quarta-feira, junho 05, 2013

Mielograma: alterações infecciosas e reactivas

Mielograma: alterações infecciosas e reactivas

A resposta medular à infecção é muito variável, dependendo da natureza e cronicidade da infecção, idade do doente, presença de doenças associadas e do agente infeccioso. A resposta medular, e do sangue periférico, é no entanto sempre inespecífica e similares alterações ocorrem em outras patologias não infecciosas.

Infecções a ricketsias ou bacterianas

Nos adultos, a resposta hematológica a uma infecção bacteriana é uma leucocitose com neutrofilia e desvio esquerdo. Os neutrófilos, usualmente, apresentam granulações tóxicas e, por vezes, corpos de Döhle e vacuolizações citoplasmáticas. Neutrofilia pode não ocorrer quando a infecção é muito grave, em recém-nascidos ou em alcoólicos com reserva medular diminuída, mas há sempre desvio esquerdo com as alterações tóxicas nos neutrófilos, já referidas.

Corpos de Döhle

Em infecções particulares pode haver neutropenia ( febre tifóide, febre paratifóide, etc ), trombocitopenia, anemia, bicitopenia ou mesmo pancitopenia. Em casos graves, podem ser visualizados eritroblastos no sangue periférico, bem como precursores granulocíticos, condição chamada de leucoeritroblastose. Linfócitos podem estar diminuídos mas plasmócitos podem estar presentes. Em algumas infecções pode surgir anemia hemolítica.
A anemia inicia-se por ser normocítica e normocrómica mas, à medida que a infecção se torna mais crónica, a anemia desenvolve características de anemia das doenças crónicas, sendo hipocrómica microcítica.
A pancitopenia, que pode ocorrer em algumas situações, é devida a fenómenos de hemofagocitose e, mais raramente, associa-se a necrose da medula óssea.
A expressão das infecções a nível medular, nos casos de infecção bacteriana, reflete o que se passa a nível do sangue periférico. Há  hiperplasia  granulocítica  associada  a alterações  tóxicas ( granulações tóxicas, vacuolização citoplasmática ). A medula óssea pode mostrar hiperplasia dos percursores granulocíticos, com  poucas  células  maturas.


Eritropoiese pode estar diminuída, com os eritroblastos mostrando diminuição das granulações sideróticas. Nos casos em que se observa trombocitose a nível periférico, pode haver aumento do número de megacariócitos. Macrófagos estão aumentados em número. Nos casos de infecções crónicas, aparece aumento dos depósitos de ferro.
Na tuberculose, o mielograma, pode revelar aumento dos depósitos de ferro e aumento do número de macrófagos, frequentemente, com hemofagocitose.
Nas infecções bacterianas, no geral mas com excepções, a medula óssea apresenta-se hipercelular, com hiperplasia granulocítica e com desvio esquerdo da maturação, com aumento dos mielócitos e promielócitos em detrimento dos polinucleares maturos. Também se observa, geralmente, aumento de megacariócitos de morfologia preservada e presença de emperipolesis. Eritropoiese costuma ser diminuída mas morfologicamente normal. Plasmócitos podem estar aumentados, podendo mesmo, em situações mais crónicas, atingir cifras de 50% das células nucleadas presentes.
Em casos de infecção grave, pode ocorrer uma paragem da maturação celular, com aumento dos promielócitos e falta de células maturas.

Infecções virais

No sangue periférico, as infecções víricas, geralmente provocam linfocitose com as células mantendo a morfologia normal, mas por vezes sendo atípicas. A mononucleose infecciosa, provocada pela infecção pelo virus Epstein-Barr, é caracterizada por linfócitos atípicos   grandes,   referidos   por   mononucleares   atípicos,   geralmente    pleomórficos,


