sábado, fevereiro 22, 2014

Proteina Rho

Proteína Rho



Proteína Rho é uma proteína hexamérica, encontrada em eucariotas e procariotas, necessária para a terminação da transcripção de determinados genes. É uma proteína pertencente à família das helicasas.
Constitui um método de terminação da transcripção alternativo ao habitual ( as sequências de terminação palindrómicas nas quais o transcripto primário se torna anticomplementar e dissocia do RNA polimerase ). Em locais sem sinais de terminação, a transcripção detém-se mediante as proteínas Rho, que se unem a zonas de RNA desnudadas, denominadas sítios nut, hidrolizando o ATP com geração de energia utilizada para fechar a transcripção e expulsar o RNA



A proteína Rho está envolvida no controlo do ciclo celular, expressão de genes e organização da actina.


http://www.youtube.com/watch?v=WBcS3fKfbxs

Nos procariotas, o final da transcripção é um processo bem controlado, no qual sequências típicas de transcriptos de RNA ( sinais de término ) indicam o local para a finalização da síntese dessa molécula.


Término Rho

O término Rho dependente não possui adenilatos na fita de DNA molde, mas sim uma sequência curta que é transcripta, formando um grampo. A RNA polimerase, ao passar por esta zona faz uma pausa e, se a proteína Rho estiver presente, dissocia-se. A proteina Rho possui actividade RNA-DNA helicase dependente do ATP, rompendo o híbrido.



Os sinais activos para o fim da transcripção encontram-se no RNA recém-sintetizado e não no molde de DNA.
A proteína Rho é hexamérica e cada subunidade tem um domínio de ligação ao RNA e um domínio de hidrólise do ATP. O local de ligação para a proteína Rho é uma extensa ( cerca de 70 nucleotídeos, por vezes sendo 80-100 nucleotídeos ) região de cadeia única, rica em citosina e pobre em guanina, chamada de local de utilização da Rho ou rut ( Rho utilization site ) no RNA que está a ser sintetizado. O Rho liga-se ao RNA e usa a sua actividade ATPase para prover a energia para translocar ao longo de RNA até atingir a região helicoidal RNA-DNA, onde desfaz a hélice da estrutura dupla híbrida.
A RNA polimerase pára na sequência terminal, pausa esta devida a haver um local específico, afastada de 100 nucleotídeos do local de ligação da proteína Rho, chamado essa região de local de pausa Rho-sensível.
Assim o factor Rho, ou proteína Rho, actua como uma enzima desenroladora ATP-dependente, que se move ao longo do RNA em sintetização, em direcção ao extremo 3', e desenrolando-o a partir do DNA molde à medida que isso procede.
Nos eucariotas, a família das proteínas Rho GTPase é uma família de pequenas proteínas G ( 21 kDa ) de sinalização, constituindo uma subfamília da superfamília ras.
Os membros da família Rho GTPase regulam muitos aspectos da dinâmica intracelular da actina e encontram-se em todos os organismos eucariotas. As proteínas Rho representam um papel no desenvolvimento dos organelos, dinâmica do citoesqueleto, movimento celular e outras funções celulares. A família das proteínas Rho GTPase é formada, nos mamíferos, por 20 membros diferentes, distribuídos por 8 subfamílias ( Rho, Rnd, Rho D/F, Rho H, Rac, Cdc42, Rho U/V e Rho BTB ).
Cada proteína Rho afecta numerosas cascatas proteicas, cada uma das quais tendo papéis importantes em vários processos celulares.
Mais de 60 alvos foram descritos para as 3 mais comuns proteínas Rho GTPase.
As proteínas Rho ajudam as células animais a regular a sua forma. Uma óbvia alteração da morfologia celular controlada pelas proteínas Rho é a formação de lamellipodia e filipodia, um processo que leva à manutenção de certas células. Nas zonas sem sinalização de terminação, a transcripção pode deter-se em presença das proteínas Rho. Estas proteínas unem-se a zonas de RNA desnudo, chamadas rut e hidrolizam o ATP gerando energia que inicia o encerramento da bolha de transcripção e expulsa o RNA


A enterotoxina A do C.difficile exibe actividade citotóxica que induz uma desestruturação do citoesqueleto de actina, acompanhado por alterações morfológicas. A despolimerização, induzida pela toxina A, dos filamentos de actina correlaciona-se com o decréscimo da ADP-ribosilação das proteínas Rho GTPase de baixa massa molecular. A modificação da massa da proteína Rho induzida pela toxina A foi de 162 Da, o que indica haver uma incorporação de uma hexose na proteína Rho. Três membros da família Rho ( RhoA, Rac 1 e Cdc42Hs ) são substracto para a toxina A, enquanto que H-ras, Rab-5 e Arf1 não eram glicosilados.
Glicosilação das proteínas do subtipo Rho parece ser o mecanismo molecular pelo qual a toxina A do C.difficile medeia o seu efeito citotóxico nas células.

