sábado, junho 18, 2016

Apolipoproteínas

Apolipoproteínas


As apolipoproteínas ( apo ) desempenham importantes funções no metabolismo lipoproteico, nomeadamente no transporte dos lípidos no meio aquoso plasmático, na ligação aos receptores de superfície com a finalidade de dirigir os lípidos para os órgãos e tecidos alvos, bem como na activação ou inibição das enzimas intervenientes no metabolismo lipídico.


A apo A-I representa cerca de 45% da massa molecular da partícula HDL, actuando como cofactor da LCAT, bem como mediador da transferência do colesterol das células para os HDL, processos estes relevantes no transporte reverso do colesterol.


A apo B é a principal proteína funcional no transporte do colesterol para as células periféricas, sendo que a apo B constitui cerca de 90% da fracção proteica do LDL.
A relação apo B/apo A-I dá o balanço entre partículas de colesterol potencialmente aterogénicas ( apo B ) e as partículas do colesterol anti-aterogénico ( apo A-I ).


O valor preditivo das apo A-I e apo B foi verificado, em alguns estudos, ser superior ao dado pelo doseamento dos lípidos e lipoproteínas, e a relação apo B/apo A-I mostrou, em alguns casos, o melhor valor preditivo para o risco de doença cardiovascular e doença aterosclerótica.



O doseamento plasmático das apo mostra vantagem sobre o das lipoproteínas por aquelas serem feitas de modo directo enquanto que, nomeadamente a LDL, é obtida por meio indirecto através da fórmula de Friedewald, sendo deste modo mais sujeita a erros. As concentrações plasmáticas das apo apresentam pouca influência de variáveis biológicas enquanto que as dos lípidos mostram flutuações das concentrações plasmáticas em resposta a diversos estímulos do controlo metabólico, pelo que variáveis pré-analíticas influenciam menos no doseamento das apo A-I e apo B, que não necessitam de jejum prévio para a correcta determinação.


Em doentes com níveis de LDL desejáveis, o doseamento da apo B mostra-se melhor marcador de risco cardiovascular do que a LDLc, para ambos os sexos.



A variável isolada mais fortemente associada a uma subida do risco de enfarte agudo do miocardio fatal, foi verificado ser a relação apo B/apo A-I, e este facto acentua-se quando o doente apresenta lipémia dentro dos valores desejáveis.
O índice colesterol total/HDLc subestima, de forma apreciável, o risco cardiovascular.


Estudo em mulheres mais velhas do que 45 anos concluiu que o doseamento do colesterol não-HDL e o índice colesterol total/HDLc apresentam eficácia sobreponível à observada pelo doseamento das apo B e apo A-I e a relação apo B/apo A-I na predição do risco cardiovascular. A apo B mostrou ser o melhor parâmetro isolado na previsão de eventos cardiovasculares futuros em mulheres.


Agentes hipolipemiantes, e particularmente estatinas, têm acção importante sobre o perfil apolipoproteico, alguns mostrando redução significativa dos níveis de apo B enquanto outros determinam aumento dos níveis de apo A-I e outros actuam sobre ambas as apos ( apo B e apo A-I ), pelo que o tratamento com estes agentes se apresenta potencialmente como factor de correcção do balanço anormal entre as lipoproteínas aterogénicas e anti-aterogénicas, balanço este intimamente associado ao risco cardiovascular.
Foram sugeridos os pontos de corte, para homens e mulheres, de respectivamente 0.9 e 0.8, sendo que valores inferiores a estes indicam um menor risco de doença cardiovascular.


Todas as lipoproteínas que contêm apo B apresentam-se estruturalmente como um núcleo ( core ) formado de triglicerídeos e ésteres de colesterol revestidos por uma monocamada superficial formada por fosfolípidos, colesterol não esterificado e apolipoproteínas.



Enquanto a VLDL apresenta as apo B100, C-I, C-II e E, já a LDL apresenta em mais de 90% a apo B100 sendo a LDL a responsável pelo transporte da maior parte do colesterol.