grandes, com citoplasma abundante e núcleos com cromatina difusa e nucléolos. A presença destas células mononucleares atípicas, não é patognomónica de mononucleose infecciosa, pois podem aparecer em infecções como as provocadas por CMV, HIV, hepatite A, adenovirus e toxoplasmose, bem como em reacções de hipersensibilidade a drogas.
Em doentes com infecções a vírus, a hemoglobina pode estar diminuída como resultado da supressão medular, hemorragia ou hemólise. Trombocitopenia resultando de consumo excessivo das plaquetas ( trombocitopenia de consumo ) é característica das febres hemorrágicas virícas causadas por um amplo leque de vírus.
O mielograma, nas infecções a vírus, mostra um aumento dos linfócitos, sejam normais ou atípicos. Nas infecções a EBV ou CMV, os mononucleares atípicos, que se observam no sangue periférico, estão igualmente presentes na medula óssea. Hemofagocitose é proeminente. Quando uma infecção vírica causa anemia hemolítica, como é o caso da mononucleose infecciosa, hiperplasia eritróide apresenta-se.
Quando infecções víricas são complicadas com trombocitopenia, devido a aumento de destruição plaquetária, os megacariócitos estão presentes em número normal ou aumentado. Ocasionalmente, observam-se plaquetas dentro dos macrófagos da medula óssea.
Infecções víricas podem levar a um aumento dos linfócitos, plasmócitos e macrófagos na medula óssea, com presença ou ausência de hemofagocitose.



Infecções a fungos

As infecções fúngicas, embora possam afectar pessoas saudáveis para outras patologias, são muito mais frequentes em doentes com HIV ou fazendo quimioterapia. No sangue periférico, as infecções fúngicas não apresentam dados hematológicos específicos, podendo ocorrer por vezes pancitopenia. Em certas ocasiões, como nas infecções por actinomicoses ou coccidioidomicoses, neutrofilia pode ocorrer. No mielograma, os fungos são raras vezes observados em doentes imunologicamente normais, sendo o Histoplasma uma excepção por ser observado nos macrófagos medulares. Os fungos podem, para além de serem observados dentro do macrófago, serem visualizados livres.
Para a detecção de fungos, o exame preferencial é a cultura mais que a observação de mielograma ou, mesmo, biópsia óssea.

Doenças parasitárias

Aspirado de medula óssea é muito útil no diagnóstico de leishmaniose e, quando se suspeita desta patologia, é um método recomendado. Macrófagos estão aumentados em número e contêm organismos no seu interior, que se caracterizam por serem um pequeno corpo basófilo paranuclear, conhecido como cinetoplasto, dando ao organismo a característica   aparência   de  duplo  bastão.  Leishmania  é  usualmente  associada  a  um aumento do número de plasmócitos, e  pode   haver  proeminente  deseritropoiese.


Parasitas da malária são por vezes observados nos eritrócitos e nos neutrófilos medulares, embora não seja de aconselhar o mielograma para o diagnóstico de malária.


Sobrecarga de ferro

A sobrecarga de ferro, com excesso de depósitos de ferro, pode resultar de hemocromatose genética ou outras alterações raras, ou de um distúrbio hematológico. As alterações hematológicas que levam à sobrecarga de ferro são caracterizadas por uma eritropoiese ineficaz, levando a um aumento da absorpção de ferro, ou por anemia que leva a transfusões e sobrecarga de ferro transfusional.
O sangue periférico é normal excepto se a sobrecarga de ferro resultar de uma anormalidade hematológica.
Na hemocromatose genética há um aumento de ferro nos sideroblastos e armazenamento de ferro nos macrófagos medulares, mas a medula óssea é de resto normal.
Quando a sobrecarga de ferro resulta de anormalidades hematológicas, haverão repercursões visualisáveis na medula óssea. Se a doença que causa o excesso de ferro é a talassémia, os eritroblastos apresentam grânulos sideróticos em número e tamanho aumentados. Quando a causa do excesso de ferro é a anemia sideroblástica, sideroblastos em anel são muito numerosos e outros sideroblastos anormais estão também presentes. Inclusões de hemossiderina podem ser observadas nos plasmócitos em doentes com sobrecarga de ferro.




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