentes com cancro colorectal tendem a ter mais Bacteriodetes e menos Firmicutes, sendo a diminuição das Firmicutes feita, principalmente, por redução do número de Clostridia, que têm acção na fermentação eficaz das fibras dietéticas e outros carbohidratos complexos sintetizando assim o butirato, um metabolito colónico com capacidade de  inibição da inflamação no cólon e a carcinogénese.

quarta-feira, janeiro 15, 2014

EBV ( Virus Epstein-Barr )

EBV ( Virus Epstein-Barr )


O EBV é constituído por DNA e capsídeo, dando-se a este conjunto o nome de núcleocapsídeo, envolvido por um envelope lipoglicoproteico, de cerca de 150 nm de diâmetro. O DNA do EBV consegue codificar cerca de 100 proteínas que têm importância na regulação da expressão dos genes virais, formação dos componentes estruturais virais, replicação do genoma e modulação da resposta imune do hospedeiro.
Dois tipos de EBV foram identificados, nomeadamente EBV-1 e EBV-2, que se distribuem geograficamente de forma diferente, e que apresentam diferenças de antigéneos nucleares e na habilidade de infectar e imortalizar os linfócitos B infectados. Enquanto o EBV-1 aparece mais em sociedades desenvolvidas, o EBV-2 é mais frequente em África.
Seis tipos de antigéneos nucleares de EBV foram identificados, nomeadamente EBNA-1, EBNA-2, EBNA-3A, EBNA-3B, EBNA-3C e EBNA-LP.
O EBV possui, entre outras proteínas, a proteína latente da membrana ( LMP-1 ) com potencial oncogénico e que funciona como activador da α-TNF. A latência do EBV reside nas células B humanas, tipo de infecção esta ( latente ) em que o genoma viral se incorpora no da célula hospedeira de forma permanente. Outro tipo de infecção existe por parte do EBV, a infecção lítica, onde o DNA do EBV induz a produção de proteínas virais, a lise do linfócito e a libertação dos viriões, mas que normalmente não ocasiona efeitos citopáticos das células infectadas.
O EBV tem a capacidade de imortalizar linfócitos B. Os linfócitos B imortalizados produzem várias imunoglobulinas policlonais das classes IgG, IgA e IgM. Os anticorpos heterófilos são o resultado da produção de imunoglobulinas policlonais pelos linfócitos B imortalizados.
Após, cerca de 24 horas do EBV ter entrado no linfócito, a presença de EBNA pode ser detectada, sendo o EBV o responsável pela imortalização do linfócito. Uma minoria de linfócitos B infectados por EBV sofre lise e liberta antigéneos específicos do EBV, indicando replicação viral activa. Estes antigéneos são EA e VCA. As proteínas do VCA expressam-se de forma abundante, induzindo infecção primária, ocorrendo resposta com formação de anticorpos IgM anti-VCA seguida de IgG anti-VCA que se pode detectar o resto da vida.
A resposta do hospedeiro à infecção por EBV, além de humoral, é também celular, com a participação de linfócitos T virus-específicos CD8 e de células NK.

Importante ter a noção que os anticorpos heterófilos estão ausentes, por regra, nas crianças pequenas ( antes dos 4 anos ), pelo que um resultado negativo não nos dá, em princípio, qualquer indicação diagnóstica quanto à mononucleose infecciosa.
Em doentes com menos de 4 anos, IgM anti-VCA deve ser sempre realizada, na tentativa de diagnosticar infecção por EBV.

O EBV é um virus da família dos γ-herpesvirinae, e é um dos mais comuns virus no Homem, aparecendo em 80-95% das pessoas. O contacto com o EBV nos países em desenvolvimento é de 100% até aos 3 anos, enquanto que nos países desenvolvidos a primeira infecção ocorre geralmente após os 3 anos e pré-adolescentes ou posteriormente entre os 14 e 20 anos de idade.



Após a protecção dos anticorpos maternos desaparecerem, as crianças tornam-se susceptíveis ao EBV. No entanto, a maioria das vezes a infecção pelo EBV é assintomática e indetectável. Quando a infecção por EBV acontece na adolescência ou vida adulta provoca a mononucleose infecciosa em 35-50% dos casos.


