sexta-feira, fevereiro 15, 2019

Hemoglobina A1c

Hemoglobina A1c – Hgb A₁c

Hemoglobina A₁c é um dos mais úteis e usados biomarcadores, dada a sua correlação com as complicações diabéticas.
Dados foram acumulados de variáveis não diabéticas serem capazes de afectar Hgb A₁c com significado clínico variável. A identificação do gap de glicosilação, isto é a discrepância entre Hgb A₁c prevista e mensurável, pode ter significado clínico.

Um número significativo de variáveis existe capazes de alterar a concentração de Hgb A₁c, embora apenas uma pequena parte dessas variáveis tenha importância clínica.

A Hgb A₁c é produzida a uma taxa dependente do substracto ( glucose ), in vivo, continuamente pela formação duma ceto-amina no N-terminal da cadeia beta da hemoglobina.
A glucose entra no eritrócito a uma taxa proporcional à glicemia presente, através dos canais GLUT 1, por forma a igualar a concentração da glucose intra e extraeritrocitária.
As complicações microvasculares da diabetes, nomeadamente nefropatias, neuropatias e retinopatias, aparecem em tecidos que expressam os canais GLUT 1 e, possivelmente, a causa seja a toxicidade causada pela glicose intracelular.
Esta é provavelmente a razão pela qual existe uma muito boa correlação entre complicação diabética e Hgb A₁c e esta se mostra um muito bom biomarcador da homeostasia da glicose.

Hgb A₁c se correlaciona fortemente com a glicemia e, assim, é um bom marcador da monitorização dos níveis de glicose no soro e dá uma média aproximada da concentração de glicose sérica nos últimos 120 dias.
Eritrócitos integram os níveis de glicose durante toda a sua vida e alterações súbitas de glicemia causam pouca influência no resultado final da Hgb A₁c, o que faz este teste ter pouca importância nas situações de início recente, nomeadamente diabetes tipo I e diabetes gestacional, bem como na diabetes causada por pancreatite aguda.

Actualmente, os imunoensaios para determinação de Hgb A₁c dão resultados muito fiáveis para a maioria das variantes de hemoglobina, o doseamento de Hgb A₁c não deve ser usado em doentes homozigóticos cuja semivida média eritrocitária seja significativamente anormal.
As amostras para determinação de Hgb A1c devem ser de sangue total, podendo este ser venoso ou capilar. Não há, até à data, estudos em sangue arterial que demonstrem que também pode ser este tipo de sangue arterial uma amostra adequada para esta determinação.
A estabilidade de Hgb A₁c é grande para períodos prolongados. Armazenamento a 4ºC é preferível comparativelmente com a temperatura de -20ºC quando são usadas técnicas que empreguem métodos de troca iónica. Para períodos muito grandes de armazenamento, devem ser as amostras guardadas a -70ºC.
Não há ritmo circadiano para a Hgb A₁c mas pode existir um ritmo sazonal, com valores mais altos no Inverno.
Lípidos, ureia, glicose ( e Hgb A₁c fracção lábil ), aspirina, vitamina C e bilirrubina não parecem causar interferência clinicamente significativa no doseamento da Hgb A₁c, embora se verifiquem alterações tanto negativas ( colesterol, triglicerídeos ) como positivas ( vitamina C ). Hemólise parece não afectar a determinação da Hgb A₁c.