As células têm várias formas de responderem a uma lesão do seu material genético, podendo ir desde a reparação do dano até apoptose ou a célula entrar em senescência. Quando estes mecanismos falham, pode ocorrer cancro. A proteína Rho GTPase está directamente envolvida na regulação da senescência e do ciclo celular de células tumorais transformadas por ras induzidas por agentes stressantes. As proteínas RhoA, Cdc42Hs e Rac1 ( todas substracto para a toxina A do Clostridium difficille ) pertencem à família das proteínas sinalizadoras Rho GTPase que actuam como interruptores moleculares, estando activa quando ligado a GTP e inactiva quando ligada a GDP.

As toxinas A e B são os principais factores virulentos do C.difficile, sendo os agentes causais da colite pseudomembranosa associada a antibioticoterapia. Os resultados citotóxicos das toxinas, advêm da capacidade de induzirem a desagregação dos microfilamentos do citoesqueleto.
A toxina B actua na proteína RhoA GTPase, de baixa massa molecular. A toxina B cataliza a incorporação de até 1 mole de glicose por mole de proteína RhoA no aminoácido treonina, na posição 37. O UDP-glucose serve selectivamente de co-substracto para a reacção de monoglicosilação catalizada pela toxina B. A proteína RhoA glicosilada causa desagregação dos filamentos de actina, indicando uma actividade dominante negativa da RhoA glicosilada. A glicosilação da proteína Rho também leva à inibição da fosfolipase D.

Existem estudos demonstrando ausência de efeito enterotóxico in vivo por parte da toxina B. No entanto, a toxina B provoca, de forma dose-dependente, alterações electrofisiológicas e morfológicas na mucosa colónica humana, in vitro. A toxina B também estimula a síntese, de mediadores inflamatórios potentes, por monócitos e macrófagos.
Já os efeitos provocados pela toxina A são evidentes, caracterizando-se por intensa secreção de fluídos e grande acúmulo de células inflamatórias ( macrófagos, mastócitos, linfócitos e neutrófilos ) com libertação dos seus mediadores, nomeadamente prostaglandinas, leucotrienos, factor de agregação plaquetária, óxido nítrico e citocinas.
Foram identificadas cepas de C.difficile presentes em humanos, bem como em animais, não produtoras de toxinas e incapazes de causar diarreia. Até há alguns anos atrás, C.difficile era difícil de distinguir de outras bactérias, como C.sporogens. Com a introdução de um meio de cultura contendo ciclosserina e cefoxitina e frutose em agar esta distinção foi facilitada. Actualmente existem meios automáticos capazes de identificar a C.difficile.
Contraimunoelectroforese e aglutinação em latex são meios capazes de identificar as toxinas do C.difficile.



A resposta do hospedeiro ao C.difficile varia de portador assintomático até à colite pseudomembranosa, pensando-se que esta gama de respostas do hospedeiro ao organismo patogénico seja relacionada com modificações nos receptores das toxinas ou das defesas imunológicas.
Colite pseudomembranosa tem sido correlacionada, em 98-100 % dos casos, com C.difficile toxicogénica, enquanto que diarreia associada a antibioticoterapia se relaciona em 50-80% dos casos.

As toxinas de C.difficile, particularmente a toxina B, alteram a arquitectura celular e marginalização nuclear, mudanças estas geralmente irreversíveis e que inibem a divisão celular tendo, desta forma, actividade antiproliferativa. Para além destas alterações morfológicas, a toxina B causa perda de potássio e cálcio intracelulares e diminuição da síntese do RNA e DNA, com consequente diminuição da síntese proteica.
A toxina B não apresenta efeitos enterotóxicos, ou seja, não provoca secreção de fluídos, lesão morfológica nem infiltrado inflamatório na mucosa intestinal in vivo. A toxina A é cerca de 1000 vezes mais potente que a toxina B nos seus efeitos citotóxicos.
Ambas as toxinas são capazes de estimular macrófagos, in vitro, a libertar potentes mediadores inflamatórios como os leucotrienos e citoquinas.
Ambas as toxinas do C.difficile, toxina A e toxina B, são potentes estimuladores da libertação de α-TNF, IL-1 e IL-6 por monócitos humanos.
A toxina A é capaz de produzir intensa secreção de fluídos, aumento da permeabilidade intestinal e potente reacção inflamatória aguda na mucosa intestinal, caracterizada por necrose epitelial, edema hemorrágico, ulceração e activação de macrófagos e mastócitos com subsequente mobilização de neutrófilos para o foco inflamatório.
Os mecanismos envolvidos na resposta inflamatória da toxina A são complexos e envolvem a libertação de potentes mediadores inflamatórios, como a PgE2, leucotrienos B4 e C4, factor activador de plaquetas, IL-1, IL-8, histamina e óxido nítrico por células residentes da lâmina própria intestinal.
Também os mastócitos têm sido implicados nas acções biológicas da toxina A.

