sexta-feira, maio 12, 2023

Fago λ da E. coli: genes e proteínas reguladoras

 

Fago λ da E. coli: genes e proteínas reguladoras


O repressor do fago λ da E. coli é um polipeptídeo cuja presença é totalmente essencial para que o gene regulador da síntese proteica do fago se expresse.

Verificou-se que as células não produzem continuamente a totalidade das proteínas, sendo que algumas são produzidas apenas de maneira intermitente. Não se sabia, até há pouco tempo, a razão deste facto e pensava-se que certas zonas do DNA ficavam inactivas em certas ocasiões.

Actualmente tem-se por razão desta síntese intermitente de algumas proteínas o facto de um mecanismo de síntese proteica existir, no qual um grupo de genes estruturais, denominados de cistrões, localizado em sectores vizinhos ao longo do DNA e ligados de forma estreita no mapa genético da célula, formam um operão que está sob o controlo dum gene operador que se localiza numa posição estratégica relativamente ao operão que ele controla.

Quando o operador está aberto, cada cistrão sintetiza o mRNA respectivo e este mRNA controla a síntese de um polipeptídeo. Na altura em que o operador se encontra na sua forma de fechado, a síntese do mRNA não se processa pois o operador se encontra ligado a um repressor, localizado no citoplasma, e que tem por função o bloqueio da translação. O repressor actua de forma negativa de maneira que a sua forma activa inibe a síntese proteica.

A actividade dos repressores é governada pelos efectores, que são metabolitos específicos. No caso das enzimas indutoras, o indutor inactivando o repressor actua como efector e dessa forma o gene operador fica livre permitindo que se produza a síntese proteica.

O apo-receptor é um outro tipo de repressor que intervem na regulação das enzimas repressoras e que são activadas na presença do seu efector a exemplo do que sucede nos processos de retroalimentação.


Os repressores apresentam pelo menos 2 locais alostéricos, sendo que um tem afinidade pela sequência de nucleotídeos de gene operador respectivo e o outro pela molécula do efector, sendo que assim quando o efector se liga ao repressor, este repressor apresenta uma afinidade pelo gene do operador modificado.


Exemplos destes mecanismos são o operão da lactose na E. coli ou da histidina na S. typhimurium.


A presença de um profago proporciona à célula hospedeira uma capacidade de resistência a uma outra infecção por vírus homólogos ou suas variantes.



Fago λ: constituição e propriedades


O repressor do fago λ é um polipeptídeo com peso molecular ao redor de 28000, na sua forma de monómero, ou de 112000 na sua forma tetrâmero. O coeficiente de sedimentação é de 6.2 s ou 2.4 s nas suas formas tetrâmero e monómero, respectivamente. Apresenta uma concentração intracelular de 10 ͞ moles/l. O repressor λ se encontra num rápido equilíbrio entre as suas formas monómero, dímero e tetrâmero, sendo que a forma de tetrâmero é mais abundante quando aumenta a concentração do repressor λ. A forma de monómero não se liga ao DNA do fago.

Quando o repressor se encontra associado por forma a se apresentar como dímero, une-se ao gene operador numa constante de equilíbrio de 3x10⁻⁴ moles/l para a reacção

R + O = RO

A semi-vida média da associação repressor-gene operador, in vitro, é de 10 minutos, sendo que se emprega o DNA completo do fago, e não só o gene do operador, aquela semi-vida sobe para 170 mn. A expressão de gene regulador depende da presença ou ausência da forma activa do repressor λ. Como indutores da perda do estado de lisogenia, in vitro, têm sido propostos análogos de nucleotídeos como 6-fluorodeoxiuridina, alteração da temperatura ou do pH e radiações UV.



Especificações de interacção entre repressor e gene operador


O repressor regula, de modo específico, uma sequência de bases, sejam pirimidinas ou purinas. Mutação destas bases impossibilitam a incorporação do repressor, não se ligando ao DNA do fago.

A cinética da união do repressor ao DNA segue uma curva sigmoide que sugere haver um efeito de cooperação entre as diferentes subunidades ( protómeros ) da molécula do repressor. Estão propostas as seguintes hipóteses explicativas para este facto:

  1. os monómeros se unem de forma individual de forma cooperativa com o gene operador

  2. os monómeros se ligam a um oligómero livre que posteriormente se unem a um gene operador



Modo de actuação do fago λ


O repressor une-se aos vários genes operadores e assim a transcripção dos 2 sets de genes tempranos ( ou temperados ) que é lida em sentidos opostos, é bloqueada, ou seja o repressor impede que a RNA polimerase DNA dependente faça a transcripção da mensagem genética existente no DNA do fago para uma molécula de mRNA que é traduzido ao nível dos ribossomas em proteínas precoces ( ou tempranas ) necessárias para a síntese proteica tardia, permanecendo em forma de profago o DNA do fago e a célula hospedeira fica em lisogenia.



