sábado, setembro 09, 2023

Clostridium difficile e bacteriofago Cd27

 

Clostridium difficile e bacteriofago Cd27


O bacteriófago Cd27 é um tipo de vírus que infecta bactérias específicas. Pertence à família Myoviridae ( bacteriófagos com cauda longa e contráctil ) que se caracteriza por possuir uma cauda longa e cabeça icosaédrica.

Este fago tem sido estudado principalmente pela sua capacidade de infectar cepas de bactéria Clostridium difficile, que é uma das principais causas de infecções intestinais nos humanos. Verificou-se que o fago Cd27 tem a capacidade de destruir o Clostridium difficile ao injectar o seu material genético nas bactéria e replicar-se no seu interior.

A capacidade do fago Cd27 para infectar e destruir bactérias pode ter aplicações terapêuticas no tratamento das infecções causadas pelo Clostridium difficile. Ao se usar este fago como agente antimicrobiano, se consegue evitar os efeitos secundários associados ao uso dos antibióticos convencionais, como a resistência bacteriana e a disrupção da microbiota intestinal.

São, no entanto, necessários mais estudos e investigação para compreender completamente as propriedades e o potencial terapêutico do bacteriófago Cd27.


O bacteriófago Cd27 apresenta uma estrutura característica de fago, nomeadamente uma cabeça icosaédrica e uma cauda, longa. Aqui estão mais detalhes sobre a sua estrutura:

  1. Cabeça: a cabeça do fago Cd27 é icosaédrica, o que significa que tem uma forma semelhante a uma poliedro com 20 faces triangulares. A cabeça contém, no seu interior, o material genético do fago, que é o DNA de fita dupla

  2. Cauda: a cauda do Cd27 é longa e composta por uma estrutura tubular. Ela é responsável por se ligar à superfície da bactéria hospedeira e injectar o material genético do fago em seu interior. A cauda também pode conter fibras proteicas de ligação que se conectam aos receptores específicos na parede celular bacteriana.

  3. Placa basal: a cauda do fago Cd27 possui uma placa basal na sua extremidade oposta à cabeça. A placa basal é responsável por ancorar a cauda do fago à bactéria de forma irreversível

  4. Fibras da cauda: alguns bacteriófagos, incluindo o Cd27, possuem fibras da cauda que se estendem a partir da placa basal. Estas fibras podem desempenhar um papel na ligação específica à bactéria hospedeira, sendo implicadas na primeira fase da adsorpção, fase reversível, reconhecendo e se ligando a receptores na parede celular.


É importante ressaltar que a estrutura exacta do fago Cd27 pode variar em detalhes específicos, pois as características estruturais podem ser influenciadas por factores como mutações genéticas e adaptação a diferentes cepas bacterianas hospedeiras.



O fago Cd27 apresenta algumas características específicas, incluindo:

  1. Estrutura: o Cd27 pertence à família Myoviridae, que é caracterizada por ter uma cauda longa e uma cabeça icosaédrica. A cauda é responsável por se ligar à superfície da bactéria hospedeira e injectar seu material genético

  2. Hospedeiros: o Cd27 é conhecido por infectar cepas específicas da bactéria Clostridium difficile, que é um dos principais agentes bacterianos causadores de infecções intestinais em humanos e potencialmente ameaçadora da vida

  3. Ciclo de vida: assim como outros fagos, o Cd27 segue um ciclo de vida lítico. Isto significa que, após infectar uma bactéria hospedeira, ele se replica dentro dela, causando sua destruição e a libertação de novos vírus capazes de infectarem outras bactérias iguais

  4. Potencial terapêutico: devido ao seu potencial de infectar e destruir bactérias Clostridium difficile, o fago Cd27 tem sido estudado como uma possível terapêutica alternativa aos antibióticos convencionais no tratamento de infecções causadas por essa bactéria. A utilização de fagos como agentes antimicrobianos pode ajudar a evitar os problemas associados aos antibióticos, como a resistência bacteriana e a disbiose

  5. Pesquisas em andamento: embora o fago Cd27 tenha apresentado potencial terapêutico, ainda são necessárias mais investigações para entender completamente suas características e aplicabilidade clínica. Estudos adicionais estão sendo realizados, por diversos grupos de investigação, para avaliar a sua eficácia, segurança e possíveis efeitos colaterais antes que possa ser utilizado como tratamento.


Embora o uso do fago Cd27 no combate ao Clostridium difficile possa apresentar algumas vantagens comparativamente à antibioterapia, também existem desvantagens. Algumas das principais desvantagens incluem:

  1. Especificidade: os fagos são altamente específicos para determinadas cepas cepas bacterianas. Isso significa que o Cd27 pode não ser eficaz contra todas as cepas de Clostridium difficile. Enquanto alguns antibióticos podem ser eficazes contra várias cepas de uma determinada bactéria, os fagos geralmente têm um espectro de acção mais restrito.

  2. Resistência bacteriana: embora a resistência bacteriana seja um grande problema associado ao uso dos antibióticos, e o uso da fagoterapia tenha por grande vantagem a fraca existência de resistência bacteriana ao fago específico, os bacteriófagos também podem levar ao desenvolvimento de resistência bacteriana. As bactérias podem sofrer mutações que as tornam resistentes aos fagos reduzindo assim a eficácia do tratamento.

  3. Dificuldade de produção e armazenamento: a produção em larga escala de fagos pode ser desafiadora, especialmente em comparação com a produção de antibióticos. Além disso, os bacteriófagos têm uma vida útil limitada e requerem condições específicas de armazenamento para manter a eficácia

  4. Falta de estudos clínicos: embora haja pesquizas promissoras sobre o uso de fagos no tratamento de infecções por Clostridium difficile, ainda há uma falta de estudos clínicos bem controlados e de longo prazo. É necessária mais pesquiza para determinar a eficácia e a segurança do uso do Cd27 em comparação com a antibioterapia

  5. Efeitos colaterais desconhecidos: como os fagos são organismos vivos, ainda não se sabe completamente quais podem ser os efeitos colaterais do seu uso em humanos. É importante realizar estudos adicionais para avaliar a segurança do Cd27 e identificar possíveis efeitos adversos.

Em resumo, embora o bacteriófago Cd27 possa ter vantagens potenciais no combate ao Clostridium difficile, também existem desvantagens a serem consideradas. A antibioterapia ainda é amplamente utilizada no tratamento de infecções por Clostridium difficile devido à sua eficácia comprovada e ao conhecimento sobre seus efeitos colaterais.


O ciclo de vida do fago Cd27 segue o ciclo lítico típico dos bacteriófagos, composto pelas fases Adsorpção, Injecção do DNA, Replicação, Montagem e Lise com libertação. Após a libertação, as novas partículas virais do bacteriófago Cd27 são capazes de infectar outras bactérias hospedeiras de Clostridium difficile e repetir o ciclo lítico. Esse ciclo de infecção e lise bacteriana pode continuar até que todas as bactérias hospedeiras adequadas sejam infectadas ou até que o ambiente não seja mais favorável para a replicação do bacteriófago.

domingo, junho 04, 2023

Fagoterapia e resistência bacteriana aos fagos

 

Fagoterapia e resistência bacteriana aos fagos


Diversos são os mecanismos utilizados pelas bactérias na tentativa de resistirem à acção lisante dos fagos.


Entre os mecanismos utlizados pelas bactérias para a resistência aos fagos estão:

  1. Inibição da adsorção: as bactérias podem adquirir genes capazes de codificar proteínas promotoras de alterações da estrutura e/ou informação tridimensional dos receptores de superfície que o fago utiliza no processo de adsorção. As bactérias também podem sintetizar polímeros estruturais que vão formar uma barreira externa e dessa forma tornam inacessível ao contacto os receptores pelos fagos que assim não conseguem proceder à adsorção. Os fagos, por seu turno, podem sofrer mutações capazes de contornar estas situações através do reconhecimento e degradação destes polímeros. As bactérias, na tentativa de impedir a adsorção por parte dos fagos, podem ainda sintetizar moléculas inibidoras competitivas por serem capazes de se ligarem aos receptores fágicos que assim ficam indisponíveis para os fagos.

