Risco
de cancro colorrectal em doentes com DII
Estudos
epidemiológicos do início do século XX apoiam a ideia de existir
um maior risco de cancro colorrectal nos doentes que sofrem de DII.
Esta associação entre cancro colorrectal e DII não parece ser
derivada de factores de risco que ambas as patologias partilhem, mas
sim ser efeito secundário à inflamação crónica e, bem assim,
outros factores promotores da transformação maligna da mucosa
colónica.
Na
tentativa de estabelecer uma correlação entre a DII e o cancro
colorrectal, múltiplos desafios metodológicos são colocados. São
estes, entre outros:
- Definição de início da DII: dado ser muito frequente haver muita dificuldade em estabelecer correctamente o início da DII, o que coloca bias sobre o aumento da duração da DII, isto aumenta a probabilidade de ocorrência de mutações somáticas causadoras de malignidade, podendo, desta forma, o risco de malignização que a DII aporta ser sobrevalorizado. A melhor definição do início de DII é a data de surgimento da primeira sintomatologia clínica e/ou laboratorial ( na falta de dados clínicos ), com subsequente confirmação histopatológica da DII
- Determinação da extensão da DII: verifica-se um risco maior quanto maior a extensão da doença, sendo máximo este risco na situação de pancolite
- Impacto no manuseamento da DII: situações patológicas ou fisiológicas do doente sofrendo de DII, como hereditariedade para cancro colorrectal, idade de início da DII, colangite esclerosante primária concomitante, grau de intensidade da inflamação ou extensão da DII, bem como a severidade da sintomatologia, influenciam no grau de risco de malignização colorrectal
- Incidência versus mortalidade: a incidência do cancro colorrectal pode ser usada como método de previsão de mortalidade, partindo-se do pressuposto de ser similar o prognóstico do cancro esporádico ou do secundário a DII, pressuposto este que não está provado até à data.
- Lead-time bias ( bias por diagnóstico precoce de DII ): monitorização apertada de doentes com DII pode levar a um diagnóstico precoce ( lead-time ) e haver um aumento de diagnósticos de cancros colorrectais que não apresentam ainda clínica. Lead-time e este aumento de número de diagnósticos de cancro colorrectais podem levar a análises de sobrevivência que comparam prognósticos entre cancro colorrectal secundário ou não a DII, dificultando a interpretação, sendo então que a colonoscopia deve ser realizada.
- População em geral versus população seleccionada: dadas as características clínicas da DII, que se faz manifestar de múltiplas e distintas formas, tanto clinicamente como em risco de cancro colorrectal, seria ideal um estudo baseado na população geral. Neste sentido, cuidadosa medição do manuseamento clínico e características populacionais podem atenuar o problema causado por este factor ( população geral vs população já seleccionada ), sendo que os resultados de um estudo podem não poder ser generalizados para uma população onde os doentes são manuseados de acordo com diferentes guide lines seguidas. Colectomia profilática complica ainda mais a generalização do risco estimado. Doente colectomizado deve ser excluído pois que o seu risco de malignização termina com a cirúrgia.
- Avaliação de risco obsoleto versus contemporâneo: dado que o manuseamento das alterações da DII se altera com o tempo e o decorrer da evolução natural desta doença, isto origina um dilema de avaliação do risco de malignização colorrectal. Follow-up é preciso por muitos anos dado, por um lado, o início precoce da DII e, por outro lado, o desenvolvimento cancerígeno demorar muitos anos a se realizar.
Colonoscopia
é, nos dias de hoje, o suporte do algoritmo para a monitorização
do cancro colorrectal nos doentes que padecem de DII.
Colonoscopia
tem a possibilidade de fazer o diagnóstico de cancros tanto já em fase
invasiva, e portanto avançada, como nos estadios pré-malignos e
permite a realização de biópsia para estudo histopatológico.
Meta-análise estima o risco absoluto de cancro colorrectal após
ressecção de displasia polipóide em doentes com colite de longa
duração.
Actualmente são
dados como adquiridos os seguintes factos:
- o risco relativo de cancro colorrectal em doentes com DII é de 30:1 comparativamente com a população em geral ( a terapêutica correcta da DII, nomeadamente com 5-ASA faz com que este aumento de risco seja muito inferior, quase nulo )
- foram feitos estudos que, de modo consistente, demonstram um risco aumentado nos doentes com DII mais extensa, sendo que esse risco é 10-15 vezes superior em doentes apresentando pancolite, 2-3 vezes maior em doentes com colite esquerda, verificando-se não haver um risco acrescido nos doentes com proctite isolada. Os doentes com doença de Crohn apresentam um acréscimo de risco confinado aos que apresentam envolvimento colónico.
- um risco aumentado pode ser consequência de uma incorrecta determinação de início de DII. O impacto deste bias torna-se mais evidente quando um grande risco existente no primeiro ano de afectação pela DII diminui durante um follow-up continuado. O risco de malignização parece aumentar quanto mais prolongado for o período de follow-up.
- sexo e idade de início da DII também foram correlacionados com um risco aumentado de malignização, havendo estudos que revelam um aumento de 60% do risco de cancro no sexo masculino comparativamente com o sexo feminino e um risco significativamente aumentado em doentes cuja DII se iniciou entre os 15-20 anos em comparação com idades mais tardias de início de doença.
- a severidade da inflamação da mucosa aumenta o risco de malignização .
- estudos revelam-se ainda inconclusivos e mesmo contraditórios no que concerne às tendências temporais, havendo estudos que demonstram que a incidência do cancro colorrectal diminui com o tempo de evolução enquanto outros estudos concluem precisamente o contrário.
- colangite esclerosante primária é uma complicação da DII e o risco de cancro colorrectal apresenta-se 5 vezes superior nos doentes que apresentam DII concomitantemente com colangite esclerosante primária comparativamente com os que apenas apresentam DII, especialmente nos casos de cancro do cólon ascendente. Esta associação não se verifica, até hoje, na doença de Crohn.
- está comprovada a acção do 5-ASA na prevenção da malignização. Também tiopurinas parecem mostrar um potencial de prevenção de malignização. Os tratamentos com medicamentos biológicos também mostram alta eficácia na diminuição da incidência de cancro colorrectal.
- história familiar de DII não revelou apresentar interferência no risco de cancro colorrectal em doentes com DII. Já uma história familiar de cancro colorrectal apresentou-se como um factor de risco deste tipo de cancro aumentando-o em doentes com DII.
A
DII é uma doença crónica que afecta cerca de 0.4% da população
ocidental e que se inicia geralmente em idades jovens
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