Na via lítica podemos observar 3 estágios de expressão génica: inicial-imediato, inicial-retardado e tardio.

O estadio inicial-imediato apresenta 2 operadores: Ol e Or ( l de left; r de right ). O transcripto Ol forma a proteína N sendo que na ausência desta proteína N param os transcriptos iniciais-imediatos, dando a possibilidade a uma maior expressão dos genes λ e assim o estadio inicial-retardado é activado.

As proteínas para a replicação do DNA do lambda e sua recombinação são sintetizados no estadio inicial-retardado sendo neste estadio também transcrito o gene que codifica a proteína Q, outro regulador da expressão génica do fago λ e que impede o término da transcripção.


Tal como na via lítica, também na via lisogénica existem 3 estadios que são nomeadamente: estabelecimento, manutenção e libertação. O estadio de estabelecimento necessita da integração do DNA do fago no do hospedeiro bem como da inactivação da via lítica.

Apenas o gene cI é expresso no profago e este gene cI é capaz de fazer a codificação do repressor λ que se liga aos operadores Or e Ol da via lítica.

O repressor no operador Ol impossibilita a transcripção para a esquerda dos genes iniciais-imediatos o que resulta na não síntese da proteína N e o bloqueio da via lítica. O repressor quando se liga ao operador Or origina um impedimento da transcripção dos genes cro e Q. Desta forma, com o repressor ligando apenas o gene, cI é transcripto.

O gene cI, codificador do repressor, encontra-se entre os operadores da via lítica Ol e Or sendo que cada um destes operadores possuem 3 regiões com diferentes afinidades de ligação ao receptor.

O ponto de ligação com maior afinidade para o repressor tanto em Ol quanto em Or, é o mais próximo do início do primeiro gene estrutural do operão Ol1 e Or1, respectivamente. O promotor para o gene N encontra-se em Ol1 e o promotor para o gene cro fica em Or1.

A ligação do repressor a estes operadores, N e cro, leva ao bloqueio do RNA polimerase ao promotor e assim a transcripção dos genes N e cro não se iniciam. De forma diferente, a transcripção do gene cI não apresenta bloqueio pela ligação do repressor a estes pontos de alta afinidade.


É a própria síntese de repressor que controla o nível deste repressor por mecanismo de feed back.


A alta regulação existente depende das diferentes afinidades de Or1, Or2 e Or3 pelo repressor. O Or1 está preenchido em situação de baixos níveis de repressor e assim há o bloqueio da transcripção do gene cro e outros genes à direita deste gene cro.

A ligação de uma molécula de repressor ligada a Or1 favorece a ligação de outra molécula, a Or2, e desta forma a transcripção do gene cI se aumenta originando maior produção de repressores. Com a subida da concentração dos repressores, o Or3 vai ficando ocupado.





Fago Lambda


O fago liga-se à parede bacteriana reconhecendo o transportador da maltose ao qual se liga.

Várias polimerases bacterianas reconhecem vários promotores do fago, como o PL e PR ( promotor left e promotor right ) que intervem na produção dos mRNA virais.

O PL intervem na síntese da proteína N enquanto que na síntese da proteína cro age o PR. A transcripção nestes sistemas pára quando se encontra o terminator por virtude da detenção da polimerase.

Cro é um repressor capaz de reprimir a expressão de cII e cIII, que são proteínas que inibem a lisogenia e desta forma o ciclo lisogénico passar à via lítica mas esta repressão apenas se verifica na presença de altas concentrações de cro.

N é uma proteína com propriedades antiterminadoras e assim na sua presença a polimerase não se detém. Quando se sintetiza a proteína N, a transcripção se processa e a partir de PL se produz N e cIII enquanto que de PR se sintetiza cro, cII, O, P e Q.

Perante Q há um terminador que não termina de se ligar com a proteína N, pelo que a quantidade de Q sintetizada è menor do que a síntese das restantes proteínas.

Os genes O e P intervêm na replicação viral por forma semiconservadora e bidireccional. 

Q é o regulador positivo da expressão dos genes tardios.


