sexta-feira, junho 07, 2013

Neoplasias de plasmócitos

Neoplasias de plasmócitos

Mieloma múltiplo ou mieloma a plasmócitos ou mielomatose

Mieloma múltiplo é uma patologia neoplásica originada, da proliferação na medula óssea, de um clone de células neoplásicas relacionadas, tanto morfológica como funcionalmente, com os plasmócitos. Na maioria dos casos, as células neoplásicas secretam uma proteína que tanto pode ser uma imunoglobulina completa ou uma das suas cadeias leves. A clínica do mieloma múltiplo resulta tanto da proliferação neoplásica das células como, de forma indirecta, dos efeitos da proteína secretada, e frequentemente designada, de paraproteína.


Células da linhagem do plasmócito com linfoblastos e plasmócitos presentes

O mieloma múltiplo é uma doença de indíviduos de idade média ou avançada, sendo a média da idade de apresentação da patologia de 70 anos e sendo a incidência mais elevada nos homens que nas mulheres e nos negros mais que nos brancos.
Clinicamente apresenta-se com anemia, dor óssea, fracturas patológicas, hipercalcémia, falência renal e infecções de repetição. Uma minoria dos doentes apresentam hepatomegalia ou linfadenopatia, e esplenomegalia está ocasionalmente presente. Doentes com lesões ósseas apresentam osteoporose e lesões osteolíticas mas, ocasionalmente, pode ser observado osteosclerose.
A paraproteína secretada é, em 60% dos casos, IgG e, em 20% dos casos, IgA. Em alguns doentes há secreção de excesso de cadeias leves monoclonais ( proteína de Bence-Jones ) em adição à imunoglobulina completa. Em cerca de 15-20% dos doentes, apenas é secretada a proteína de Bence-Jones ( mieloma de Bence-Jones ). Numa pequena minoria de doentes, são secretadas as IgM, IgD e IgE. Por vezes os doentes podem ter 2 paraproteínas diferentes e outra pequena minoria não apresenta paraproteína, nem no soro nem na urina ( mieloma não secretor ). Cada paraproteína, como é proveniente de proliferação monoclonal, contem apenas um único tipo de cadeia leve, seja k ou λ. A concentração das imunoglobulinas séricas está reduzida em cerca de 90% dos doentes.
Mieloma a plasmócitos pode ser diagnosticado quando 2 dos seguintes critérios estão presentes:
  • mais de 10% de plasmócitos na medula óssea
  • paraproteína na urina ou soro
  • lesões ósseas osteolíticas ou osteoporose
A probabilidade do mieloma é alta se a concentração de paraproteína IgG excede as 30 g/l ou de IgA 25 g/l, ou se as cadeias leves na urina excedem 1 g/dia.
A sobrevivência do doente com mieloma é de 3-4 anos, terminando em doença refractária, por vezes com fase leucémica. Pode evoluir para linfoma imunoblástico.


Célula gigante de mieloma, com corpo de Dutcher, semelhante a megacariócito

No sangue periférico, o doente com mieloma, apresenta anemia normocrómica normocítica ou, mais raramente, macrocítica. Observam-se frequentemente rouleaux e um background basofílico, devido à paraproteína presente no sangue. Estes 2 dados não aparecem nos doentes que apenas produzem proteína de Bence-Jones ou são não secretores. No esfregaço de sangue periférico podem ser observados, em pequeno número, plasmócitos ou linfócitos plasmocitóides.


Linfoplasmócito

O esfregaço é, por vezes, leucoeritroblástico. Pode haver, com o avançar da idade, trombocitopenia e neutropenia. Por vezes evolui para um quadro de leucemia de plasmócitos, onde se observam grande número de células neoplásicas em circulação, mostrando elevada atípia.
No mielograma pode ocorrer um amplo leque de alterações. Plasmócitos estão geralmente aumentados em número, frequentemente variando de 30% a 90% das células da medula óssea. As células do mieloma podem ser morfologicamente normais, com núcleos excêntricos, cromatina em grumos e zona de Golgi típica dum plasmócito, ou podem ser observadas displasias de grau variável.
É frequente uma assincronia nucleocitoplasmática, estando o citoplasma maturo mas o núcleo pode ter um padrão de cromatina difuso ou conter um nucléolo proeminente. Outras alterações morfológicas incluem pleomorfismo acentuado, aumento do tamanho das     células, elevada   razão núcleocitoplasmática, multinuclearidade, lobulação   nuclear, fagocitose   pelas 


Plasmócito com eritrócito ingerido

células do mieloma e presença de figuras mitóticas. Anormalidades citopasmáticas incluem basofilia uniforme sem zona de Golgi visível, eosinofilia citoplasmática e margens eosinofílicas flamejantes. O citoplasma dos plasmócitos pode ser volumoso e conter grânulos azurófilos ou cristais, pode haver vacúolos ou os sacos do retículo endoplasmático serem dilatados.


Plasmócito com cristais de imunoglobulinas intracitoplasmáticos


Dois plasmoblastos sendo um trinucleado


Três plasmócitos multinucleados

Corpos de Russel podem ser visíveis e são vistos como inclusões esféricas de tamanho variável. Os plasmócitos, se contêm múltiplos pequenos vacúolos ou inclusões esféricas contendo material fracamente basófilo, denominam-se células Mott. Inclusões que parecem ser intranucleares ( corpos de Dutcher ) podem estar presentes. Os corpos de Dutcher, embora aparentemente intranucleares, são na verdade invaginações citoplasmáticas para o interior do núcleo.