Embora a sintomatologia da mononucleose infecciosa desapareça ao fim de 1-2 meses, o EBV permanece dormente ou latente na laringe e sangue o resto da vida podendo reactivar mas sem causar sintomatologia.


O EBV também pode estabelecer infecção latente ao longo da vida em células do sistema imunológico, podendo causar linfoma de Burkitt e carcinoma nasofaríngeo e alterações linfoproliferativas em doentes imunodeprimidos. A transmissão do EBV requer contacto íntimo entre as pessoas, seja através da saliva, relações sexuais, transplante de órgãos ou transfusão sanguínea embora estas 2 últimas sejam ocorrências raras e discutíveis. Outro tipo de contacto, não íntimo, não tem relevância no contágio e propagação da mononucleose infecciosa, doença que obteve este nome pelo facto de os virus terem predilecção por infectarem linfócitos B e outras células mononucleares e não polinucleares. Os linfócitos T CD8+, com funções tanto citotóxicas quanto supressoras, em resposta aos linfócitos B infectados tornam-se linfócitos atípicos característicos da mononucleose. Isto acontece devido à reversão transitória da relação normal dos linfócitos T ( helper-supressores ) CD4+/CD8+.



Enquanto nos indivíduos normais a eliminação do EBV se faz durante cerca de 6 meses, já em indivíduos imunossuprimidos a eliminação pode ser feita durante toda a vida.
O virus latente é transportado, nas células epiteliais da orofaringe e nos linfócitos B sistémicos, como epissomas múltiplos no núcleo ( epissoma é um fragmento de DNA presente em células, que pode multiplicar-se livremente no citoplasma ou incorporar-se no cromossoma da célula ). Os epissomas virais replicam-se com a divisão celular e são distribuídos a ambas as células filhas. A síntese do cápside viral ( VCA ) culmina com a morte celular e libertação de viriãos maduros


O diagnóstico recorre ao laboratório para se realizar, e só o laboratório o pode confirmar por meio de exames serológicos, sendo que a leucocitose com aumento de células mononucleares atípicas verifica-se e reacção positiva de Paul-Bunnell, ou outra de pesquiza de anticorpos heterófilos, observa-se. De referir que resultados falsos positivos e falsos negativos podem verificar-se.
Em caso de mononucleose infecciosa podemos encontrar trombocitopenia leve, podendo ter valores de 50000 plaquetas por milímetro cúbico em cerca de 50% das situações, elevação leve das transaminases em cerca de 50% dos casos mas sem icterícia, leucocitose de 10000-20000 células/mm3, sendo cerca de 2 terços linfócitos, dos quais 20-40% são linfócitos atípicos ( células de Downey ) que, morfologicamente, são maiores, com maiores núcleos, excentricamente irregulares e pregueados e com uma relação núcleo/citoplasma mais baixa que a dos linfócitos normais.


O diagnóstico laboratorial deve ser feito em amostra de sangue colhida em fase aguda com despiste dos anticorpos para EBV com diversos antigéneos associados ao mesmo tempo possibilitando diagnosticar se a infecção é recente, passada ou reactivada.
Os anticorpos pesquizados são os do capsídeo viral ( VCA ), antigéneo precoce ( EA ), e antigéneo nuclear ( EBNA ). Também devem ser distinguidas as subclasses IgG e IgM para o VCA. Os anticorpos contra EA e EBNA não são realizados pela generalidade dos laboratórios e a sensibilidade destes anticorpos é menor que a dos anticorpos anti-VCA


Quando o teste “mono spot” é negativo, a melhor combinação é IgG e IgM para o VCA, IgM para EA e IgM para EBNA. A IgM do VCA aparece no início da infecção e desaparece às 4-6 semanas. A IgG do VCA aparece na fase aguda, com pico às 2-4 semanas, diminui e permanece o resto da vida positiva. O IgG do EA aparece na fase aguda da mononucleose infecciosa e cai para níveis indetectáveis cerca de 3-6 meses após o início da doença. Em cerca de 80% dos casos em que o IgG do EA é positivo, isso significa infecção activa, enquanto que em 20% dos doentes o IgG do EA pode persistir por toda a vida.