  2. Inibição da entrada do DNA do fago no interior da bactéria: alguns profagos são capazes de codificar o sistema Sie, que não é mais que um conjunto de proteínas ancoradas à membrana ou associadas a componentes da membrana com a função de impedirem a penetração do DNA do fago na bactéria. Há vários sistemas Sie identificados, como por exemplo o sistema Sie do fago T4 codificados pelos genes imm e sp, que sendo sistemas Sie diferentes actuam sinergicamente na obstrução de transferência de DNA viral para a bactéria. Imm actua promovendo a alteração da conformação do local de entrada do DNA do fago enquanto que o gene sp é responsável pela codificação duma proteína de membrana inibidora da lisozima T4 que se encontra na extremidade da cauda do fago e que desta forma impede a degradação de peptideoglicano bacteriano.

  3. Clivagem dos ácidos nucleicos do fago: esta clivagem pode ser efectuada por diversas formas, sendo que vários sistemas estão envolvidos, nomeadamente:

- sistemas de restrição-modificação ( R-M ): as bactérias, numa tentativa de protecção de genomas desconhecidos, possuem vários sistemas R-M. A presença de DNA viral não metilado, pode estimular 2 reacções distintas: se as enzimas de restrição estiveram presentes em maior quantidade do que as enzimas de metilação, estas catalizam a clivagem de genoma do fago e o ciclo de vida do fago termina; no caso das enzimas de metilação superarem as de restrição, o DNA do fago é metilado e a clivagem não se processa, possibilitando a continuação do ciclo de vida e assim a infecção das bactérias pelos fagos.

A eficiência do sistema R-M e a quantidade de locais de reconhecimento da endonuclease presentes no DNA são directamente proporcionais, pelo que é possível aos fagos ultrapassarem este facto através da ausência de locais de reconhecimento no genoma viral.

Os fagos T7 e T3, quando injectam o genoma no interior da célula infectada, expressam uma proteína capaz de interagir e causar inibição de enzimas do sistema R-M o que leva ao não desempenho da sua função.

Outra possibilidade existente é a capacidade da bactéria em adquirir um gene codificador da síntese de uma metilase que mimetiza a metilase bacteriana ( estão neste caso Streptococcus spp e E. coli ). Desta forma, as bactérias desenvolvem sistemas dependentes da modificação ( MDSs ) que degradam o DNA do fago seja metilado ou hidroximetilado. Mesmo estas defesas bacterianas podem ser ultrapassadas por vírus.

- sistemas CRISPR-Cas: o locus CRISPR encontra-se em 40-70% de bactérias, a que se associa os genes de Cas que na sua terminação apresenta uma zona promotora da transcrição. Algumas bactérias, no seu contacto inicial com um fago, adquirem uma sequência do ácido nucleico do fago e integram-na no genoma bacteriano. Com esta informação genética viral mantida no loci CRISPR-Cas a bactéria adquire defesas contra o fago que são desencadeadas em contactos futuros, funcionando como que um sistema imunológico adquirido da bactéria. Este mecanismo de defesa bacteriano é facilmente ultrapassado pelo fago através duma mutação ou deleção de algum nucleotídeo seu.

- sistema de infecção abortiva ( Abi ): estes sistemas actuam na replicação, transcrição, tradução ou empacotamento do DNA do fago. Este sistema apresenta-se maioritariamente nos lactococcus mas também podem surgir em bactérias gram negativo como E.coli, Vibrio cholerae e Shigella dysenteriae.

- sistema toxina-antitoxina ( TA ): este sistema, presente em muitas bactérias, consiste da associação de um gene codificador de uma toxina e um gene que antagoniza o efeito da toxina. Estes sistemas toxina-antitoxina actuam nos mecanismos de morte programada, resposta ao stress e fazem parte do sistema de infecção abortiva sendo activadas em resposta à infecção viral.



Imunogenecidade


O sistema imunitário inato, em sinergia com a acção dos anticorpos, é o responsável pela eliminação rápida dos fagos séricos, o que acarreta uma diminuição da eficácia da fagoterapia.

A resposta imunitária é variável e influenciada por factores como o tamanho, número e características físico-químicas dos epítopes virais. Dada a resposta imunitária ser dose-dependente, para ser retardado o clearance dos fagos circulantes, a administração das doses deve ser reduzida.

Apesar da produção dos anticorpos não se processar de modo imediato, estes podem ser detectados no soro ainda antes da fagoterapia se ter iniciado, podendo isto relacionar-se com a ampla distribuição dos fagos no ambiente, o que torna altamente provável haver um contacto prévio.

Para uma segurança superior na fagoterapia, na presença de anticorpos séricos deve ser feita a administração de uma dose superior capaz de compensar a fracção que será neutralizada ou usar-se um diferente fago com um espectro de acção semelhante.

quarta-feira, maio 31, 2023

Bacteriófagos – ciclos de vida

 

Bacteriófagos – ciclos de vida


Os virus, e assim os fagos, não possuem sistemas capazes de gerar ATP nem sistemas necessários para a síntese dos próprios constituintes ( ácidos nucleicos e proteínas ), pelo que precisam de encontrar células que sirvam de hospedeiros e lhes proporcionem tais sistemas.

O ciclo de vida dos fagos apresenta várias etapas, sendo a primeira a adsorção, seguida da penetração do ácido nucleico viral no citoplasma bacteriano.

Na adsorção há interacção de proteínas virais com receptores de superfície presentes nas células hospedeiras. Quase a totalidade dos componentes da parede celular das bactérias infectadas servem de receptores, incluindo os flagelos, o pili, a cápsula, o LPS e proteínas de superfície que são potenciais receptores para os fagos. Esta grande variabilidade de receptores para os fagos, faz com que uma mesma bactéria possa ser infectada por uma variedade de fagos diferentes. Também se verifica que existem receptores alternativos para o mesmo fago na superfície da bactéria.

A adsorção apresenta 2 fases, sendo a primeira etapa a fase em que se faz a ligação reversível entre o fago e a bactéria e a segunda fase aquela em que a ligação é irreversível, sendo mediadas pelas fibras da cauda, a primeira etapa ou fase reversível, e da placa basal quando a ligação é irreversível, altura em que se processa uma alteração da conformação do fago e que assim permite a libertação do genoma viral.

Os fagos com cauda contrátil ( Mioviridae ) penetram a parede celular e injectam o genoma do fago no citoplasma bacteriano. Neste processo de penetração de genoma viral, estão envolvidos diferentes factores como o gradiente electroquímico, ATP e a lise enzimática da parede celular que é catalisada por enzimas que fazem a hidrolase do peptideoglicano viral.

O ácido nucleico do fago é, na maioria das vezes, injectado em conjunto com proteínas específicas, sendo que a transcrição e tradução da primeira parte do genoma viral é um requisito fundamental para a entrada do restante ácido nucleico do fago.


Após a infecção, o ciclo de vida do fago pode seguir 2 vias diferentes: ciclo lítico ou ciclo lisogénico.

Se o fago for virulento, o ciclo de vida seguirá obrigatoriamente a via lítica que leva à lise celular hospedeira com libertação de novos fagos recém formados. No caso do fago ser temperado, e por estarem presentes genes reguladores dos 2 tipos de ciclos, o ciclo que se segue é o lisogénico.

A escolha do tipo de ciclo de vida do fago é influenciada pelo ambiente e parâmetros fisiológicos como o estado de nutrição, metabólico e dimensão da célula infectada como a proporção dos fagos relativamente ao número de bactérias susceptíveis presentes.

O ciclo lítico é a via preferida quando o crescimento e metabolismo das células hospedeiras apresentam as condições adequadas à perpetuação dos vírus. Já o ciclo lisogénico é uma forma de sobrevivência na presença de condições adversas.

No ciclo lítico a transcrição viral inicia-se imediatamente após a penetração do genoma viral, sendo necessária a RNA polimerase da bactéria previamente modificada para poder reconhecer os promotores do ácido nucleico do fago.

No ciclo lítico, os primeiros genes que são expressos, codificam a síntese proteica reguladora que está envolvida nas alterações da célula hospedeira e replicação viral. Estas proteínas reguladoras inibem a replicação e transcrição do genoma bacteriano, e dessa forma o fago passa a controlar o metabolismo bacteriano. Depois desta fase inicial, começam a ser sintetizadas as proteínas estruturais e catalíticas do fago. A cabeça e a cauda são sintetizadas separada e independentemente, uma da outra, e após o ácido nucleico ser empacotado na cabeça, dá-se a junção destas estruturas fágicas por modo a ser construído o fago.