Células de Mott com múltiplos corpos de Russell


Corpo de Dutcher

Hemossiderina está presente, nas células de mieloma, ocasionalmente.

Não há um valor percentual de plasmócitos na medula óssea que separe, com certeza, uma situação de mieloma de uma situação de plasmocitose reactiva ou de gamopatia monoclonal de significado indeterminado, sendo necessário dados clínicos, radiológicos e bioquímicos para estabelecer o diagnóstico.
O mielograma dá informações, nos casos de mieloma, tanto para estabelecer o diagnóstico como para fazer o prognóstico pois, tanto a percentagem de plasmócitos como o seu grau de displasia, são correlacionados com o prognóstico. 20% de plasmócitos, ou mais, é sinal de mau prognóstico.


Plasmócito com núcleo bilobado

A biópsia óssea tem utilidade tanto no diagnóstico do mieloma como no prognóstico, e dessa forma é recomendada mesmo que o aspirado seja suficiente para um correcto estudo do mielograma. Tem também valor para avaliar da terapêutica, servindo de padrão inicial.
A biópsia óssea permite o estudo de infiltração da medula óssea pelas células de mieloma. Três padrões principais de infiltração são reconhecidos:
  • intersticial com envolvimento, ou não, paratrabecular de plasmócitos
  • nodular
  • difuso

Padrões de infiltração


No padrão intersticial, as células do mieloma estão dispersas entre as hematopoiéticas e as células gordas medulares; já no padrão difuso, a arquitectura normal da medula é profundamente perturbada.

Na plasmocitose reactiva, a infiltração intersticial e grande acúmulo de plasmócitos são raros.

Redução da hemopoiese associa-se ao mieloma, mesmo na ausência de infiltrado acentuado da medula óssea; deposição aumentada de reticulina, infiltrado linfóide e presença de granulomas são fenómenos que se podem observar.
O padrão nodular de infiltração correlaciona-se com uma doença mais agressiva, e pior prognóstico, do que no padrão de infiltração intersticial, com ou sem atingimento paratrabecular. O pior prognóstico é o do padrão de infiltração difuso.


Leucemia a plasmócitos

Leucemia a plasmócitos é um termo que se emprega para uma situação de novo leucémica ou para a fase terminal do mieloma quando as células neoplásicas estão na circulação. Leucemia a plasmócitos é definida pela presença no sangue periférico de, pelo menos, 20% de plasmócitos ou um número absoluto de 2000 plasmócitos/μl. Doentes com leucemia a plasmócitos apresentam clinicamente a sintomatologia do mieloma ( dores ósseas, lesões líticas, hipercalcémia e insuficiência renal ) mas com maior incidência de repercursões extramedulares, hepatomegalia e esplenomegalia. O prognóstico é muito mau.
No sangue periférico observam-se muitas células plasmáticas neoplásicas, com morfologia que varia desde plasmócitos diferenciados normais até formas muito primitivas, mostrando muito pouco evidência de diferenciação em plasmócitos. Anemia apresenta-se em quase todos os casos, e neutropenia e trombocitopenia são comuns.. Rouleaux e um background basofílico são frequentes.


Esfregaço de sangue periférico mostrando rouleaux e plasmócitos
displásicos, um com corpo de Dutcher

No mielograma observa-se forte infiltrado com células neoplásicas mostrando as características morfológicas descritas atrás, observando-se uma redução do número de elementos hematopoiéticos normais. Na biópsia óssea observa-se um infiltrado de plasmócitos que formam a maioria das células presentes na medula óssea.


Macroglobulinemia de Waldenstrӧm

Esta doença é caracterizada por ser um linfoma, mais frequentemente linfoma linfoplasmocítico, com secreção de grandes quantidades de IgM originando hiperviscosidade. Menos frequentemente a macroglobulinemia de Waldenstrӧm, com uma paraproteínemia de 3.2-8.8 mg/ml e sinais de hiperviscosidade, é uma manifestação extranodal  de um linfoma marginal do tecido linfóide associado à mucosa ( linfoma MALT ). A sintomatologia é característica de linfoma ou deriva da hiperviscosidade originada no aumento da IgM. Hepatomegalia, esplenomegalia e linfadenopatia são frequentes. A incidência de macroglobulinemia de Waldenstrӧm é de cerca de um décimo da do mieloma.


Infiltrado linfocitário

No sangue periférico é usualmente observada anemia normocrómica normocítica, com formação de rouleaux e coloração do background basofílica. Pode aparecer trombocitopenia. Crioprecipitados podem ser observados quando a paraproteína tem características de crioaglutinina. A contagem de linfócitos pode ser normal ou estar aumentada, sendo as células neoplásicas pequenos linfócitos maturos com alguma diferenciação de plasmócitos.


Macroglobulinemia de Waldenstrӧm mostrando pequenos linfócitos maturos e um
cluster de pequenos linfócitos maturos cercando um macrófago


A medula óssea é infiltrada por células neoplásicas com morfologia de pequenos linfócitos, com uma pequena porção destas células com características plasmocíticas, estando o número de plasmócitos aumentado. Inclusões intranucleares ou intracitoplasmáticas, PAS positivas, são geralmente observadas. Células linfoplasmocitóides em cluster cercando macrófagos são observadas.

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