De referir, que o factor reumatóide pode causar um resultado de IgM anti-VCA falso positivo, pelo que há que ter precaução por forma a excluir a presença daquele factor reumatóide no soro testado.
Anticorpos para EBNA, determinados por imunofluorescência, não são vistos na fase aguda, subindo lentamente aos 2-4 meses após o início e persistem a vida toda. No entanto, determinações por imunoensaios detectam os anticorpos para EBNA mais precocemente, dentro de poucas semanas.

Células de Downey, células mononucleares atípicas que caracteristicamente se observam na mononucleose infecciosa ( mas não patognomónicas ), são linfócitos T CD8+ supressores citotóxicos activados

O virus do EBV infecta os linfócitos B que possuem receptores específicos. O EBV pode imortalizar as células, embora sem conferir fenótipo transformado. Pode causar vários tumores como o linfoma de Burkitt ou carcinoma nasofaríngeo. A quase totalidade da forma africana, endémica, do linfoma de Burkitt nas crianças contém o genoma do EBV e 100% dos doentes com esta neoplasia, apresentam títulos elevados de anticorpo anti-EBV enquanto que na forma esporádica do linfoma de Burkitt, o genoma viral aparece apenas em 15-20% dos tumores.


Em ambas as formas do tumor de Burkitt ( endémica ou africana e esporádica ) há translocações 8q-14q+ que resulta em activação c-myc. Todavia o EBV por si só não consegue desencadear um linfoma de Burkitt, necessitando de outros estímulos, de entre os quais a malária parece ser um co-factor de primordial importância na etiologia do linfoma de Burkitt, pois pode estimular o sistema imunitário e provocar proliferação de linfócitos B. Existem evidências de actividade viral crónica e associação da presença de EBV com linfoma de Hodgkin ( a infecção por EBV parece aumentar o risco de doença de Hodgkin em 2 a 4 vezes, e o desenvolvimento da doença de Hodgkin sempre é precedida de aumento dos níveis de anticorpos ao EBV ), linfoma de células T e alguns carcinomas gástricos, mas outros factores terão de estar presentes conjuntamente. De referir, no que ao linfoma de Hodgkin diz respeito, que é encontrado sempre, nas células de Reed-Sternberg e nas células malignas de Hodgkin, o virus de Epstein Barr.


Dos anticorpos contra antigéneos específicos de EBV, os que apresentam maior valor diagnóstico são os anti-VCA, com sensibilidade de 95-100% e especificidade de 86-100% nos episódios de mononucleose infecciosa aguda. A presença de IgM anti-VCA indica infecção aguda de EBV. Note-se no entanto que infecção aguda por outros herpes virus podem causar produção de IgM anti-VCA por células que apresentam infecções latente pelo EBV. Falsos positivos de IgM anti-VCA são também referidos em infecções recentes de toxoplasmose e adenovírus, bem como na presença de auto-anticorpos. IgM anti-VCA pode ser negativo nos casos de reactivação.
Falsos negativos podem ocorrer devido à natureza transitória do IgM que persiste apenas 4-8 semanas.



Os testes de anticorpos heterófilos ( monoteste, Paul-Bunnell-Davidsohn, Paul-Bunnell ) são geralmente suficientes, recorrendo-se a outros testes mais específicos ( anticorpos anti-VCA, anti-EA e anti-EBNA ) quando aquela abordagem resulta negativa num quadro clínico sugestivo. Em geral, 4 situações podem ser evidenciadas: susceptibilidade à infecção, infecção recente, infecção passada ou reactivação da infecção. Existem mais de 100 antigéneos envolvidos na resposta imune ao EBV, sendo 3 grupos os utilizados em laboratório: VCA, EA e EBNA, cada um com as classes IgG e IgM. A combinação de 4 marcadores ( IgG e IgM anti-VCA, IgM anti-EA e anti-EBNA total ) geralmente conseguem identificar todas as 4 situações referidas atrás.
A presença de anti-EA pode indicar uma situação de reactivação de infecção.
O EBV-DNA por PCR pode ser utilizado como marcador adicional de diagnóstico directo em indivíduos sem resposta imunológica típica para EBV, em imunodeprimidos ou como marcador de infectividade para fins académicos ou de epidemiologia. O EBV-DNA pode diferenciar infecções activas de infecções latentes. Também é usado o EBV-DNA nos processos que envolvem o SNC.