Na fase final do ciclo lítico são sintetizadas as proteínas holina e lisina, com propriedades de danificar a integridade da membrana citoplasmática e parede bacteriana, com consequente lise da bactéria e libertação dos viriões recém formados.

No ciclo lisogénico, o ácido nucleico é integrado no DNA bacteriano ou no plasmídeo da célula hospedeira e, desta forma, o profago tem um comportamento idêntico ao genoma bacteriano, sendo replicado em sintonia com ele. Neste ciclo é sintetizada uma proteína repressora que inibe o promotor necessário à expressão dos genes do ciclo lítico. O gene repressor tem uma capacidade de auto-regulação capaz de manter a estabilidade lisogénica indeterminadamente.

O estado lisogénico é muito estável mas não é irreversível´o que causa uma certa imprevisibilidade dos ciclos de vida dos fagos. Estímulos que podem reverter o ciclo lisogénico em ciclo lítico incluem danos celulares, temperatura e alterações fisiológicas.



Bacteriófagos e fagoterapia


A especificidade dos fagos em lisarem as bactérias dá-lhes a possibilidade de serem usadas no combate às mesmas nas infecções por elas causadas.

Os fagos virulentos são os preferencialmente usados.


A distribuição sérica dos fagos para o tecido alvo de tratamento segue uma cinética de ordem um, ou seja, a quantidade de fagos distribuída por unidade de tempo é directamente proporcional à concentração plasmática até que se dê a saturação da maquinaria necessária à translocação. Isto se verifica apenas quando a concentração viral plasmática é elevada.


A metabolização dos fagos é o processo que inclui a activação dos fagos associado à capacidade de auto-replicação in situ em conjunto com a inactivação dos fagos pelo sistema imunitário.


A administração do fago adequada na dose correcta, tal como os restantes antibacterianos, leva a uma redução do número de bactérias que lhe são susceptíveis, ou mesmo à sua total irradicação, num processo designado de infecção primária ou terapia passiva. A capacidade de replicação dos fagos conduz à lise bacteriana com libertação de novos fagos que conseguem infectar outras bactérias susceptíveis e a este processo de infecção de bactérias remanescentes por fagos recém sintetizados se denomina de infecção secundária ou terapia activa.

Inundation thershold ( Vi ) é a concentração sérica mínima de fagos que é necessário existir para que a infecção primária se processe e tem de ser superior à clearance dos fagos ( Vc ).

A infecção bacteriana por fagos depende do contacto destes com aquela e estas colisões, aleatórias, são tanto mais prováveis quanto maior for a concentração das bactérias susceptíveis presentes. Assim a eficácia da fagoterapia depende do tempo de proliferação ( TP ) necessário para ser atingido o limiar da proliferação ( Xt ), ou seja, que se atinja a concentração bacteriana mínima que possibilita a replicação dos fagos administrados.

A fagoterapia será ineficaz no caso de a administração da terapêutica for muito precoce ou a dose inicial demasiado baixa, sendo que os fagos vão sendo gradualmente eliminados antes do TP ser atingido. O tempo óptimo de administração dos fagos deve ser o mais próximo possível da altura em que o limiar de proliferação é alcançado.

Nas situações em que a dose inicial apenas conduza a uma diminuição da concentração bacteriana mediada pela infecção primária, os fagos que se libertam aquando da lise bacteriana, e que vão causar a infecção secundária, vão aumentando de forma exponencial até ao momento em que a população bacteriana é eliminada de forma total.

A administração de um outro antibacteriano antes de TP causa uma diminuição da concentração bacteriana, aumentando o tempo necessário para ser atingido o limiar de proliferação. A diminuição gradual dos fagos nesta fase anterior à proliferação conduz a uma impossibilidade da infecção secundária se processar, não havendo desta forma vantagem em se usar esta associação. No entanto, após ser atingido o limiar de proliferação, esta associação entre fago e outro antibacteriano revela um efeito sinérgico com maior eficácia terapêutica.

Devido à dificuldade de determinar com acuidade o TP, é sugerido que se usem pequenas doses repetidas até o limiar da proliferação ser atingido.



Dado que os fagos interagem com as células do sistema imunitário, eles são reconhecidos como partículas estranhas e assim mecanismos imunológicos procedem à sua eliminação sérica. As células fagocíticas do sistema imunológico inato, após activação por reconhecimento do material estranho que são os fagos, são capazes de induzir a morte e degradação dos fagos.

A resposta imunitária humoral é mediada pelo sistema complemento que leva à síntese de C 3 e origina a lise da célula alvo.

O sistema imunitário adquirido funciona na destruição dos fagos, por meio de impedir a adsorção dos fagos à superfície bacteriana através da ligação dos anticorpos à cauda viral.

Os fagos, para além da clearance que sofrem pelo sistema imunitário, também podem ser excretados por via renal ou hepática mas estas 2 vias são vias minoritárias.

terça-feira, maio 30, 2023

Utilização da fagoterapia: suas vantagens e desvantagens

 

Utilização da fagoterapia: suas vantagens e desvantagens


A fagoterapia é uma terapêutica que usa os fagos que por contacto com as bactérias patogénicas específicas são infectadas e destruídas. Os fagos provocam a lise bacteriana com libertação de viriões que dão continuidade ao ciclo incluindo mesmo a migração para outros locais do organismo humano.

Os fagos, ao contrário de todos os restantes agentes antibacterianos, aumentam a sua quantidade na presença das bactérias alvo, sendo conhecido que o impacto dos fagos sobre bactérias não alvo e outras células é nulo ou muito reduzido.




Os fagos são parasitas naturais das bactérias. A infecção bacteriana pelos fagos inicia-se pela adsorção através de interacção mediada por adesinas virais que se ligam de forma reversível a receptores específicos localizados na superfície celular e que são geralmente proteicos ou glucídicos. À fase de adsorção segue-se a transferência de material genético viral para o citoplasma bacteriano donde prossegue, dependendo do tipo de fago ( virulento ou temperado ). Nos fagos temperados, o material genético do fago insere-se no da bactéria dando origem a um profago, ficando reprimido até entrar em ciclo lítico. Os fagos virulentos, que não originam profagos, dão origem a uma replicação viral imediata, terminando com rápida lise bacteriana e libertação de fagos filhos.

Enquanto os fagos temperados, por terem uma fase em que estão sob a forma de profago, têm a capacidade de transferir factores virulentos bacterianos existentes em determinadas sequências genéticas para outras bactérias que não possuem estas sequências genéticas e assim não possue estes factores virulentos.

Ao contrário, os fagos virulentos por não passarem por estado de profago, não possuem nem transferem genes de factores virulentos entre bactérias.

Após a infecção, os fagos virulentos causam degradação do genoma e outras macromoléculas da bactéria hospedeira e desta forma o metabolismo bacteriano é comprometido.

A variedade de hospedeiros dum qualquer determinado fago é limitada, geralmente restrita a uma só espécie bacteriana ou certas estirpes duma espécie. Podem, no entanto, raramente existir fagos capazes de infectar uma gama maior de hospedeiros podendo atacar um subconjunto mais vasto de uma espécie ou mesmo várias espécies.


O ciclo do fago, composto por 5 etapas, pode ser bloqueado por mecanismos da bactéria que os adquire numa acção de defesa, bem como pode a bactéria alterar os seus receptores ao fago por forma a que a adsorção não se processe.

Estas são as vias pelas quais a bactéria se pode defender da infecção pelos fagos e que leva a uma replicação de vírus.

Por sua vez, os fagos podem sofrer mutações capazes de ultrapassar estas defesas da bactéria. De salientar que os fagos apresentam mutações mais frequentes de que as bactérias que infectam.


Os fagos são classificados baseando-se na morfologia e no ácido nucleico que possuem.


O exito da fagoterapia está em relação directa com o fornecimento de uma densidade de fagos suficiente no local da bactéria que se tem como alvo por forma a ser destruída a um ritmo e magnitude adequadas.

A densidade dos fagos aumenta para atingir uma densidade adequada por meio de uma replicação in situ, denominada terapia activa, ou por meio de dosagem farmacológica convencional, denominada terapia passiva. Estas diferentes terapias têm de ser eficazes para ultrapassarem os mecanismos de perda de fagos que sempre ocorrem.