A capacidade que a C.difficile tem, de aderir à superfície das células, é primordial para dar início à primeira etapa de colonização do intestino, sendo que os níveis de adesão são mais altos em cepas mais virulentas.
Verificou-se que o C.difficile pode aderir em vários tipos celulares, essa adesão é dependente de factores ambientais e mediada por vários componentes proteicos.

O locus de patogenecidade do C.difficile é formado por 5 genes: tcdA, tcdB, tcdC, tcdD e tcdE.
As toxinas A e B são toxinas clostridiais de alto peso molecular, de cadeia única, com 3 domínios funcionais: domínio catalítico C-terminal, domínio de ligação N-terminal e domínio de translocação putativa. O nível de esporulação é inversamente proporcional ao nível de produção de toxinas.
As toxinas A e B causam o rompimento do citoesqueleto de actina e das tight juntions, resultando na diminuição da resistência transepitelial, acúmulo de fluídos e destruição do epitélio intestinal.
As toxinas A e B perturbam o citoesqueleto de actina das células epiteliais intestinais por meio de UDP-glucose dependente, sendo capazes de monoglicosilar a proteína Rho e ras que pertencem à família GTPase de baixo peso molecular. O efeito desta glicosilação relaciona-se com a transdução do sinal.
Além da produção das toxinas A e B, C.difficile pode produzir uma terceira toxina, toxina binária ( ADP-ribosiltransferase específica para actina ) codificada pelos genes tcdA e tcdB.
O locus tcdC do PaLoc ( locus de patogenecidade ) é o regulador negativo, e uma mutação nesse locus origina uma superexpressão de tcdA e tcdB, produção de toxina binária, maior esporulação em menor tempo, maior capacidade de adesão e resistência a novos antimicrobianos, principalmente quinolonas.

As proteínas Rho GTPase actuam na regulação de vários processos celulares essenciais, incluindo a transcripção génica, adesão celular, migração celular e progressão do ciclo celular.
É importante destacar o papel marcante das Rho GTPases nos processos celulares envolvidos com a organização do citoesqueleto, como sejam a regulação da polaridade celular, transcripção génica, progressão da fase G1 do ciclo celular, dinâmica dos microtúbulos, vias de transporte de vesículas e uma variedade de actividades enzimáticas. As proteínas Rho GTPase também podem alterar a expressão de genes codificantes de proteínas envolvidas na proteólise da matriz extracelular.
Dos membros da família Rho GTPase, a activação da proteína Cdc42Hs estimula a polimerização da actina para filopodia ( extensões finas e longas ) enquanto Rac induz a activação de polimerização da actina para formar lamelipodios ( projecções ). A subfamília Rho também regula a agregação dos filamentos de actina em fibras de stress e a formação de complexos de adesão focal.
As Rho GTPases agem como interruptores ( switches ) moleculares que alternam entre estado inactivo, ligado a GDP, e activo, ligado a GTP.


No estado inactivo, as Rho GTPases interactuam com as cascatas de activação específicas, para desempenharem suas funções celulares. Este processo é regulado pelos factores de troca de guanina ( GEF's - guanine exchange factor ) e proteínas activadoras de GTPases ( GAP's ). GEF's catalizam a conversão do estado ligado a GDP para um estado ligado a GTP e as GAP's aceleram a taxa intrínseca de hidrólise de GTP para GDP.
Também participam deste processo os inibidores de dissociação de GAP ( GAI's ) que regulam a activação das Rho GTPases por meio do processo de captura do ligante Rho em ambos os estados ligado a GTP ou a GDP, e permitem o transporte dessas substâncias entre o citosol e a membrana.