Na infecção aguda os anticorpos IgM e IgG podem ser detectados apenas 7 dias após o início da infecção, algumas vezes mesmo só após 10 dias de infecção. Por este motivo uma serologia negativa não afasta a hipótese de mononucleose infecciosa, tornando-se recomendável repetição de análise após 7 dias. A positividade isolada para anticorpos IgM, sem que haja seroconversão para IgG entre 2 amostras, pode indicar outra infecção que não a EBV, como a citomegalovirus ou toxoplasmose.
Os anticorpos IgM podem persistir até 4 meses e não guardam relação com a evolução clínica.
Importante referir que o método ELISA pode não ser uma boa técnica para a detecção de IgM anti-VCA, havendo mesmo uma correlação insignificante com o método de imunofluorescência, particularmente quando o doente não se encontra na fase inicial da infecção pelo EBV, altura essa em que o método ELISA poderia detectar esses anticorpos. Já a pesquiza de anti-EBNA1, com a utilização de peptídeos sintéticos, torna o método de ELISA um exame altamente sensível e específico. Uma das vantagens do método ELISA é a detecção de IgM anti-EBNA que aparece numa fase precoce da infecção, 3-6 dias após o início dos sintomas. Também o facto de os níveis de IgM anti-EBNA baixam à medida que os de IgG anti-EBNA começam a subir, podendo estabelecer-se uma relação entre essas 2 determinações, auxiliando no diagnóstico da infecção aguda. A relação inferior a 1.0 é sugestiva de uma infecção primária por EBV.



Dado o doseamento de IgM anti-VCA envolver dificuldades técnicas, tem vindo a ser utilizada a verificação da avidez dos anticorpos da classe IgG no diagnóstico de infecção aguda. Este tipo de avidez fundamenta-se no facto de que os anticorpos produzidos na fase aguda de qualquer infecção têm baixa avidez pelo seu antigéneo. Ao fim de 30 dias ou mais os anticorpos são de alta avidez, pelo que detecção de anticorpos de baixa avidez significam infecção aguda.

De referir que cerca de 10% dos casos de mononucleose infecciosa são negativos para anticorpos heterófilos.



EBV e esclerose múltipla

Epstein-Barr Virus Linked With MS

Estudos epidemiológicos e outros apontam para a existência de uma relação entre a infecção pelo EBV e o aparecimento da esclerose múltipla, uma vez que foi observado que 83% das crianças com esclerose múltipla tiveram uma infecção prévia com EBV, comparativamente com apenas 42% em controlos saudáveis ( sem esclerose múltipla ). Não foram observadas estas diferenças para virus como o herpes, parvovirus ou varicela.
Sinvastatina, um medicamento usado como redutor da concentração sérica de colesterol, mostra-se eficaz na redução das lesões cerebrais da esclerose múltipla, atingindo um valor de 44% essa redução, estando esta terapêutica ainda necessitada de mais estudos confirmatórios da sua eficácia.


EBV em doentes com SIDA


Não se verifica diferença na positividade de IgG anti-VCA nos doentes com SIDA em diferentes estadios de imunossupressão, revelando parecer não haver alteração na produção dos anticorpos nos doentes com grave imunossupressão. No entanto, isto provavelmente não corresponde ao que se passa, pois a questão põe-se ao nível da eficiência dos anticorpos produzidos. Nos doentes com SIDA há aumento da virémia de EBV, comprovada pelos dados encontrados nas células epiteliais da faringe e pelo aumento do número de doenças causadas pelo EBV. A persistência da virémia do EBV é, provavelmente, responsável pela manutenção da positividade do IgG anti-VCA em doentes com imunossupressão grave.

sexta-feira, janeiro 10, 2014

Magnésio

Magnésio



O magnésio, quarto catião mais abundante no organismo humano, é o catião extracelular mais abundante no corpo humano e o segundo mais abundante intracelularmente, logo após o potássio. O magnésio é essencial para a transferência, armazenamento e utilização da energia como regulador e catalizador de mais de 300 sistemas enzimáticos. As alterações da concentração do magnésio, e nomeadamente a hipomagnesémia, podem causar alterações metabólicas e clínicas. A hipomagnesémia pode advir do desiquilibrio entre a absorpção intestinal e a excreção renal, sendo que as arritmias cardíacas são as principais consequências da baixa sérica do magnésio com hipocaliémia secundária que pode ser fatal.