Via exógena de montagem das lipoproteínas

Nas quilomicra há predomínio de triglicerídeos sobre o colesterol no core da partícula. Os triglicerídeos são hidrolisados pela LPL no core das quilomicra, libertando ácidos gordos livres captados pelo tecido adiposo e músculos. Durante esta hidrólise o quilomicron diminui de tamanho, sendo transferidos alguns componentes superficiais para as HDL, e o restante constitui o remanescente do quilomicron, que adquirindo apo E proveniente da HDL é captada pelo hepatócito, sendo a partícula degradada e libertando o colesterol da dieta no fígado.


É esta a via exógena de montagem e catabolismo das lipoproteínas.


Via endógena de montagem das lipoproteínas

Na via endógena é a VLDL a interveniente que origina a LDL, passando pelo estado intermédio da IDL, e isto pela interacção da LPL sobre a VLDL no endotélio capilar, sendo o triglicerídeo hidrolisado e originando os ácidos gordos que se dirigirão, tal como na via exógena das quilomicra, para tecido adiposo ( armazenamento ) ou músculo ( energia ).
Conforme a IDL se transforma em LDL, a apo E se liberta, permanecendo unicamente a apo B100 na partícula. De salientar que cada partícula desta cascata, desde a VLDL até LDL passando pela IDL, apenas contém uma apo-B100.
Na hidrólise das quilomicra, bem como da VLDL, a apo C-II permite esta hidrólise dos triglicerídeos pela LPL enquanto a apo E acelera a captação pelo fígado dos remanescentes.


De referir que os quilomicra contêm a forma apo B-48 enquanto que as VLDL apresentam a forma completa apo B-100. Os remanescentes das quilomicra são degradadas após terem sido absorvidas pelo hepatócito, ao contrário dos remanescentes da VLDL que tendem a ser processados a nível dos sinusóides hepáticos para se transformarem em LDL.

Lipoproteína (a ) ou Lp(a) é uma classe de partículas de lipoproteínas de síntese hepática possuindo composição lipídica semelhante à LDL. A LDL distingue-se da Lp(a) pela presença da lipoproteína [ apo(a)], proteína estruturalmente homóloga à do plasminogéneo. Níveis altos da apo(a) têm acção aterogénica e pro-trombótica. Os níveis plasmáticos do Lp(a) são praticamente determinados na totalidade pela variação genética do Lp(a).

As principais apos da HDL são a apo A-I e apo A-II formadas no fígado e intestino delgado.


A maioria das apos e fosfolípidos que originam a HDL nascente são secretados inicialmente na superfície das quilomicra e VLDL. Depois da LPL hidrolisar o triglicerídeo em quilomicra e VLDL, o conteúdo lipidíco do núcleo torna-se menor, ocorrendo redundâncias de colesterol não éster e fosfolípido na camada superficial, sendo estes componentes redundantes de superfície transferidos para HDL. As HDL-nascentes também captam o excesso de colesterol não éster e fosfolípidos dos tecidos periféricos. Este colesterol de HDL é esterificado pela LCAT, que é activada pela apo A-I na superfície da HDL esterificando o colesterol livre, fazendo com que entre para o core. A partícula de HDL-nascente se transforma em HDLз, maior e mais flutuante, que progride para HDL2, ainda maior. A apo A-II pode ser adicionada a HDL2 destinada ao transporte de colesterol éster para o fígado por meio da proteína transferidora do colesterol éster ( CETP ). A lipase hepática da superfície do fígado hidrolisa o fosfolípido e o triglicerídeo da HDL2 diminuindo o tamanho desta e que vai originar a HDL, ainda menor.