O limiar da proliferação ( XP ) representa a densidade mínima de bactérias susceptíveis acima do qual o número de fagos aumenta por replicação. Acredita-se que o limiar é idêntico para a generalidade das combinações fago-bactéria.

Tempo crítico de proliferação ( TP ) é o tempo que decorre entre a administração dos fagos no local onde está a infecção até o limiar de proliferação ser atingido. De salientar que os fagos administrados demasiado precocemente podem levar a uma remoção sistémica antes do limiar da proliferação ser atingido e assim a eficácia da terapêutica ser menor ou nula.

Na fagoterapia deve-se estimar a magnitude de TP e se , in vitro, este for muito alto, deduz-se que a fagoterapia activa não é viável.


Nas situações em que não se consegue saber nem a dose ideal nem o timing ideal, o principal é ser capaz de assegurar o tempo crítico de proliferação, ou seja, é preferível administrar doses repetidas para se ter a certeza que esse tempo é atingido do que administrar um número mais reduzido de doses elevadas.


A fagoterapia é uma terapêutica segura, não havendo relatos de efeitos secundários importantes, indução de alguma doença ou lesão das células humanas. Importante é evitar a transferência de genes causadores de patogenecidade bacteriana ou aumento da sua virulência e por estes factos são apenas usados fagos obrigatoriamente líticos na fagoterapia.


Fagoterapia para MRSA


Infecções por MRSA são difíceis de lidar devido à sensibilidade da antibioterapia ser reduzida e apresentarem grande prevalência em infecções associadas a cuidados de saúde para outras patologias, muitas vezes graves.

O cocktail Pyophage, que tem na sua constituição fagos que combatem Staphylococcus potentes, como o sB1-saph fago K, é utilizado com sucesso dada a sua actividade anti-S. aureus. Resistência aos fagos usados no combate da MRSA é muito rara. Os fagos usados na fagoterapia para MRSA são obrigatoriamente líticos, capazes de infectar um largo espectro de S. aureus e actuando também num máximo de estirpes clinicamente relevantes.

Os estudos da fagoterapia no combate à MRSA, mostram resultados positivos de mais de 80% a 100% de eficácia, envolvendo S. aureus multirresistentes.

A fagoterapia para MRSA pode usar aplicação local ou aplicação mais sistémica como via intraperitoneal.


A fagoterapia usada nas infecções cirúrgicas tem indicação prioritária nas situações em que há dificuldade de penetração dos antibióticos, seja por circulação sanguínea fraca e/ou presença de uma barreira fibrogranular ( como no pé diabético ), osteomielite crónica ( onde há fraca vascularização ) e lesões de grande superfície.


Infecções gastro-intestinais resolvidas por fagoterapia


Fagoterapia tem sido muito usada no combate de diarreias incapacitantes, podendo a via de administração ser a via oral.

Infecções crónicas de longa duração por P. aeruginosa em casos de fibrose quística, estão associadas a menor resistência a fagos do que em casos de infecções agudas. P. aeruginosa clinicamente isolada, é mais susceptível a fagoterapia do que quando isolada do ambiente.


Vantagens e desvantagens da fagoterapia


A fagoterapia apresenta sobre outras terapêuticas, e nomeadamente a antibioterapia, as seguintes vantagens principais:

  1. elevada especificidade para as bactérias que infecta com mínima acção sobre a microflora comensal

  2. não dá origem a infecções oportunistas

  3. não estão descritos efeitos laterais significativos

  4. acima do limiar da proliferação, há replicação dos fagos com aumento da sua concentração nos locais de infecção ( terapia activa )

  5. a ubiquidade dos fagos possibilita a descoberta mais fácil e menos onerosa do que o que acontece com os antibióticos

  6. complexo equilíbrio entre bactérias e seus fagos possibilita a perpetuação da sua evolução

  7. bactérias mutantes resistentes a fagos podem estar associadas a uma virulência menor e maior susceptibilidade ao sistema imunitário humano

  8. mutações bacterianas não conduzem a maior susceptibilidade ao fago-bactéria

  9. fagos podem ser geneticamente alterados para assim poderem contornar limitações e/ou torná-las mais virulentas

  10. componentes do fago, como as endolisinas, podem apresentar propriedades anti-microbianas

  11. a fagoterapia pode ser efectuada por meio de cocktails de fagos

  12. a fagoterapia pode utilizar as mais diversas vias de administração

  13. as bactérias infectadas por vírus líticos não conseguem readquirir viabilidade

  14. a fagoterapia, pelo menos em alguns casos, ultrapassa a barreira que o biofilme representa

  15. impacto ambiental reduzido ou quase nulo

  16. a fagoterapia é uma terapêutica barata


A fagoterapia também apresenta alguns pontos negativos, como sejam:

  1. a fagoterapia requer uma identificação bacteriana precisa e completa devido à grande especificidade dos fagos

  2. podem haver bactérias que por mutações que sofreram sejam resistentes a fagos específicos

  3. os fagos apresentam a capacidade de transferir genes de toxinas entre bactérias

  4. a fagoterapia é menos lucrativa para as empresas farmacêuticas do que os antibióticos, o que leva a um menor investimento

  5. existe um grande desconhecimento da comunidade médica ocidental no que diz respeito aos fagos

segunda-feira, maio 29, 2023

ADAMTS 13

 

ADAMTS 13 ( a disintegrin and metalloproteinase with a thrombospondin type 1 motif, member 13 )


ADAMTS 13 é uma enzima, sintetizada no fígado, presente no sangue humano e é responsável pela quebra do factor de von Willebrand ( vWF ), uma proteína envolvida na coagulação sanguínea.

Quando o ADAMTS 13 não está presente em quantidades suficientes, pode ocorrer uma doença rara denominada de púrpura trombocitopénica trombótica ( PTT ), na qual coágulos sanguíneos anormais se formam nos vasos sanguíneos, levando a complicações graves, como lesão renal, insuficiência cardíaca e derrame cerebral. A medição dos níveis de ADAMTS 13 no sangue pode ser útil no diagnóstico e tratamento da PTT.


O síndrome hemolítico urémico atípico ( SHUa ) é uma doença rara que pode ser causada por uma mutação genética que afecta o sistema complemento do organismo, que é uma parte importante do sistema imunológico. A SHUa pode levar a danos nos vasos sanguíneos, anemia hemolítica, trombose e insuficiência renal.


à proteína ADAMTS 13 é uma enzima que desempenha um papel importante na regulação da coagulação do sangue, que é um processo complexo que envolve várias proteínas e enzimas. A deficiência ou ausência de ADAMTS 13 pode levar a uma condição chamada de Púrpura Trombocitopénica Trombótica, que é outra doença rara que pode causar danos aos vasos sanguíneos, anemia hemolítica e coágulos sanguíneos.


Os pacientes com SHUa podem ter níveis reduzidos de ADAMTS 13, o que pode contribuir para os sintomas da doença. No entanto, a SHUa e a PTT são duas condições diferentes e são causadas por diferentes mecanismos biológicos. O tratamento da SHUa pode incluir terapias que visam reduzir a activação do sistema complemento, enquanto o tratamento da PTT pode envolver a reposição da enzima ADAMTS 13.

Susceptibilidade da Salmonella multirresistente frente a fago P22

 

Susceptibilidade da Salmonella multirresistente frente a fago P22


Presentemente tem-se vindo a verificar um forte aumento de bactérias, e nomeadamente Salmonellas, multirresistentes, devido ao incorrecto uso e indescriminado dos antibióticos. Devido a este aparecimento de resistências, tem-se vindo a procurar outros tratamentos antibacterianos e dentre eles a fagoterapia é uma importante alternativa.

Os bacteriófagos que se conhecem, específicos da Salmonella enterica pertencem à família Microviridae ( que são bacteriófagos isométricos, possuem DNA mas não RNA, e cabeça icosaédrica ). P22 é um fago que parasita sorovar ( sorovar é uma classificação de subespécies de bactérias ou vírus, baseado em diferenças antigénicas, que é frequentemente usada em microbiologia e epidemiologia para identificar diferentes cepas e rastrear surtos de doenças infecciosas ) Typhimurium e que está presente na família Podoviridae.