O magnésio é necessário para a função de muitos enzimas, como as que se relacionam com a transferência de grupos fosfato. É necessário também nas reacções que requerem ATP e na replicação e transcripção do DNA e tradução do mRNA.




Cerca de 99% do magnésio do organismo humano encontra-se intracelularmente sendo que deste, 60% se encontra nos ossos, 20% nos músculos e os restantes 20% noutros tecidos em quantidades menores.



O magnésio extracelular, que prefaz apenas 1% do total existente no organismo humano, apresenta-se em 60% na forma ionizada ( ou livre ), 10% liga-se a citrato, fosfato, oxalato e outros aniões e os restantes 30% ligam-se a proteínas. O magnésio é mantido no soro numa concentração de 1.7-2.2 mg/dl.
Na dieta normal são ingeridos cerca de 360 mg ( 15 mmol ) de magnésio sendo o requerimento diário de magnésio de 0.15-0.20 mmol/Kg. Alimentos ricos em magnésio incluem cereais, grãos, nozes, legumes, chocolates, vegetais verdes, carnes e marisco. Normalmente apenas 50% do magnésio dietético é absorvido no tracto gastrointestinal, principalmente jejuno proximal e íleo.
A absorpção do magnésio no íleo faz-se por 2 processos:
  • processo activo e saturável: é a via principal de absorpção do magnésio e realiza-se através de canais de magnésio TRPM6 ( transient receptor potential melastatin )
  • processo passivo e não saturável: realizado através de uma via paracelular, é muito menos importante
Dado que o magnésio participa na catalização de mais de 300 sistemas enzimáticos, a hipomagnesémia clinicamente se manifesta de muitas formas, sendo a principal manifestação clínica a arritmia cardíaca, que pode ser fatal.


Magnésio para melhorar a memória

A maioria do magnésio sérico ( cerca de 80% ) é filtrado no glomérulo, do qual 95% é reabsorvido no nefron, sendo que a absorpção tubular do magnésio ocorre, ao contrário do que sucede com os outros iões, no ramo largo da ansa de Henle. O túbulo proximal da ansa de Henle apenas tem uma contribuição reduzida ( 15-25% ) na absorpção, e os túbulos distais ainda absorvem uma quantidade inferior ( 5-10% ).


O magnésio é reabsorvido, como o cálcio, de forma passiva, no ramo largo da ansa de Henle pela via paracelular formada por uniões intercelulares estreitas, sendo que a força que impulsiona esta reabsorpção do magnésio é o gradiente eléctrico que se gera pela reabsorpção de sódio através do co-transportador Na+/K+/2Cl¯ ( NKCC2 ). A proteína constituinte destas uniões intercelulares estreitas é a paracelina 1, também chamada de claudina 16.
O magnésio é reabsorvido no túbulo distal, por um mecanismo activo que implica o canal de magnésio TRPM6.

A concentração de magnésio no plasma é o principal regulador da excreção de magnésio pelo rim. A hipermagnesémia inibe a reabsorpção, enquanto que a hipomagnesémia estimula a reabsorpção de magnésio pelo rim no ramo largo da ansa de Henle. A calcémia tem um efeito similar.

A hipermagnesémia, bem como a hipercalcémia, inibe a reabsorpção do magnésio pela activação do receptor-sensor de cálcio das células do ramo grosso da ansa de Henle e do túbulo distal.
Quando um daqueles elementos ( Mg2+ ou Ca2+ ) activam o receptor, estimula-se a formação dum derivado do ácido araquidónico que inibe, reversivelmente, os canais de potássio no ramo grosso da ansa de Henle. A secreção do potássio tem como funções, por um lado, prover potássio para a reabsorpção de sódio e cloro através do co-transportador NKCC2 e, por outro lado, intervem na produção do gradiente eléctrico necessário para a reabsorpção passiva do magnésio e cálcio. Desta maneira a inibição dos canais de potássio no ramo grosso da ansa de Henle reduz o transporte de sódio e a reabsorpção passiva do magnésio e do cálcio.
O volume dos fluidos extracelulares também tem acção sobre a excreção do magnésio, sendo que a expansão de volume inibe a reabsorpção do magnésio.
As alterações da taxa de filtração glomerular também têm capacidade de influenciar a excreção renal do magnésio, verificando que uma taxa de filtração glomerular diminuída leva a uma diminuída reabsorpção de magnésio.