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Os probióticos podem oferecer uma terapêutica adjuvante promissora à terapêutica com vancomicina e metronadizol nas infecções por C.difficile uma vez que várias estirpes produzem proteases que degradam as toxinas da C.difficile ou aumentam a resposta imune às toxinas A e B.
Verificou-se que tratamento combinado com probióticos, aos antibióticos, normalmente usados para combate à C.difficile resulta numa resposta superior e redução significativa do risco de infecção por C.difficile.
Os probióticos usados são as bactérias produtoras de ácido láctico, nomeadamente L.caseii, L.bulgaricus e Streptococcus thermophilus, e apresentam-se muito eficazes.

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As proteínas p21, p27 e p57 são inbidores do ciclo celular, que bloqueiam a proliferação das stem cells em vários tipos de tecidos. Rho GTPase regula negativamente os níveis dos inibidores do ciclo celular p21cip1 e p27KIP1.

P21, p27 e p57 bloqueiam a proliferação das stem cells
Rho GTPase regula negativamente os inibidores p21 e p27
donde
Rho GTPase bloqueando p21 e p27 aumentam a proliferação das stem cells
O controlo do ciclo celular é feito na passagem da fase G1 para S

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As Rho GTPases, através de inúmeras outras proteínas alvo, participam de vias de sinalização com notável relevância na biologia do citoesqueleto e microtúbulos. Essas proteínas desempenham papel de destaque no cancro, pois contribuem para o ciclo celular, morfogénese e migração.
A proteína Rho é necessária para impedir a expressão da p21.
As Rho GTPases têm sido relatadas por contribuirem com a iniciação e progressão do cancro, incluindo um potencial ilimitado de proliferação, sobrevivência, apoptose, invasão dos tecidos e estabelecimento de metástases.
A proteína Rho é necessária, no final do ciclo celular, para a formação da actina e miosina, que separam as células filhas.
O membro da família Rho, Cdc42Hs, pode contribuir para a formação e progressão do tumor activando a proteína Rac.
O aumento de expressão de Rho A é relacionado com um aumento em sua actividade, contribuindo para um mau prognóstico e recorrências em alguns carcinomas, como o epidermóide do esófago. Estes dados sugerem que Rho A tem papel importante na progressão da malignização de vários tumores.
Rho B parece ter funções de supressor do tumor e encontra-se diminuída a sua expressão em carcinomas pouco diferenciados e altamente invasivo.
Radiações UV, citoquinas ou factores de crescimento induzem a expressão da Rho B, ao contrário do que sucede com Rho A e Rho C.
As proteínas Rho A GTPase estão envolvidas na organização da rede de microfilamentos, interacção célula-célula e transformação maligna.

A toxina A do C.difficile inactiva as Rho GTPase através da glicosilação de um resíduo treonina específico e impede interacções destas GTPases com moléculas efectoras. A toxina A da C.difficile promove alterações na forma das células e grande desorganização do citoesqueleto de actina.


As Rho GTPases contribuem para a iniciação e progressão do cancro incluindo a aquisição de potencial ilimitado de proliferação, sobrevivência e evasão de apoptose, invasão de tecidos e o estabelecimento de metástases.

sábado, fevereiro 08, 2014

Clostridium difficile

Clostridium difficile


No intestino vivem, simbioticamente, triliões de microrganismos que constituem a flora intestinal, a maioria dos quais são bactérias. Tratamento com antibióticos ou com quimioterapia é potencialmente perigoso, pois alguns dos microrganismos da microbiota intestinal podem provocar infecções graves, como é o caso do Clostridium difficile, uma vez que há destruição de outras bactérias e assim uma disbiose da flora intestinal. Estas infecções provocadas por estes microrganismos da flora intestinal normal, que geram patologia, podem ser muito graves. Como resultado destas bactérias, o doente desenvolverá diarreia que pode originar inflamação do cólon, ou enterocolite, podendo ocasionar até mesmo ruptura da parede e perfuração.


Doentes infectados com Clostridium difficile estão altamente recomendados para evitar contactos por forma a não transmitirem a doença.
Clostridium difficile é uma bactéria gram positivo, formadora de esporos, causadora de diarreia associada a antibioticoterapia que, sendo um componente minor da flora intestinal, sofre um supercrescimento quando o doente é submetido a terapêutica com antibióticos. Infecção por C.difficile é a causa mais frequente de colite pseudomembranosa que, em várias ocasiões, podem desencadear um megacólon tóxico, doença que pode fazer perigar a vida.