O P22 é um fago constituído por um ácido nucleico, DNA geralmente e somente raras vezes RNA, ao redor do qual existe uma cápsula proteica denominada cabeça que protege o ácido nucleico.

Os bacteriófagos P22 podem apresentar um ciclo de vida lítico ou lisogénico.


A fagoterapia apresenta diversas vantagens comparativamente com a antibioterapia. Assim, a fagoterapia é eficaz em bactérias resistentes aos antibióticos, não há infecção de outras bactérias como as da flora comensal intestinal, e reage rapidamente a uma possível resistência que as bactérias adquiram aos fagos pela capacidade apresentada por estes de poderem sofrer mutações; o custo da fagoterapia, tanto o do tratamento como o da investigação dos fagos, é reduzido relativamente ao dos antibióticos.


Dados os fagos não agirem sobre as células eucariotas, eles não apresentam efeitos colaterais no ser humano. Os fagos infectam exclusivamente procariotas: Bacteriae e Archae.


Estudos evidenciaram a capacidade do fago P22 conseguir actuar, e lisar, diferentes espécies de Salmonella e cepas multirresistentes.

sexta-feira, maio 26, 2023

Fagos e a transdução

 

Fagos e a transdução


Transdução é um processo biológico no qual material genético é transferido duma célula para outra por meio dum bacteriófago. O processo de transdução ocorre quando um vírus infecta uma bactéria e incorpora parte do seu próprio genoma.

Quando o vírus infecta outra bactéria, ele pode transferir esse material genético para a nova célula alterando assim o genoma da célula receptora.


Existem 2 tipos principais de transdução: transdução generalizada e transdução especializada. Na transdução generalizada, o vírus bacteriófago pode incorporar qualquer parte do material genético da célula hospedeira em seu próprio genoma e transferi-lo para outra bactéria. Na transdução especializada, o fago incorpora apenas material genético específico da célula hospedeira em seu próprio genoma e o transfere para outra célula bacteriana.


A transdução é um processo importante na pesquiza genética e na engenharia genética, pois pode ser usada para transferir material genético específico duma bactéria para outra. Além disso, a transdução pode ter implicações na evolução bacteriana, pois pode levar à transferência horizontal de genes entre diferentes espécies bacterianas.


A transdução especializada, ao contrário do que sucede com a transdução generalizada, só pode acontecer com fagos temperados dado que as partículas transdutoras especializadas formam-se pela excisão inadequada dos profagos na altura em que o ciclo lítico é induzido. Quando se dá a excisão do profago, por recombinação, a excisão não se dá exactamente nos extremos do profago mas sim se corta um fragmento de DNA que inclui o profago mais uma porção de genóforo bacteriano. Se no processo de excisão, a parte do genóforo bacteriano é significativa, então o profago não pode ficar todo incluído dentro do fago transdutor especializado dado que a viabilidade do fago só acontece se a quantidade de DNA contida está entre 73% e 110% do genóforo do fago. Assim sendo, podemos dizer que um fago transdutor especializado é um organismo que difere do que lhe deu origem, tendo alguns genes novos e outros que perde. Por esta particularidade, alguns fagos que perderam genes apenas podem desenvolver-se na presença de outros fagos, os fagos ajudantes ou “helper”, que possuem genes essenciais ao desenvolvimento do gene “inviável”.

As excisões aberrantes geradoras de fagos transdutores especializados são raras.

Os fagos especializados contêm somente os genes que se localizam imediatamente adjacentes ao local de integração do profago. O fago lambda geralmente se integra no local att , entre os operons bio ( que codifica a vitamina biotina ) e o gal ( que codifica o catabolismo da galactose ) e assim ao se induzir um lisogéneo λ normal, podem gerar-se fagos transdutores especializados que levam genes bio ou genes gal. Se o fago λ lisogenar cepas de E. coli desprovidas de attλ,então o fago λ pode integrar-se noutros locais secundários e assim se formarem fagos transdutores especializados que aportam genes adjacentes a esses locais e que não obrigatoriamente sejam bio ou gal.


Na fagoterapia, apenas fagos virulentos, obrigatoriamente líticos, são considerados eficazes.

Defesas não específicas, como ácido gástrico ou sistema retículo-endotelial, podem ocasionar redução da densidade dos fagos e assim resposta menos intensa.


Barreiras como hematoencefálica, intestinal ou outras não influenciam na capacidade dos fagos as atravessar e assim atingirem a corrente sanguínea e se dispersarem pelo organismo humano, qualquer que seja a forma de aplicação: per os, IM, EV, etc


Teoricamente não é necessária uma alta densidade de fagos para que seja eficaz uma eventual primo-infecção.




Vantagens e desvantagens da fagoterapia




quarta-feira, maio 24, 2023

Fago P22

 

A acção dos fagos sobre a Salmonella – fago P22


A primeira fase da infecção por fagos das bactérias é a adsorção que consta da fixação do fago à parede da bactéria.

Os fagos usam diversos tipos de locais receptores que variam entre proteínas, oligossacarídeos, ácido teicóico, peptideoglicanos ou lipopolissacarídeos que estão presentes nos diversos componentes da superfície da membrana celular da bactéria que é infectada e se comporta como um hospedeiro do fago.


O bacteriófago P22, fago P22 ou Enterobacteria phage P22, que são diferentes designações do mesmo fago, é um fago da família Podoviridae ( fago de cauda curta ) que parasita a Salmonella enterica subespécie enterica. A sua adesina é uma proteína homotrimérica de 215 kDa que se localiza na ponta da cauda, sendo que estes fagos possuem 6 fibras caudais de 13 nm que se fixam num único vértice do capsídeo.




É através da cauda que o P22 reconhece a sequência do antigéneo somático na membrana lipopolissacarídica da Salmonella enterica dos grupos A, B1 e D1.

A cauda de P22 tem uma acção endoglicosidase com propriedade de clivar e hidrolisar os polissacarídeos do antígeneo somático las ligações raminose-galactose α(1 3) glicosídicas e assim dar origem a dímeros de unidades repetitivas do produto principal, sendo esse sistema receptor-inactivador comum nos fagos polissacarídeos específicos. Este processo é irreversível.

Endolisinas são as enzimas que medeiam a lise provocada pelos fagos, podendo estas lisinas ser lisozimas, transglicosidades ( estas 2 atacam locais glicosídicos ) ou amidases ( que atacam locais peptídicos da parede bacteriana ).

Estas endolisinas intervêm tanto no processo da invasão da bactéria como no lise da bactéria com libertação dos fagos filhos.


Em fagos lambdóides, um só promotor, designado PR , é o responsável pela transcrição dos genes que conduzem à produção das enzimas. O cistron promotor proximal da transcrição é formado pelos genes S, R, Rz e Rz1, que são os genes da lise, genes estes também intervenientes na síntese do capsídeo e da cauda durante o processo de replicação intracelular do fago.

O gene R codifica uma enzima chamada transglicosidase, semelhante à lisozima ( como vimos atrás são ambas endolisinas que atacam os locais glicosídicos ), hidrolisa os receptores glicosídicos existentes na camada de peptídeoglicanos. O gene S influencia na permeabilidade da membrana plasmática, permitindo desta forma que as endolisinas se infiltrem e atinjam os receptores glicosídeos

terça-feira, maio 23, 2023

Generalidades sobre bacteriófagos

 

Generalidades sobre bacteriófagos


Os bacteriófagos são muito frequentes no tracto gastro-intestinal e constituem um importante componente da microbiota intestinal.


A primeira fase do ciclo biológico dos fagos é a adsorção, que se processa em 2 fases: reversível seguida de uma fase irreversível

A atracção electrolítica influencia muito na primeira etapa da adsorção. Na etapa irreversível, as ligações tornam-se mais estáveis e enzimas hidrolíticas actuam por forma a facilitar a transferência de material genético do fago através da parede bacteriana. Sejam as bactérias gram positivas ou gram negativas, praticamente todas as estruturas bacterianas da parede bem como estruturas acessórias ( pili, flagelos, cápsula ) podem ser usadas pelos fagos na adsorção como locais de ligação.

A segunda etapa do ciclo biológico é a penetração do ácido nucleico, sendo que nesta etapa o fago usa enzimas para perfurar a parede bacteriana, fazendo autênticos buracos por onde penetra o ácido nucleico.