A deplecção do fosfato diminui a reabsorpção do magnésio. A acidose metabólica crónica causa perda de magnésio pelo rim, enquanto que a alcalose metabólica causa reabsorpção de magnésio
ph ( metabólico ) reabsorpção Mg renal
ph ( metabólico ) reabsorpção Mg pelo rim

A paratormona, a 1,25(OH)2-vitamina D, calcitonina, glucagon, aldosterona, hormona antidiurética, insulina, PgE2 e catecolaminas aumentam a reabsorpção do magnésio no ramo grosso da ansa de Henle e túbulo distal talvez por aumento do cAMP intracelular.


Causas de hipomagnesémia

A hipomagnesémia pode aparecer por 4 mecanismos:
  • diminuição da ingestão de magnésio: causa rara já que o magnésio aparece em abundância na maioria dos alimentos, pode no entanto aparecer em doentes desnutridos, alcoólicos e a fazerem nutrição parentérica total prolongada
  • redistribuição: causa frequente de hipomagnesémia, é a passagem do magnésio extracelular para o meio intracelular; pode, entre outras situações, ocorrer devido a hipersinsulinemia durante o tratamento da cetoacidose diabética
  • perda gastrointestinal: alteração da absorpção do magnésio no intestino pode verificar-se como consequência de diarreia ou resseção cirurgica do intestino
  • perda renal: várias alterações tubulares hereditárias são causadoras de perda urinária de magnésio

Sintomatologia da hipomagnesémia

A sintomatologia da hipomagnesémia não aparece antes da concentração do magnésio sérico ser inferior a 1.2 mg/dl e aparece acompanhada de manifestações provocadas por hipocaliémia e/ou hipocalcémia. A sintomatologia inclui náuseas, vómitos, fraqueza muscular, cãimbras e mialgias, artralgias, fadiga e cansaço.
Frequentemente, hipocaliémia acompanha hipomagnesémia. De referir que a hipocaliémia secundária a hipomagnesémia, ou induzida por esta, é refratária ao tratamento de reposição de potássio, sendo tratada pela resolução da hipomagnesémia

Diagnóstico de hipomagnesémia

A forma mais simples e corrente de diagnosticar hipomagnesémia é a determinação da concentração sérica do magnésio. Há duas considerações importantes a fazer:
  • 30% do magnésio se liga à albumina, pelo que a hipoalbuminemia pode originar uma pseudohipomagnesémia
  • como a maior parte do magnésio no organismo é intracelular, uma pessoa pode ter uma magnesémia normal e apresentar deficiência de magnésio intracelular e sintomatologia de hipomagnesémia, a que se chama deficiência funcional de magnésio.
O magnésio ionizado livre do plasma é o fisiologicamente activo, e reflete bem as reservas intracelulares, mas não é doseado na prática laboratorial.

Hipermagnesémia é o estado em que a concentração sérica de magnésio é superior a 2,5 mEq/l, sendo as causas mais frequentes a insuficiência renal aguda ou crónica, administração de doses farmacológicas de magnésio em recém nascidos e uso excessivo de laxantes orais ou antiácidos.
A sintomatologia de hipermagnesémia é fraqueza muscular, hipotensão, paralisia flácida, depressão respiratória, perda de consciência e mesmo paragem cardíaca.

Hipomagnesémia não é sinónimo de deficiência de magnésio. Hipomagnesémia pode estar presente sem haver deficiência de magnésio e o contrário também é verdadeiro. No entanto, hipomagnesémia é geralmente indicador de déficit sistémico de magnésio.
Nistagmo, bem como atetose e outra sintomatologia, pode aparecer provocado por hipomagnesémia. Confusão, desorientação, alucinações, depressão, epilepsia, hipotensão, taquicardia e tetania podem aparecer devido à hipomagnesémia.