Infecção por C.difficile é um problema cada vez maior em estabelecimentos de saúde, sendo que se contabilizam em cerca de 14000 mortos por ano nos Estados Unidos.
C.difficile num intestino que sofreu um processo de destruição das outras bactérias que constituem a microbiota normal colónica, usualmente após antibioterapia, multiplica-se exponencialmente e dá origem a uma superinfecção por C.difficile. Estas bactérias libertam toxinas que podem provocar meteorismo, diarreia e dor abdominal que pode ser grave. Sintomatologia latente da infecção por C.difficile pode semelhar a sintomatologia gripal ou um síndrome do cólon irritável.
As toxinas A e B do C.difficile glicosilam a proteína Rho provocando a remodelação do citoesqueleto, ruptura das tight-juntions e desprendimento das células epiteliais da membrana basal. Adicionalmente, ambas as toxinas levam à libertação de citoquinas pró-inflamatórias, provocando intensa resposta imune com recrutamento de neutrófilos e monócitos.



Durante a progressão da infecção aguda por C.difficile no hospedeiro, esta bactéria inicia o ciclo esporulativo com libertação de esporos para o ambiente colónico, donde posteriormente sairão para o meio ambiente à volta.

Interessante o facto de que apesar da sua extrema resistência a factores externos, os esporos de C.difficile apenas germinam na presença de ácido cólico ou do derivado ácido taurocólico e certos amino-ácidos como l-glicina e l-histidina.
Família de sais biliares, como o ácido quenodesoxicólico, possui muito maior afinidade pelo receptor de germinação dos esporos de C.difficile comparativamente com os ácidos cólicos e derivados e, dessa forma, actuam como inibidores da germinação. De referir que os esporos que germinam no cólon são inibidos pela presença de oxigénio.

A antibioterapia, ao alterar a microbiota intestinal capaz de metabolizar os sais biliares primários, produz um incremento significativo nos níveis de ácido cólico ou derivados, que acoplado a uma diminuição da microflora intestinal competitiva permite que os esporos de C.difficile, presentes no epitélio colónico, germinem, proliferem, colonizem nichos vários e libertem toxinas, levando ao quadro clínico da infecção por C.difficile.


As cepas de C.difficile podem produzir ou não toxinas. As cepas toxigénicas possuem uma ilha genómica chamada locus de patogenecidade ( PaLoc ). A maioria destes locus de patogenicidade têm 5 genes, sendo que um deles codifica a enterotoxina A e outro a enterotoxina B. Estas toxinas penetram nas células epiteliais glicosilando a proteína Rho e causando a desagregação da actina, com alteração do citoesqueleto, bem como degradação das tight-juntions, por redistribuição da ocludina, com consequente alteração da arquitectura da barreira epitelial.
A toxina A adere à gp96 do epitélio colónico, sendo translocada ao citoplasma, provocando libertação de citoquinas pró-inflamatórias como leucotrienos, PgE2, α-TNF, e activa IL-1 e IL-6 pelos monócitos que incrementam a migração neutrófilica.
Ambas as toxinas, A e B, activam os nervos entéricos, provocando elevada produção de neuropéptideos, incluindo substância P ( SP ) e neurotensina ( será provavelmente a razão da acção de S. boulardii ) e produzem elevada secreção de cloreto nas células epiteliais intestinais com consequente secreção de fluidos e diarreia.
A cepa 027, hipervirulenta, possui uma delecção de 12-39 pares de bases no receptor de toxina C produzindo um aumento dos níveis da produção de toxinas na fase estacionária.
Nas etapas iniciais da colonização, C.difficile produz uma remodelação da superfície celular mediante a expressão de factores toxigénicos auxiliares de virulência, permitindo eficiente colonização das superfícies colónicas. O C.difficile está coberto por proteínas superficiais, algumas com maior relevância como a surface layer, que promovem a aderência ao epitélio intestinal e podem ajudar a evadir ao sistema imune.



A principal função da microflora gastrointestinal é impedir a colonização colónica por microrganismos patogénicos, por competição pelos nichos ecológicos e substractos metabólicos. O metabolismo microbiano também fornece importante fonte de energia para a parede intestinal, atingindo cerca de 50% das necessidades diárias, através da fermentação de carbohidratos e ácidos orgânicos.





Nem todos os probióticos possuem a capacidade de colonização e, neste caso, está o Saccharomyces boulardii que actua de forma ainda desconhecida mas que pode ser por interferência no sistema nervoso ou imune intestinais, favorecendo a produção de compostos inibidores como bacteriocinas ou seus metabolitos ( ácidos gordos de cadeia curta, ácido láctico, ácido acético, peróxido de hidrogénio, etc.), hormonas, neuropéptideos, citoquinas, etc. que influenciam na secreção de água e electrólitos através do epitélio intestinal.