Em fagos muito virulentos e que exibem logo o ciclo lítico, logo que o material genético do fago atinge o citoplasma bacteriano, inicia-se a biossíntese do material genético e das proteínas virais. Nos primeiros, poucos, minutos não se encontram fagos completos na célula infectada, sendo apenas encontrados componentes isolados. Na multiplicação viral, no chamado período eclipse, ainda não há fagos completos e infeciosos. Após este período de eclipse, e com a formação dos viriões, dá-se a lise da parede bacteriana, morte da bactéria, disseminação dos viriões recém formados e posterior infecção de novas bactérias.

No passo de empacotamento de material genético do fago pode haver inclusão de material genético do hospedeiro, o que faz com que esse fago, numa subsequente infecção, injecte seu material genético com partes do genoma do anterior hospedeiro, que será inserido no genoma do novo hospedeiro por recombinação, ocorrendo aquilo a que se designa de transferência genética horizontal.

Outros fagos promovem uma infecção crónica das bactérias estabelecendo uma relação de parasitismo. Estes fagos produzem, de modo contínuo, uma pequena quantidade de vírus, não matando as células hospedeiras e são libertados por brotamento.

Existe uma terceira opção de comportamento dos fagos em que estes originam o profago e em que o ciclo de vida é o ciclo lisogénico, em que proteínas sintetizadas silenciam a expressão da quase totalidade dos genes virais. O ciclo lisogénico, que se associa ao processo de tradução especializada, que permite transferir informação genética capaz de alterar características metabólicas, morfológicas e fisiológicas das bactérias, o que permite a adaptação destas a novos nichos ecológicos.


Conversão lisogénica é o fenómeno em que pela insersão de material genético, pelo processo de tradução, há modificação de propriedades do procariota infectado.

A esta fase, de inserção do genoma viral na bactéria, segue-se a fase de maturação, em que o fago é construído e à qual se segue a libertação dos fagos da célula hospedeira por lise desta.


Células infectadas por vários fagos, mais provavelmente seguem o ciclo lisogénico devido a uma mais alta expressão de C II e C III. C I, proteína repressora de lambda, bloqueia a expressão dos promotores PL e PR . C I bloqueia o mecanismo lítico e estabiliza o estado lisogénico. É preciso a presença contínua de C I para se manter o ciclo lisogénico.

As proteínas C I e Cro são proteínas reguladoras com função oposta. Enquanto C I presente aponta para o ciclo lisogénico, já a presença de Cro ajuda a que o ciclo lítico se desenvolva.

sábado, maio 20, 2023

 

Fagoterapia


Denomina-se fagoterapia à terapêutica antibacteriana que usa bacteriófagos como agentes terapêuticos.

Os fagos oferecem algumas vantagens comparativamente à antibioterapia, como por exemplo o estarem presentes no habitat dos seus hospedeiros bacterianos. Os fagos não são uma terapêutica vulgarmente usada pois apresentam algumas dificuldades, como sejam a pureza insuficiente das preparações de bacteriófagos, uma fraca estabilidade e viabilidade dessas preparações fágicas e uma falta de entendimento da heterogenecidade e modo de acção dos fagos.


Os fagos podem modificar os seus ácidos nucleicos com a finalidade de escaparem a enzimas que a bactéria que infectam produzem e são capazes de destruir o ácido nucleico viral. Verificou-se, por exemplo, no fago λ existir uma substituição de citosina por 5-hidroximetilcitosina com esta função de escapar à destruição pelas enzimas bacterianas.

O DNA de T4 após a sua formação é bombeado para o interior da cabeça proteica do fago com dispêndio de energia. Após a entrada do DNA na cabeça, esta é selada, sendo então adicionadas as fibras da cauda e demais componentes do fago por automontagem.




O genoma fágico codifica 2 proteínas com propriedades de romperem as paredes celular e bacteriana, respectivamente holina e lisina.

Cada bactéria infectada é capaz de gerar 100 viriões num espaço de tempo de 25 minutos.




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Na multiplicação dos fagos operada dentro do seu hospedeiro, primeiro se expressam os genes antes da síntese de cópias de material genético viral, ao qual se segue a expressão dos genes intermediários com função de codificarem as proteínas estruturais e por fim se expressam os genes tardios que levam à síntese das lisinas, que têm como função a rotura da parede celular e assim permitir a libertação da progérie viral. Este é um processo contínuo, o que significa que simultaneamente à síntese das lisinas se processa a produção das proteínas estruturais com função de aderirem ao fago por forma a que quando se dá a lise celular, os viriões sejam libertados, bem como fragmentos de material genético, capsídeos e proteínas estruturais não infecciosas.


A existência de uma pequena troca de informação genética entre o fago e o seu hospedeiro pode levar a uma mudança na sua estrutura e funcionamento que origina um comportamento da célula hospedeira alterado, passando a que a célula hospedeira evidencie funções que apenas existem após a interrrelação entre fago e hospedeiro.



Ernest Hankin, em 1896, foi o primeiro a referir a existência de fagos. Apenas 2 décadas depois os bacteriófagos foram identificados como tendo potencial como agentes antibacterianos, tendo sido Twert e Herelle, em estudos separados, os cientistas responsáveis por este facto.

Os fagos podem ter 2 tipos de ciclos de vida: lítico e lisogénico. No ciclo lisogénico, o DNA do fago integra-se no DNA bacteriano formando o profago. O profago, que fica essencialmente inactivo, tem no entanto a capacidade de levar à codificação de um repressor que impede a síntese de enzimas de replicação de material genético e proteínas do capsídeo. Se a célula entra em processo de stress, o repressor deixa de actuar, entrando-se em fase lítica com sintetização de cópias de material genético do fago, suas proteínas estruturais e assim multiplicação viral com posterior lise celular e disseminação dos fagos.




As bactérias, apesar de serem hospedeiros naturais dos seus fagos específicos, desenvolveram defesas contra eles. A interacção entre os fagos e as bactérias tem um carácter invasivo e de predação. A bactéria, numa acção de defesa contra o fago, evita qualquer contacto com esses fagos acontecendo isto por meio de uma modificação dos receptores dos fagos na parede celular ou pela secreção de uma barreira que impede a adsorção do fago à bactéria. Esta barreira é constituída por uma camada, na parede bacteriana, com enzimas de restrição ou uma camada de muco capaz de acção antiaderente impeditiva da adsorção. Por sua vez os fagos, numa tentativa de sobrevivência, foram-se adaptando por forma a superar aquelas defesas da bactéria.

Os fagos causaram uma variante específica que permite que a capacidade de replicação em células da mesma linhagem melhore. Pelo contrário a capacidade de replicação é mais restricta em células de estirpe diferente.

O mecanismo clássico restritivo dos fagos é a clivagem endonucleotídica do DNA do fago quando não é especificamente metilado em locais determinados.

No final do ciclo de crescimento dos fagos no seu hospedeiro, o DNA do fago é metilado nos locais de reconhecimento específico para o adaptar ao sistema específico de DNA do hospedeiro, tornando-se assim capacitados para infecção de outros hospedeiros possuidores do mesmo DNA do sistema restrição-modificação. A modificação do DNA controlado do hospedeiro, é a forma de superar a restrição do DNA, mais importante. Quando uma célula com DNA de diferente sistema de restrição de modificação é infectada por um fago, o DNA deste fago é restrito/restringido visto a sua metilação não está nas sequências do DNA reconhecidas pelo sistema.

A restrição e modificação dos fagos também podem se dar por mecanismo envolvendo a modificação das proteínas e não do DNA.




Vários são os factores capazes de interferir no ciclo de vida dos fagos e estes factores se agrupam em factores físico-químicos, nomeadamente acidez, salinidade e concentração de iões.

Estes factores são capazes de inactivar um fago por causarem uma supressão dos elementos estruturais ( cabeça, cauda e envelope ), por perda de lípidos e/ou DNA e por alterações estruturais.


O sistema imunitário é o principal obstáculo natural humano ao uso dos fagos pela possível rápida inactivação dos fagos por aquele sistema imunitário. Na tentativa de fuga a este sistema imunitário, os fagos, de modo natural ou por engenharia genética, têm produzido moléculas peptídicas, capazes de antagonizar a acção do sistema imunitário, localizadas no capsídeo do fago e que impedem a inactivação viral, sendo esses peptídeos umas moléculas antagonistas das vias do complemento, as interleucinas e outras citosinas bem como proteínas glicosiladas e factores de inibição.