A hipomagnesémia pode ser provocada pela administração de antibióticos que bloqueiam a reabsorpção do magnésio na ansa de Henle, verificando-se que 30% dos doentes a fazerem antibioticoterapia apresentam hipomagnesémia.
A baixa de selénio, também é causa de hipomagnesémia, bem como a baixa exposição à luz solar. Diarreia é outra causa de hipomagnesémia.
O magnésio absorve-se principalmente no duodeno e intestino delgado, podendo em pequenas quantidades ser absorvido no cólon e recto.

A homeostasia do magnésio compreende 3 sistemas: rim, intestino delgado e osso. Na fase aguda da deficiência de magnésio produz-se aumento da absorpção intestinal e da reabsorpção renal. Persistindo a condição de deficiência de magnésio, o magnésio cai e é corrigido por mobilização do ião do osso. O nível do magnésio intracelular controla-se através do depósito no tecido ósseo.



O magnésio tem um efeito anti-trombótico indirecto sobre os trombócitos e as funções endoteliais ( onde incrementa a concentração de prostaciclina e diminui a de tromboxano A2 ) e o vasospasmo, pela sua função similar aos bloqueadores dos canais de cálcio.

A hipomagnesémia se relaciona com a deficiência de tiamina, já que o magnésio é um factor necessário para transformar a tiamina em pirofosfato de tiamina, que é a forma activa.

A maior parte do magnésio do organismo encontra-se ligado a quelantes como o ATP, ADP, proteínas e citrato. Apenas 5-10% do magnésio sérico se encontra livre, na sua forma ionizada, sendo este o essencial para a regulação do magnésio intracelular.


As causas mais frequentes de hipomagnesémia são:
  • alcoolismo
  • queimaduras extensas
  • diarreia crónica
  • poliúria
  • hipercalcémia
  • hiperaldosteronismo
  • síndrome de má absorpção, como doença celíaca ou DII
  • desnutrição
  • medicamentos: anfotericina, cisplatina, ciclospurina, diuréticos, antibióticos aminoglicosídeos
  • hipersudurese

A hipermagnesémia pode ser devida à saída de magnésio do interior das células por lise destas. Também mobilização acelerada de potássio para o interior das células pode levar ao surgimento de hipermagnesémia. É o que sucede nas situações de lise tumoral nos doentes a fazerem quimioterapia.
Outras causas de hipermagnesémia são excreção diminuída de potássio do corpo, insuficiência renal que é a causa mais comum de hipermagnesémia, uma vez que o magnésio está impedido de ser excretado. Também a ingestão exagerada de magnésio, em geral na forma de laxantes ou antiácidos, pode originar hipermagnesémia.



O magnésio reduz a transmissão neuromuscular e actua como depressor do sistema nervoso central. Com concentrações de magnésio de 3-5 mEq/l surgem náuseas. Sedação, hipoventilação com acidose respiratória, diminuição dos reflexos tendinosos profundos e fraqueza muscular aparecem com concentrações de magnésio da ordem dos 4-7 mEq/l. Hipotensão, bradicardia e vasodilatação difusa aparecem com 5-10 mEq/l de magnésio sérico. Paralisia respiratória surge com concentrações séricas de magnésio de 10-15 mEq/l.
O magnésio se reabsorve ao longo de todo o néfron. Em condições normais, 3% do magnésio filtrado é eliminado pela urina.

Dado que o processamento renal do magnésio se acha directamente associado ao sódio, os agentes que causam eliminação urinária de sódio também causam magnesiúria.

O magnésio participa na síntese proteica, via DNA. Está também envolvido na regulação da função mitocondrial, processos inflamatórios e imunitários, alergia, crescimento, stress, controlo de actividade neuronal, excitabilidade cardíaca, transmissão neuromuscular, tónus vasomotor e tensão arterial.