O chá verde tem propriedades bifidogénicas, estimulando o crescimento das bifidobactérias, e tem também acção sobre os clostridia, diminuindo o seu crescimento.


A infecção por C.difficile causa sintomatologia que pode variar de diarreia ligeira até colite que pode ameaçar a própria vida do doente.
Nos adultos deve-se suspeitar desta situação quando o doente apresenta diarreia de fezes líquidas após exposição recente à antibioterapia, com dores abdominais, febre que pode ser alta, e um odor particular das fezes.
Exposição a medicação supressora da acidez é um outro facto importante no desencadear da infecção por C.difficile.
Os esporos do C.difficile são muito resistentes aos produtos de limpeza ( excepto a lixívia ) e permanecem viáveis por longos períodos de tempo.


C.difficile são bactérias móveis, ubiquitas na Natureza, que coram de gram positivo e mostram óptimo crescimento em agar-sangue, em meio anaeróbio. C.difficile é uma bactéria comensal presente no intestino de 2-5% da população adulta.
Múltiplas toxinas são produzidas por esta bactéria, nomeadamente enterotoxina e citotoxina, ambas causadoras de diarreia e inflamação intestinal.
Tratamento com antibióticos para C.difficile pode ser difícil, devido à resistência aos antibióticos e a factores fisiológicos dos próprios C.difficile ( formação de esporos, efeitos protectores da pseudomembrana ).

Os lactobacilus também têm importante acção no combate à C.difficile uma vez que sendo bactérias produtoras de ácido láctico, diminuem o pH do ambiente colónico, e assim tornam o meio ambiente desfavorável para a sobrevivência dos C.difficile.
A via de transmissão de pessoa para pessoa é a via fecal-oral. Os esporos são resistentes a materiais de limpeza alcoólicos e sobrevivem em muitos meios por muito tempo. Uma vez os esporos ingeridos, e devido à sua resistência aos ácidos, passam o estômago intactos, germinando e multiplicando-se no cólon, expostos aos ácidos biliares.

Os antibióticos mais associados a diarreia por C.difficile são os fluoroquinonas, cefalosporinas, carbapenemes e clindamicina. Antibióticos, principalmente os de largo espectro, destroem a flora normal intestinal facilitando um sobrecrescimento do C.difficile.
As infecções por C.difficile são predominantemente nosocomiais, embora infecções adquiridas na comunidade estejam em crescendo. Admite-se que doentes, internados por 2 semanas, sejam infectados numa taxa de 13%, que sobe para 50% com um internamento de 4 semanas ou mais.
As taxas crescentes de infecção na comunidade associam-se com a medicação que suprime a produção ácida gástrica ( antagonistas dos receptores H2 aumentam o risco em 1.5 vezes e inibidores da bomba de protões fazem subir o risco em 1.7 vezes ).



O diagnóstico de infecção por C.difficile usa vários métodos, nomeadamente:
  • Detecção directa das toxinas nas fezes
  • Imunoensaios para detecção do antigéneo pelo teste da glutamato desidrogenase, teste este com alta sensibilidade, mas que não diferencia estirpes toxigénicas de não toxigénicas
  • Ensaio de citotoxicidade: a toxina do C.difficile tem efeitos citopáticos em cultura celular e a neutralização de um qualquer efeito observado, com anti-soros, é o padrão ouro para os estudos que investigam o diagnóstico de diarreia aguda secundária a C.difficile.
  • Ensaio ELISA para toxina: ensaios para as toxinas A e B por ELISA apresentam sensibilidade ( 63-99 % ) e especificidade ( 93-100 % ) elevadas
  • Ensaios moleculares para os genes codificadores das toxinas
  • Colonoscopia para identificação da presença de pseudomembrana
  • Cultura em meio próprio

A combinação de vários destes métodos, permite o diagnóstico de certeza. Na caracterização do C.difficile são muito úteis estudos epidemiológicos feitos por PCR, sendo o método de referência a ribotipagem por PCR que estuda o RNA ribossómico.

São necessárias 3 amostras diferentes de fezes para excluir a doença, embora a repetição de colheita de amostra no mesmo episódio de diarreia seja de pouco valor. Tornou-se mandatório o despiste das toxinas A e B e não só uma destas toxinas.
Pesquiza de leucócitos nas fezes, bem como doseamento de lactoferrina fecal, têm pouco valor no diagnóstico. Técnica de PCR nas fezes para C.difficile dão resultados de 90% com falsos positivos da ordem dos 4%.