Uma vez que a replicação se faz por rondas, a dada altura há uma alta concentração de proteína Q, proteína esta antiterminadora tal como N, o que permite que se proceda à transcripção do mensageiro R2, que é o codificador das proteínas tardias do fago implicadas na produção da cabeça, cauda e da via lítica.

Simultaneamente ao acúmulo de Q, se acumula também cro, capaz de reprimir os promotores, e que se une às regiões operadoras. No Or ( operador direito ) a maior afinidade encontra-se no sítio 3 seguido pelo sítio 2 e por fim o sítio 1 que apresenta a menor afinidade pelo que a pequena concentração de cro se ligará de forma a reprimir o sítio 1 mas não sendo uma concentração de cro suficiente para inibir o sítio 3 , o que faz com que seja possível a expressão de todas as proteínas do mensageiro direito.

No operador esquerdo, Ol, a primeira molécula de cro que se lhe liga é capaz de reprimir a totalidade da transcripção.


Todos os promotores do operador direito, Or, inibem-se quando a proteína cro chega ao sítio 1. Nesta altura, com todos os promotores inibidos e havendo proteínas tardias, a replicação passa de semiconservadora bidireccional para replicação por círculo rodante.

O fago lambda tem DNA dupla cadeia sendo que a cadeia + se divide começando-se a juntar nucleotídeos no terminal 3' copiando a cadeia – de forma a que o terminal 5' se vai deslocando e assim formar uma cadeia +. Finalmente uma endonuclease separa o sítio Cos, de dupla cadeia, dando origem a um extremo coesivo ou escalonado que tornará a permitir que o cDNA se forme quando houver nova infecção.

Este acúmulo de proteína cro provoca a não expressão das proteínas lisogénicas cI e cII, passando-se desse modo à fase lítica. Quando se liga ao sítio 3 , um dos promotores que inibe é o que está associado ao gene cro conduzindo a que o aumento da concentração da proteína cro reprime a sua transcripção, mas esta já não é precisa uma vez que a lisogenia foi inibida e assim o vírus em breve se libertará do hospedeiro.

Os acontecimentos na fase lítica são então:

  1. entrada do DNA linear e circularização pelos extremos coesivos formando um sítio cos

  2. união da polimerase bacteriana aos promotores esquerdo e direito, PL e PR , produzindo-se mensageiros curtos devido a presença de terminadores sendo que o PL leva à síntese da proteína N e o PR leva à síntese da proteína cro

  3. dá-se o acúmulo da proteína N, que age como antiterminador, e assim se formam os mensageiros maiores pelos PL e PR sendo que PL tem interferência na síntese de N e cIII, enquanto que PR actua na síntese de cro, cII, O, P e em alguns ciclos a proteína Q

  4. as proteínas O e P permitem a replicação bidireccional semiconservadora tipo Theta

  5. Q acumula-se, agindo como antiterminador e assim PR sintetiza um mensageiro capaz de codificar as proteínas tardias da lise, cabeça e cauda

  6. simultaneamente com o acúmulo de Q, a proteína cro liga-se aos operadores direito e esquerdo, OL e OR , verificando-se que a união de OR ao sítio 1 inactiva todos os promotores enquanto que é necessário muito cro para que se ligue ao sítio 3 e assim inactivar todos os seus promotores incluindo o de cro

  7. a replicação passa a ser em círculo rodante dada a inibição dos promotores pela proteína cro e a síntese das proteínas tardias por acção de Q

  8. o concaténero de cadeia dupla se divide em fragmentos do tamanho do genoma do fago deixando os extremos coesivos no sítio cos.


Na fase lisogénica verificam-se outros passos que são de seguida inunciados:

cI é a proteína repressora principal do fago lambda e a sua concentração em conjunto com as de cro é que determinam a fase, lítica ou lisogénica, que o fago segue.

O gene de cI que se ubicua entre PL e PR e por isso se transcreve mediante o PE ( promotor do estabelecimento da lisogenia ). O PE é um promotor que cII induz, o que não se passa com PL nem PR, cujo transcripto de PE se acumula quando a proteína N se acumula permitindo que mRNA direito inclua cro, cII, O, P e algum Q.