A movimentação do magnésio, tanto para o interior como para o exterior celular, é ligada a sistemas de transporte dependente de carbohidratos. A estimulação β-adrenérgica favorece o efluxo de magnésio, enquanto que a insulina, calcitriol e vitamina B6 favorecem a entrada do magnésio para o interior da célula.
A distribuição do magnésio é sensivelmente a seguinte:
  • 53% no compartimento ósseo
  • 27% no músculo
  • 19% nos tecidos moles
  • 0.5% nos eritrócitos
  • 0.3% no soro
O magnésio dos tecidos moles e eritrócitos é intracelular ligando-se a quelantes como o ATP, ADP, proteínas, RNA, DNA e citrato. A fracção ionizada do magnésio intracelular, que constitui cerca de 5-10% do total intracelular, é a fracção essencial para a homeostase intracelular. O magnésio sérico total correlaciona-se fracamente com as reservas do organismo devido à baixa fracção presente no plasma. Os sinais e sintomas das alterações na concentração sérica do magnésio são o resultado dos efeitos farmacológicos do aumento ou redução deste ião nos sistemas nervoso e cardiovascular.
O doseamento do magnésio total reflete pouco o conteúdo corpóreo total do ião. A deficiência de magnésio é definida como uma redução no conteúdo corpóreo total do magnésio, enquanto o hipomagnesémia é a redução na concentração sérica desta.


Deficiência de magnésio = baixa de magnésio no organismo
Hipomagnesémia = baixa concentração sérica


O magnésio é um modelador essencial da actividade eléctrica intracelular e transmembrana, visto ser um cofactor de numerosas enzimas em que o ATP intervém sendo gasto.
O diagnóstico laboratorial deve ser realizado e além de determinar a magnesémia deve ser doseada a eventual hipofosfatémia, magnesiúria e fracção excretada do magnésio.
Se a magnesiúria é inferior a 20 mg/dia ou a fracção excretada é inferior a 2%, interpreta-se como a causa de hipomagnesémia ser devida a redistribuição, diminuição de ingestão ou perdas gastrointestinais, descartando-se a perda renal.
Se a magnesiúria é superior a 20 mg/dia ou a fracção excretada de magnésio é superior a 2%, a hipomagnesémia é devida a perda renal. Recordar que a fracção excretada é obtida pela fórmula

razão entre magnesiúria e magnesémia ( U/P de Mg ) a dividir pela razão entre creatinúria e creatinemia ( U/P da creatinina )

Nesta equação o magnésio plasmático deve ser multiplicado por 0.7 pois que 30% se encontra ligado à albumina e portanto não é livremente filtrado.
Se a clínica faz suspeitar de hipomagnesémia mas o doseamento laboratorial mostra magnésio normal, deve fazer-se o teste de tolerância ao magnésio que, no caso de haver retensão, significa estarmos a falar de reservas corporais baixas.
O magnésio actua como um bloqueador fisiológico do cálcio, resultando em anormalidades de condução eléctrica, e por ser bloqueador fisiológico as situações de hipomagnesémia acompanham-se de hipercalcémia a que se pode associar calcificações vasculares arteriais.

A concentração do magnésio depende fundamentalmente de 3 órgãos: intestino que o absorve, osso que o armazena e rim que o excreta.
Dado a concentração intraeritrocitária do magnésio ser cerca de 3 vezes a sérica, a hemólise pode fazer subir a concentração do magnésio sérico.
O magnésio tem função estabilizadora da estrutura das cadeias de DNA e RNA. Intervem na formação de neurotransmissores e neuromodeladores, na repolarização dos neurónios, relaxamento muscular e cardíaco.
A afectação do trato gastrointestinal superior produz perdas muito superiores de magnésio ( até 15 vezes ) às produzidas pelas lesões ocorrendo no tracto gastrointestinal inferior.



A hipocaliémia que acompanha a hipomagnesémia explica-se pelos seguites passos:


hipomagnesémia magnésio intracelular ↓ actividade ATP → ↑ dilatação dos canais de potássio → ↑ secreção tubular de potássio


A resposta renal à hipomagnesémia é baixar a excreção de magnésio. Assim uma urina de 24 horas com mais de 10-30 mg de magnésio ou uma fracção de excreção de magnésio superior a 2% em doente com função renal normal equivale a perda de magnésio pelo rim. Se a fracção de excreção de magnésio for inferior a 2% então a perda é extrarrenal.


O magnésio é absorvido no jejuno e íleum principalmente, em cerca de 30-40% do magnésio da dieta. Quando a quantidade de magnésio na dieta é reduzida, a percentagem de magnésio absorvida sobe para 70-80%. A excreção renal de magnésio corresponde a cerca de 3% do magnésio filtrado no glomérulo renal, ou seja 97% do magnésio filtrado no rim é reabsorvido no túbulo renal.