As pessoas que têm esta bactéria, naturalmente na flora intestinal, não podem espalhá-la a menos que esta comece a produzir toxinas. É por isto que muitas pessoas possuem o C.difficile no organismo e continuam assintomáticos.
O  C.difficile  produz,  pelo  menos,  2 tipos  de toxinas: toxina A ( enterotóxica e citotóxica ) e toxina B ( citotóxica ). A actividade enterotóxica induz a secreção aquosa intensa e o efeito citotóxico das toxinas A e B levam ao aumento da permeabilidade vascular, devido à destruição das ligações intercelulares e posteriormente hemorragia. As toxinas A e B também induzem à produção de α-TNF e outras interleucinas pró-inflamatórias associadas à formação da pseudomembrana.
C.difficile é uma bactéria naturalmente presente na flora intestinal de 3% dos adultos e 66% das crianças, sendo que 30% das diarreias provocadas pela administração de antibióticos são causadas pelo C.difficile. A incidência da doença em Portugal é de 2-16/100000 internamentos/ano, significativamente mais baixa que em países como o Canadá ou Estados Unidos. Outros estudos, no entanto, desmentem estes números, indicando incidência semelhante à mundial. O aumento da incidência correlaciona-se muito bem com o aumento da propensão de doentes internados a quem foram prescritos antibióticos. Verifica-se que o aumento do consumo de antibióticos carbapenemes está envolvido mais vezes nos casos de diarreia associada a C.difficile. Também, como já se referiu, os medicamentos inibidores da bomba de protões são responsabilizados muito significativamente nos casos de diarreia associada a C.difficile e mais do que nos casos em que não há a infecção por C.difficile. Os antibióticos comummente associados a diarreia por C.difficile ( penicilinas, cefalosporinas, clindamicina, e fluoroquinolonas ) têm sido ultrapassados pelos inibidores da bomba de protões e carbapenemes.


O aumento da incidência também pode ser devida à melhoria da qualidade dos métodos analíticos, com utilização de imunoensaio.
Como factores de risco da diarreia associada a C.difficile, para além do uso de antibióticos, podemos incluir a hospitalização, idade superior a 65 anos, imunossupressão, doentes com outras morbilidades, doentes oncológicos, doenças gastro-intestinais, gastrectomizados e doentes em alimentação entérica. Também, como já referimos atrás, os inibidores da bomba de protões é um factor de risco importante. Doença inflamatória intestinal é uma situação que aumenta o risco desta doença, sendo que devem ser aumentadas as doses habituais de probióticos administrados a estes doentes nas situações em que a antibioterapia é ministrada. Estes doentes têm um amplo leque de sintomatologia, indo desde diarreia aquosa até casos graves de colite pseudomembranosa, megacólon tóxico ou perfuração do cólon. Febre, arrepios, dor abdominal sobretudo no hipogastro, hipercreatininemia e leucocitose apresentam-se em cerca de 50% destes doentes. O quadro agrava-se, substancialmente, quando surge aumento do lactato sérico, falência renal, hipertensão, íleo paralítico ou mesmo choque, surgindo casos que podem ser fatais em 6-30% dos doentes.


Prevenção

A maneira mais eficaz de prevenir a diarreia aguda secundária a C.difficile é um uso absolutamente correcto dos antibióticos.

Probióticos, nomeadamente lactobacilos e S.boulardii, são úteis na prevenção de infecções e recorrência das mesmas provocadas por C.difficile.

Rigoroso controlo da infecção é requerido para minimizar os riscos de transmissão. Uso de luvas aquando do manuseamento dos doentes, lavagem com água e sabão das mãos ajuda a eliminar esporos da bactéria sendo, no entanto, melhor o uso de lixívia, e uso de toalhetes descartáveis, todas são técnicas importantes no controlo da infecção.

Desinfectantes hospitalares habituais, para além de ineficazes, são também promotores de formação de esporos e, dessa forma, ajudam ao disseminar da infecção.
Uso de sistemas de vapor de peróxido de hidrogénio é importante na esterilização do ar do quarto dos doentes e tem-se mostrado eficaz na redução do risco de infecção com taxas de redução da ordem dos 42-52% .

Vacinação anti-toxoide da C.difficile foi eficaz em estudo limitado.


As estirpes hipervirulentas possuem uma delecção de pares de bases do gene repressor tcdC, o que leva a aumento significativo, de 3 a 5 vezes, nos níveis de produção de toxinas durante a fase estacionária, factor este que contribui para a elevada virulência destas estirpes. A estirpe ribotipo 027 é uma das mais virulentas, mas outras existem como os ribotipos 001, 017, 053, 078 e 106. A estirpe ribotipo 027 produz 16-32 vezes mais toxinas que as restantes estirpes, e essa toxina é uma toxina binária. 
 