Duas condições terão de existir para a lisogenia se verificar:

  1. os genes tardios não se expressam e dessa forma não há proteínas tardias; para que estes genes não se expressem, é preciso que cI se expresse dado ser um repressor de PR, e devem estar presentes altos níveis de cIII que evitam a degradação de cI

  2. que o genoma do fago se integre no genoma bacteriano; para esta integração se verificar, tem de se expressar o gene Int, gene de integração. Se existe cII e PE é induzido e cI é sintetizado, sendo que este inibe a síntese das proteínas tardias quando cI se liga a PR. Também cro tem a capacidade de reprimir a síntese de mRNA direito, que inclui cII, necessário para cI ser induzido e assim se dá a lisogenia.


A proteína cII é sensível a proteases; cIII é degradada pelas proteases e assim protege cII da acção das proteases. No entanto, se a concentração das proteases for muito elevada, estas são capazes de degradar quer cII quer cIII, pelo que a degradação de cII pelas proteases varia com a concentração das proteases dentro da bactéria.

Os níveis das proteases intrabacterianas dependem do nível nutritivo variando numa razão directa. Assim quando há muitos nutrientes, os níveis de proteases são elevados, o cII degrada-se, não se exprimem os genes tardios e o genoma do fago não se integra no bacteriano pelo que a lisogenia não se verifica sendo o ciclo lítico o que vigora. Em suma, se há muitos nutrientes há muitas bactérias e o fago lambda abandona o hospedeiro para infectar novas bactérias.

A proteína cI, na altura da sua síntese, vai aos operadores por forma a impedir outras sínteses no sítio 1, ao contrário de cro. Isto é, entre cro e cI a primeira proteína que se ligue ao sítio 1 determina o ciclo do vírus:

  • se a proteína que se liga é cro, é porque há muita quantidade de proteína cro e assim se sintetizam os genes tardios e a ligação de cro ao sítio 1 provoca que a terminação mude para circulo rodante e se dê a lise

  • se a proteína que se liga é cI, os genes tardios não se produzem; ao parar o OR também cII não se sintetiza sendo que esta é necessária para induzir PE a transcrição cI; cI no entanto apresenta uma função dupla: inactiva PR e activa o PM ( promotor da manutenção da lisogenia ). Esta dupla função de cI origina a que todos os promotores estão inactivos excepto o PM e dessa forma a transcrição de cI se pode continuar a processar. A determinado momento a transcrição de cI é detida já que PM fica inactivo mas cI foi acumulado em concentração suficiente


Com a divisão celular bacteriana em lisogénese, a concentração de cI diminui, o que leva a que PM se volte a expressar, transcrevendo-se mais cI até PM se tornar a reprimir. Este ciclo se repete até as proteases que se associam a um nível alto nutritivo degradem cI e o ciclo lisogénico seja substituído pelo ciclo lítico.


Em estado lisogénico, uma bactéria é imune a uma reinfecção por fago lambda pois o cI reprime o segundo fago infectante.


Na lisogénese verifica-se a interrupção da síntese das proteínas tardias pela não transcrição dos genes tardios mas também há a incorporação do genoma viral no bacteriano para a qual a transcripção do gene Int presente no mRNA esquerdo é necessária.

O gene Int codifica uma topoisomerase que produz a integração entre um sítio específico do fago lambda, chamado att, e os sítios gal e bio bacteriano. Para se fazer a separação dos genomas é precisa a proteína Xis, uma excisionase, capaz de alterar a afinidade da topoisomerase capaz de alterar a função dela de integração para desintegração. O gene xis, da proteína Xis, encontra-se no mRNA esquerdo.


O sistema de reparação SOS é um sistema de genes capazes de intervirem na reparação da lesão causada por agentes externos e que actuam por forma a mudar de fase lisogénica para a fase lítica. Nas condições normais o sistema de reparação SOS encontra-se inactivo pela acção da proteína LexA que reprime os genes SOS. A proteína RecA, participante na recombinação, na presença de dano do DNA potencia a actividade protease levando à degradação da proteína LexA com consequente activação dos promotores dos genes SOS e reparação do dano do DNA.

RecA degrada cI, o que vai permitir a transcrição dos genes tardios induzindo-se assim a lise.


Proteínas como cI e LexA são factores de transcrição capazes de activar e desactivar genes.

Quando danos no DNA são detectados, a LexA activa os genes do fago, replicando e lisando a célula.

Vários fagos são capazes de provocar o desenvolvimento do sistema de comunicação bacteriano através da proteína CtrA, proteína esta que integra vários sinais, quer internos quer externos, que accionam processos de desenvolvimento bacterianos, estando entre eles a produção de flagelos e pili que é onde os fagos se ligam na bactéria quando as infectam.

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