A inactivação dos fagos por acção da pressão é obtida por interrupção das funções celulares responsáveis pela reprodução e sobrevivência dos fagos e atingem principalmente a cápside do fago com uma desestabilização do envelope viral ou da estrutura proteica do cápside, dos receptores utilizados na adsorção e na degradação de algumas proteínas do fago, isto é, a pressão inactiva os vírus por lhes alterar a estabilidade das proteínas da cápside viral com consequente perda de reconhecimento, por parte do fago, e ligação aos receptores que se encontram na superfície da célula hospedeira.


A frequência de mutação dos fagos é superior à frequência de mutações das bactérias, o que faz com que os fagos consigam rapidamente ultrapassar qualquer mecanismo de defesa que a bactéria tenha desenvolvido contra o fago.

quarta-feira, maio 17, 2023

Bacteriófagos - revisão da literatura

 

Bacteriófagos - revisão da literatura


Bacteriófagos, ou simplesmente fagos, são vírus capazes de destruir bactérias específicas. Os bacteriófagos multiplicam-se segundo um ciclo lítico ou lisogénico, utilizando obrigatoriamente o mecanismo bacteriano sendo dessa forma um parasita intracelular obrigatório.

Os bacteriófagos ligam-se às bactérias que infectam através de receptores específicos existentes na parede bacteriana aos quais se ligam e injectam o material genético através da parede bacteriana.

Estudos apontam para uma maior virulência dos bacteriófagos quando in vivo comparativamente com in vitro.

A cavidade oral é tida como sendo um dos melhores locais para a propagação dos fagos devido à microflora complexa existente, a temperatura em redor dos 36 graus centígrados e a consistência semi-sólida da placa bacteriana encontrada na superfície dentária.

Fagos têm sido usados como terapêutica no combate a diversas bactérias como a E. coli, Pseudomonas sp, Staphylococcus sp, Klebsiella sp, Proteus sp, entre outros.

A fagoterapia pode estar indicada em 3 situações:

  1. combater bactérias com resistências aos antibióticos

  2. combater bactérias resistentes a antibióticos apesar de em testes culturais se verificar serem sensíveis, resistência aquela conferida pela dificuldade de acesso dos antibióticos aos locais infectados que apresentam má vascularização como acontece em casos de osteomielite, úlceras diabéticas ou formação de biofilme

  3. em casos de contra-indicação da antibioterapia eficaz como sejam situações de hipersensibilidade ao fármaco, problemas do tracto gastro-intestinal ou quando há risco de infecção por Clostridium difficile

Fagoterapia está indicada, entre outras situações, nas úlceras de pele, infecções purulentas, MRSA, profilaxia em feridas, queimaduras, infecções com acesso difícil aos antibióticos, infecções do tracto respiratório ou genitourinário e em casos de sépsis.


Os bacteriófagos são vírus, quase na sua totalidade ( 96% dos casos ) apresentando uma cauda, um DNA dupla cadeia, com uma cabeça proteica icosaédrica onde o DNA se encontra, um pescoço que liga a cabeça à cauda, uma cauda tubular que permite a passagem do DNA da cabeça para o interior da célula bacteriana, fibras da cauda que são proteicas e apresentam a capacidade de ligação a receptores específicos existentes na parede bacteriana e a placa final que de estrutura proteica permite a ligação irreversível do fago à bactéria.

Os fagos, ao contrário dos agentes quimioterapêuticos, podem replicar-se no interior da célula que parasitam.

Os fagos podem seguir a via lítica, na qual há 5 fases:

  1. fase de fixação ou adsorção

  2. fase de injecção do material genético

  3. fase de replicação do DNA do fago

  4. fase de reunião e montagem

  5. fase de lise bacteriana

A fagoterapia é um tratamento “personalizado” com a administração de um fago específico do patogéneo previamente identificado in vitro ou em alternativa usa-se um cocktail formado por vários fagos distintos capazes de atacar uma ou mais bactérias diferentes patogénicas.


As lisinas são codificadas em fagos e são as responsáveis pela lise das bactérias atacadas pelo fago através de degradação rápida da parede celular de gram positivos susceptíveis.

Lisinas como PlyC são muito activas contra Streptococcus pyogenes. Foram descritas lisinas, como CF-301, ClyH, ClyF, phi 11 endolisina, SAL-2, Ply187AN-KSH3b e P128, activos contra Staphylococcus aureus. Muitas outras lisinas existem capazes de actuar contra muitas outras bactérias como Streptococcus suis, Streptococcus pneumoniae, Streptococus mutans, etc.


Os fagos actuam numa estreita variedade de hospedeiros alvo, sendo fortemente específicos desses hospedeiros. Não afectam a microflora normal específica do local humano onde se pretende que actuem. Um cocktail de fagos é necessário usar quando há necessidade de combater mais que uma bactéria. Os bacteriófagos apresentam as seguintes importantes propriedades:

  1. administração em dose única dado se multiplicarem no interior das bactérias que atacam e permanência na região enquanto a infecção bacteriana persistir

  2. não apresentam efeitos adversos indesejáveis paralelos com a acção bactericida sobre as bactérias comensais e dessa forma não há disbiose

  3. capacidade de atenuar a virulência bacteriana após o seu uso

  4. baixo custo económico

Os fagos também apresentam algumas desvantagens como sendo:

  1. desconhecimento, com certeza absoluta, de quão eficaz é a acção do fago ainda que se tenha identificado a bactéria patogénica em causa, dada a possibilidade de ser um fago temperado onde a infecção da bactéria não de forma obrigatória leva a um ciclo lítico de forma imediata

  2. obrigatoriedade de identificação exacta da bactéria patogénica, dada a alta especificidade do fago pela bactéria alvo

  3. espectro estreito dos hospedeiros bacterianos

  4. presença de toxinas nos lisados brutos

  5. rápido clearance dos fagos da via sanguínea pela acção do sistema reticuloendotelial dado o reconhecimento das proteínas presentes na superfície do fago pelo sistema imunitário do hospedeiro.


Lisinas são enzimas presentes no bacteriófago com capacidade de digerir a parede bacteriana e têm como objectivo a ruptura desta parede com consequente libertação dos fagos sintetizados no interior da bactéria infectada. A acção das lisinas revela-se como tendo uma potência superior à dos antibióticos, podendo potenciar a acção dos antibióticos.

Algumas lisinas possuem efeitos indesejáveis ao organismo humano, como seja agregação plaquetária, pelo que não são usadas em terapêutica.


Os fagos que são usados na fagoterapia apresentam uma expectativa de vida longa, um número de virions libertados em cada ciclo lítico elevado, curtos períodos de eclipse e latente que é o tempo que decorre entre a injecção intracelular do hospedeiro de material genético do fago e a lise com libertação e dispersão dos novos fagos filhos.

Parece que os fagos actuam de forma negativa sobre o sistema imunológico do hospedeiro.


O genoma viral pode ser DNA ou RNA, seja de cadeia simples ou dupla, linear, circular ou superenrolada, sendo que a quase totalidade dos fagos, cerca de 96%, são de dsDNA.


No processo de transferência do DNA viral para o interior da bactéria infectada estão envolvidos factores como sejam o gradiente electroquímico, moléculas de ATP ou a lise enzimática da parede bacteriana que é catalisada por hidrolases de peptideoglicanos virais. A maioria dos fagos injecta o DNA na bactéria associado a proteínas específicas, sendo que por vezes o DNA é introduzido de forma gradual, sendo a transcrição e tradução da primeira fracção um requesito essencial para se proceder à entrada do restante genoma.


A decisão do fago seguir para ciclo lítico ou ciclo lisogénico sofre influência de parâmetros ambientais e fisiológicos como estado nutricional, metabólico e dimensão da célula hospedeira como a proporção de partículas virais relativamente ao número de bactérias susceptíveis.

O ciclo lítico é vantajoso quando o crescimento e metabolismo das células hospedeiras são adequadas à perpetuação do fago. O ciclo lisogénico é uma estratégia de sobrevivência por parte do fago em condições inadequadas.