As recorrências da infecção por C.difficile são da ordem dos 20%, taxa esta que aumenta após cada recorrência, atingindo mesmo valores de 65% de recorrência.
O risco de recorrência sobe com a idade superior a 65 anos, antibioterapia para outra patologia que não infecção a C.difficile e com doenças graves subjacentes como insuficiência renal crónica, doença inflamatória intestinal ou hepatopatia crónica.



Foi verificado que a suspensão do antibiótico responsável pela infecção por C.difficile resolve a patologia em 23% dos casos, sendo também necessárias, noutras situações, outras medidas como terapêutica com metronidazol ou vancomicina, sendo que a vancomicina dá melhores resultados e é mais eficaz nas situações graves.Verifica-se um paralelismo entre o aumento das infecções por C.difficile e o uso dos inibidores da bomba de protões e isto compreende-se, pelo facto, dos inibidores da bomba de protões serem um factor de risco independente, dado que o mecanismo de acção destes agentes proporciona uma subida do pH gástrico, favorecendo dessa forma a sobrevivência do C.difficile e assim o surgimento da infecção por alteração da resposta leucocitária e aumento da produção de toxinas.

A tendência para um aumento de mortalidade e morbilidade parece dever-se, por um lado, a surgimento de estirpes mais virulentas como o ribotipo 027 e, por outro lado, à existência de co-morbilidades e idade mais avançada dos doentes. Um estudo verificou que o risco de infecção por C.difficile é cerca de 10 vezes maior em indivíduos com mais de 65 anos comparativamente com pessoas mais novas. O risco também aumenta após primeira infecção, sendo que a reinfecção pode apresentar um risco superior a 20% e aumenta com cada infecção subsequente.
Tem-se vindo também a verificar uma crescente incidência da infecção primária por C.difficile.
Em pessoas saudáveis, a microbiota normal colónica previne o sobrecrescimento do C.difficile por inibição competitiva para os nutrientes e esporos. Por os antibióticos destruirem a microflora simbiótica permitem que o C.difficile prolifere e colonize o intestino.


Patogénese da diarreia associada a C.difficile

O tratamento em doentes assintomáticos é controverso. Terapêutica de rehidratação oral é feito nos casos de desidratação associada à diarreia.
Metronidazol, vancomicina, fidaxomicina são antibióticos usados no tratamento do C.difficile.
Loperamide é usado no combate à diarreia, com a finalidade de a parar, mas nos casos de C.difficile não deve ser usada pois pode piorar a situação patológica. Colestiramina é eficaz no combate às toxinas A e B e ajuda no combate à desidratação.
Probióticos são de uso discutível, podendo em alguns casos ser vantajoso particularmente como medida preventiva, mas com a doença declarada já o seu uso é de duvidosa utilidade.
Transplante de material fecal, uma técnica que tem por objectivo repôr a microbiota intestinal em níveis normais, tem apresentado taxas de sucesso primárias ( tratamento inicial ) e secundárias ( repetição de tratamento ) da ordem dos 91% e 98% respectivamente. Pode, no entanto, raras vezes, associar-se a doenças imunes como PTI, neuropatia periférica, artrite reumatóide ou síndrome de Sjögren.
Cirúrgia, nomeadamente colectomia, pode ser necessária.



O prognóstico não é brilhante e, após o uso de metronidazol ou vancomicina, pode haver recorrência de infecção por C.difficile, após um primeiro tratamento, em 20% dos doentes, subindo esta taxa até aos 60% com subsequentes recorrências.

O C.difficile tem como factores de virulência o factor de adesão, que medeia a ligação às células humanas, a formação de esporos, a hialuronidase com actividade hidrolítica e as toxinas A ( citotoxina e enterotoxina ) e B ( citotoxina ).

As recorrências geralmente ocasionam-se 2-10 dias passados da suspensão dos antimicrobianos utilizados para o tratamento da infecção a C.difficile, mas podem ocorrer até 2 meses após aquela suspensão.
Os probióticos, úteis no controlo da infecção por C.difficile são S.boulardii e lactobacilus, sendo que os primeiros actuam a nível neuronal e os segundos por competição pelos nichos com o C.difficile, bem como pela competição pelos recursos nutricionais e pela produção de ácido láctico, com consequente diminuição do pH ambiental, tornando o meio ambiente desfavorável ao crescimento das bactérias patogénicas, nomeadamente o C.difficile. No entanto, uso de probióticos para reverter o quadro de infecção com C.difficile não ultrapassa os 30% de sucessos.