A lipase hepática liga-se ao endotélio dos sinusóides hepáticos e actua nas lipoproteínas. Hidrolisa os fosfolípidos e triglicerídeos da LDL e HDL originando as LDL pequenas e densas e, por outro lado, converte HDL2 em HDLз.
Raramente aterosclerose estabelecida não cursa com anormalidades lipoproteicas ou lipídicas detectáveis. A quantificação da apo B e Lp(a) revela muitas vezes a presença de alterações lipoproteicas mínimas, como por exemplo LDL pequena e densa.
Verificou-se existir uma associação entre HDLc e a prevalência e gravidade da doença coronária.
Estudo efectuado no Brasil demonstrou que concentrações séricas mais elevadas de triglicerídeos e/ou VLDLc e mais baixos da HDLc e/ou apo A estão em paralelo com maior gravidade de doença coronária.


O LDL oxidado difere do LDL nativo dado as proteínas e lípidos que a constituem encontrarem-se modificadas por espécies reactivas de oxigénio ( anião superóxido, radicais hidroxilo e peróxidos ) que os macrófagos, entre outras células, produzem.


A LDL oxidada contribui em maior grau para o desenvolvimento de lesões ateroscleróticas do que o LDL nativo, dado que pela presença do factor quimiotático nos LDL oxidados pode haver up take de LDL oxidado pelos monócitos da circulação. Este factor quimiotático não se encontra no LDL nativo. A mobilidade dos macrófagos, bem como a sua capacidade de saírem da íntima, são reduzidas pelo factor quimiotático dos LDL oxidados, levando à produção de células esponjosas. Episódios trombóticos podem ser originados pela citotoxicidade dos LDL oxidados que levam à perda da integridade do endotélio.


As apolipoproteínas são as responsáveis pela estabilização da estrutura lipoproteica, desempenhando funções várias no metabolismo dos lípidos como reguladores da actividade enzimática da lipase hepática, LPL e LCAT ou agindo como sinal mediador de endocitose.
O risco de aterosclerose liga-se mais fortemente ao número de partículas aterogénicas circulantes que entram em contacto e entram na parede da artéria comparativamente com a quantidade de colesterol existente nas lipoproteínas.
Os níveis plasmáticos das apo dão melhor informação sobre o risco de doença cardiovascular do que as lipoproteínas, pois as concentrações plasmáticas das apo são determinadas geneticamente, e assim sofrem pequena variação pelas variáveis biológicas, enquanto que as flutuações plasmáticas dos lípidos são mais influenciáveis por estas variáveis biológicas.

A apo A-II, uma das apo mais abundantes no HDL, é exclusivamente sintetizada no fígado sob a forma de preproapo A-II que é clivada em proapo A-II que posteriormente origina a apo A-II presente, sob a forma dimérica, no plasma. A apo A-II tem a capacidade de inibir LCAT ( prejudicial ), inibir a actividade da CTEP ( benéfico ) e inibir a captação do colesterol pelo fígado ( prejudicial ).
A apo A-II tem a capacidade de inibir o efluxo do colesterol celular no metabolismo do HDL e consequentemente aumentar o risco de aterosclerose.


Apo A-II tem uma acção pro-inflamatória por estimular a formação de hidroperóxidos lipídicos nas células da parede arterial e induzir a transmigração monocitária, não se observando que a apo A-II proteja a oxidação.
Apo A-IV participa no transporte reverso do colesterol tendo desta forma acção anti-aterosclerótica activando LCAT, incrementa a actividade da CETP e liga e capta os HDL pelos hepatócitos.
Apo A-V tem uma relação inversa com a trigliceridemia podendo reduzir a concentração plasmática dos triglicerídeos.
Valores altos da razão apo B/apo A-I encontram-se frequentemente em indivíduos obesos.



A apo(a), estruturalmente homóloga ao plasminogéneo, é um inibidor fisiológico deste e por isto pode originar um estado de pré-coagulação, sendo assim a apo(a) considerada aterogénica e factor de risco de doença coronária. A apo(a) apresenta-se em várias isoformas sendo de maior risco de doença cardiovascular as isoformas mais pequenas.

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