Na fase final do ciclo lítico, são sintetizadas as proteínas holina e lisina, que são enzimas que lesam a integridade da membrana citoplasmática e da parede bacteriana respectivamente, e que dessa forma lisam a célula hospedeira e permitem a libertação dos fagos recém formados que vão infectar novas bactérias.

Enquanto que a entrada de material genético do fago vai levar à actividade dos promotores no ciclo lítico, já no ciclo lisogénico é a proteína repressora a sintetizada por forma a inibir o promotor necessário à expressão dos genes da via lítica. Na via lisogénica verifica-se que o gene repressor se auto-regula, o que permite que a estabilidade lisogénica permaneça indefinidamente. O ciclo lisogénico é muito estável, sendo que a reversão espontânea a ciclo lítico se verifica uma vez em cada 10 ⁸ gerações celulares.


Translocação, fenómeno que designa a passagem de microorganismos estranhos através da barreira epitelial para o sistema circulatório ou linfático, é um termo que se pode aplicar a administração sistémica como via per os, IM ou retal.

Comprovou-se a influência da estrutura proteica da cápside viral no reconhecimento por células humanas, como sejam os enterócitos, células M e dendríticas, células estas envolvidas no transporte dos fagos para a via sanguínea ou linfática, o que explica que nem todos os fagos são bem sucedidos no processo de translocação.

A variabilidade da biodisponibilidade é uma característica negativa quando é a via oral a usada na fagoterapia. A fagoterapia usa como via de referência a administração tópica dadas as limitações da via oral e a necessidade de uma pureza superior quando é usada a via EV.

O fago pode ter de se movimentar da via sanguínea para o local da infecção e este fenómeno se denomina distribuição. O aumento da permeabilidade tecidual provocado pela infecção bacteriana pode relacionar-se com este fenómeno denominado distribuição. A quantidade de fagos que é distribuída por unidade de tempo é directamente proporcional à concentração de fagos no plasma até à saturação da maquinaria necessária à translocação se verificar.

Metabolização é o fenómeno em que o conjunto de reacções enzimáticas necessárias promovem alterações químicas num fármaco podendo originar o metabolito activo ou facilitando a sua excreção. Os bacteriófagos, na fase de metabolização, podem sofrer uma activação que os leva à replicação in situ ou podem ser inactivados pelo sistema imunitário.


Para se proceder à infecção primária por parte dos fagos nas bactérias, é preciso que a concentração sérica mínima do fago exista, sendo esta concentração mínima chamada de Inundation threshold ( Vi ), sendo esta concentração mínima obrigatoriamente superior à sua clearance ( Vc ).

O contacto inicial do fago com a bactéria dá-se por colisões aleatórias e a probabilidade de um fago contactar e infectar uma bactéria está dependente da concentração de bactérias que são susceptíveis ao fago em questão, sendo assim a eficácia da fagoterapia função do tempo ( Tp ) que é preciso para a população bacteriana atingir o chamado limiar de proliferação ( Xt ), isto é, o tempo necessário a que a bactéria atinja a concentração mínima bacteriana para possibilitar a replicação dos fagos administrados.

Se a administração dos fagos for muito reduzida ou for administrada muito precocemente, os fagos vão sendo eliminados de forma gradual antes de ser atingido o Tp e assim a terapêutica vai falhar. A administração dos fagos deve-se efectuar o mais próximo possível da altura em que o limiar de proliferação é atingido.

No caso da dose inicial apenas reduzir a concentração bacteriana mediada pela infecção primária, os fagos que se libertam pela lise das bactérias sofrem um aumento exponencial até à completa eliminação da população bacteriana.

A administração do fago em conjunto com outro antibacteriano, nomeadamente antibiótico, antes de Tp, vai causar uma diminuição da concentração bacteriana com consequente prolongamento do tempo para ser atingido o limiar da proliferação ( Xt ). A eliminação dos fagos nesta fase de pré-proliferação impossibilita a infecção secundária não havendo vantagens, em termos terapêuticos, destas associações ( fago mais antibiótico ) nestas condições. Pelo contrário, a administração concomitante é sinérgica após o limiar de proliferação ser alcançado e assim a eficácia terapêutica torna-se mais forte.


Fagoterapia versus antibioterapia

Fagoterapia é uma terapêutica particularmente útil em casos de resistência bacteriana aos antibióticos.

O espectro de acção da fagoterapia é estreito, o que pode ser considerado uma vantagem dado que bactérias resistentes a uma série de fagos permanecem sensíveis a um outro fago que lhe é específico, ao contrário do que acontece com os antibióticos cujas resistências abrangem muitas bactérias. Esta alta especificidade dos fagos possibilita que a flora comensal não seja atacada. Dada a replicação intra-bacteriana dos fagos, uma pequena dose de fagos pode ser suficiente pois que se multiplica no organismo. Os fagos são eficazes em locais com pouca irrigação sanguínea ou em locais com formação de biofilmes, situações em que os antibióticos se mostram ineficazes. Uma vantagem dos fagos é o seu baixo preço.


Mecanismos de resistência bacteriana aos bacteriófagos

Existem diversos mecanismos de resistência bacteriana aos fagos dependendo estes mecanismos da associação entre o fago e a bactéria em questão.

Entre estes mecanismos temos:

  1. inibição da adsorção viral: bactérias adquirem genes capazes de codificar a síntese de uma proteína que altera a estrutura ou conformação dos receptores de superfície usados pelo fago para se ligarem à bactéria; outras bactérias impossibilitam esta adsorção através da síntese de polímeros que formam uma barreira e assim o fago não consegue ligar-se aos receptores

  2. inibição da entrada do DNA do fago no interior da bactéria: algumas bactérias codificam o sistema Sie cuja função é impedir a entrada do DNA do fago no interior da bactéria

  3. clivagem dos ácidos nucleicos virais

Os fagos são agentes bastante seguros clinicamente. No entanto efeitos indesejáveis podem surgir e neste caso podemos referir que o facto dos fagos lisarem bactérias pode originar a libertação de endotoxinas existentes no interior das bactérias que pela sua lise se libertam e que podem causar respostas inflamatórias



Os fagos podem ser classificados como monovalentes ou polivalentes, sendo os monovalentes os que se ligam apenas a um receptor celular e possuem em regra um espectro de infecção mais restrito enquanto os fagos polivalentes se podem ligar a mais de um receptor e dessa forma possuem um espectro infeccioso mais largo.

Os fagos com cauda iniciam o processo de infecção das bactérias por um processo de adsorção das proteínas localizadas na cauda, as RBP ( receptor binding proteins ) com receptores na face externa da membrana celular do hospedeiro. Estes receptores podem ser desde pilus, que caracterizam os fagos F+ ou “male specific”, ou outros componentes da superfície como lipopolissacarídeos ou peptideoglicanos, que são os chamados fagos somáticos. Após se processar a adsorção, o fago pode injectar o seu material genético no citoplasma do hospedeiro.

Por criotomografia electrónica foi demonstrado que o fago T4 tem a capacidade de alternar, entre conformação estendida e não estendida, as 6 fibras longas da cauda. Quando, na conformação estendida, a ligação ao receptor bacteriano é feita, e antes desta fibra se desligar, uma segunda fibra faz outra ligação, sendo que esta alternância da ligação das fibras ajuda o fago a encontrar o local óptimo para a ligação irreversível se fazer, sendo esta fase de ligação irreversível a etapa em que as enzimas hidrolíticas actuam por forma a que se processe a penetração do material genético na célula.

O ciclo lisogénico pode provocar imunidade no hospedeiro a novas infecções por fagos relacionados sendo que a alteração dos receptores celulares de hospedeiros pode ser o processo pelo qual se origina essa imunidade. Os genes do profago podem ser os responsáveis pela alteração dos receptores celulares e esta imunidade adquirida desta forma impede a adsorção de outros fagos à bactéria infectada.

A aquisição de resistência pelo hospedeiro aos fagos é uma consequência natural do processo infeccioso. Cocktails fágicos são indicados para prevenir o mecanismo de aquisição da resistência pelas bactérias quando se faz fagoterapia. Estes cocktails são compostos por diferentes fagos, que podem ter os mesmos alvos ou alvos diferentes para a mesma bactéria, aumentando assim as possibilidades de alvos na célula bacteriana e diminuindo as possibilidades de alvos na célula bacteriana de resistência e escape.