Factores que podem interferir no doseamento da Hgb A₁c
  1. Semivida média eritrocitária: embora a semivida média eritrocitária seja de 3 meses, verificou-se que o mês mais recente afecta em cerca de 50% o valor final, com um decréscimo com a idade do eritrócito
  2. Teste point of care: estes testes point of care revelaram-se com uma inaceitável imprecisão comparativamente com os métodos mais precisos usados pelos laboratórios, pelo que há recomendações para estes métodos não serem usados para o diagnóstico de diabetes mellitus. No entanto, estes métodos point of care são bons para monotorização da diabetes e são muito usados em pediatria, pois podem usar sangue capilar
  3. Protocolo de diagnóstico: Testes diagnósticos para a diabetes incluem PTGO, glicemia em jejum, Hgb A₁c ou glicemia randomizada. Todos estes testes são úteis e sem revelarem superioridade de um teste em comparação com outro embora TPGO apresente uma sensibilidade superior. PTGO é considerada o padrão ouro para diagnosticar diabetes, embora haja particularidades que levem a que Hgb A₁c seja o melhor teste para diabetes tipo II, PTGO o melhor para diabetes gestacional e glicemia seja o melhor teste para diabetes tipo I
Variáveis biológicas não glicémicas:
  1. Idade: Dado que a mudança da hemoglobina fetal para a hemoglobina do adulto se inicia às 24 semanas, é possível que a Hgb A₁c do recém-nascido tenha interesse na informação da exposição in útero do feto à glicemia materna no último trimestre da gravidez. Não é sugerido o uso de Hgb A₁c no diagnóstico de diabetes do recém-nascido. Verificou-se existir correlação positiva entre a idade nos adultos, e particularmente idosos, e a concentração da Hgb A₁c, em parte devido às taxas menores de glicosilação com o envelhecimento. Verificou-se que a eficácia diagnóstica da Hgb A₁c diminuída com a idade, secundária a uma contagem eritrocitária mais baixa com Hgb A₁c.
  2. Etnia: A etnia afecta os níveis absolutos de Hgb A₁c, quaisquer que sejam os níveis de glicemia, sendo mais altos os valores de Hgb A₁c em negros, asiáticos ou latinos comparativamente com caucasianos. Também se verificou que os pretos apresentam uma Hgb A₁c superior à dos brancos
  3. Género: Os dados são contraditórios no que respeita à acção do sexo sobre os níveis de Hgb A₁c, embora seja indicativo haver uma concentração superior nos homens comparativamente às mulheres mas apenas no grupo etário 30-59 anos. Raparigas parece terem um valor superior de Hgb A₁c comparativamente aos rapazes e hipotetiza-se ser devido ao início da puberdade. Este parâmetro não deve ser tomado em consideração.
  4. Turnover eritrocitário: Dado o turnover eritrocitário alterado ter influência na distribuição etária eritrocitária, este dado subsequentemente afecta os níveis de Hgb A₁c. Verifica-se, no entanto, que esplenectomia leva a um aumento de Hgb A₁c. Alterações súbitas da semivida eritrocitária pode causar efeitos importantes da concentração da Hgb A₁c. Hemólise aguda e transfusão sanguínea devem ser consideradas com importância no diagnóstico e monitorização da diabetes pela Hgb A₁c.
  5. Hematínicos e anemia: Dados conflituosos existem mas parece que apontam mais para que haja um ligeiro aumento de Hgb A₁c em doentes com anemia ferropénica e o tratamento da anemia ferropénica leva a uma redução da Hgb A₁c. Tem no entanto sido considerado que esta variação se deve a uma interferência do ferro com a determinação da Hgb A₁c. A isoforma glicosilada da hemoglobina, Hgb A₁c, foi associada positivamente com diminuição da concentração de ferritina e MCV, mas também com um aumento da hemoglobina. Não está recomendado na utilização da Hgb A1c para o diagnóstico da diabetes ser feita a monitorização do ferro sérico. Vitamina B₁₂ e ácido fólico correlacionam-se inversamente com a concentração de Hgb A₁c.
  6. Hemoglobinas variantes: as alterações da hemoglobina ( Hgb S, C, D, E, F, etc ) não só afectam a semivida eritrocitária como também afectam a capacidade de glicosilação da hemoglobina, a carga da molécula e interferem com ensaios específicos como a determinação de Hgb A₁c. Nos portadores de algumas variantes de hemoglobina ( Hgb Raleigh, Hgb Okayama, etc. ) pode ter importância a determinação quantitativa das isoformas de glicohemoglobinas para além da Hgb A₁c.
  7. Gravidez
  8. Tiroidopatias: Hipotiroidismo clínico ou subclínico pode apresentar Hgb A₁c elevado que normaliza com terapêutica adequada. Doentes com hipertiroidismo não revelam alteração de Hgb A₁c comparativamente com indivíduos eutiroideus.
  9. Hepatopatias: Hepatopatias podem afectar a concentração de Hgb A₁c tanto por provocarem intolerância à glicose e diabetes como também pode haver efeitos não-glicémicos na Hgb A₁c como os associados à anemia e diminuição de síntese proteica. Hgb A₁c é assim um marcador em diabéticos com hepatopatia crónica , sendo que a Hgb A₁c se apresenta diminuída, enquanto que a frutosamina se revela dentro dos valores de referência.
  10. Nefropatias: Nefropatias crónicas afectam a Hgb A₁c, não sendo útil a determinação de Hgb A₁c para diagnósticar diabetes tipo II em doentes com falência renal terminal. No entanto, a Hgb A₁c tem importância relativa no diagnóstico de diabetes tipo II em doentes com IRC ligeira a moderada.
  11. Resposta inflamatória aguda: Embora nestes doentes não se verifique alteração de Hgb A₁c é sugerido fazer outros estudos para além do doseamento de Hgb A₁c no diagnóstico da diabetes dado que as rápidas alterações de glicemia e albuminemia no decorrer da inflamação aguda leva a aberrantes glicemias e frutosaminemia não apresenta valor no diagnóstico da diabetes tipo II nestes doentes.
  12. Outras condições:
  • HIV: que leva a um estado de baixo grau hemolítico causa baixa de Hgb A₁c
  • Sépsis pode causar alteração aguda da glicemia que não afecta de imediato os níveis de Hgb A₁c
  • Drogas como corticóides e antipsicóticos afectam de várias maneiras
  • Vitamina E, com um significativo efeito inibitório da glicosilação, revela redução significativa da Hgb A₁c nos doentes diabéticos tipo II após suplementação

Gap de Glicosilação
A designação de gap de glicosilação utiliza-se para a disparidade verificada entre a Hgb A₁c previsível e a efectivamente encontrada.
A base e significado da gap de glicosilação é ainda controverso nos factores genéticos bem como de semivida dos eritrócitos, resulta em diferentes taxas de glicosilação.

Conclusão
Hgb A₁c é um bom teste de diagnóstico da diabetes tipo II e monotorização da diabetes mellitus, mas é um parâmetro que sofre muitas interferências de vários factores não glicémicos, incluindo analíticos e biológicos, o que faz com que o seu uso não seja de interesse em todas as situações e sejam necessários biomarcadores alternativos.

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